Brasil
Saiba os crimes relacionados à pandemia do coronavírus e suas penalidades
Por Leandro Bastos Nunes - direitonet
O poder público brasileiro tem adotado medidas para prevenção e contenção do coronavírus, tendo sido editada a Lei n.º 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, a qual foi regulamentada pela Portaria n. 356,de 11 de março de 2020, do Ministério da Saúde.
Com efeito, o art. 3º da Lei n.º 13.979/2020 introduziu um rol de medidas a serem implementadas para o enfrentamento da situação emergencial de saúde pública, dentre as quais destacamos o isolamento e a quarentena, tendo a legislação acima referida distinguido ambas as hipóteses na seguinte forma:
Art. 2º Para fins do disposto nesta Lei, considera-se:
I – isolamento: separação de pessoas doentes ou contaminadas, ou de bagagens, meios de transporte,mercadorias ou encomendas postais afetadas, de outros, de maneira a evitar a contaminação ou a propagação do coronavírus; e
II – quarentena: restrição de atividades ou separação de pessoas suspeitas de contaminação das pessoas que não estejam doentes, ou de bagagens, contêineres, animais, meios de transporte ou mercadorias suspeitos de contaminação, de maneira a evitar a possível contaminação ou a propagação do coronavírus.
Ainda sobre o tema, preleciona a bióloga Helivânia Sardinha dos Santos:
A quarentena consiste em um período em que pessoas saudáveis, mas que estiveram expostas a uma doença transmissível, seja por contato com um doente, seja por estar em regiões de surtos epidêmicos, têm sua liberdade de trânsito limitada. Embora o nome remeta a um período de quarenta dias, a duração da quarentena é determinada com base no período de incubação da doença, ou seja, o tempo que a doença leva para se manifestar. Essa medida de saúde pública busca, assim, controlar a disseminação da doença. (…) A quarentena diferencia-se do isolamento porque restringe o trânsito de pessoas sadias que teriam sido expostas a um agente infeccioso, podendo estar contaminadas. Já o isolamento é a separação dos indivíduos doentes, portadores de doenças contagiosas. O objetivo das duas medidas, no entanto, é o mesmo: evitar a propagação de determinada doença” (disponível em https://www.biologianet.com/curiosidades-biologia/quarentena.htm. Acesso em 21 de março de 2020)
Ademais, a Portaria interministerial n.° 05 de 2020 (Ministro da Justiça e Ministro da Saúde) dispôs que a autoridade policial poderá lavrar termo circunstanciado em detrimento daquele que for flagrado praticando os crimes previstos nos artigos 268 e 330 do código penal, além do previsto no art. 3º, II, da Lei 13.979/2020 (https://www.conjur.com.br/dl/governo-edita-portaria-autorizando.pdf.Acesso em 21 de março. de 2020).
Inicialmente, é válido esclarecer que a Portaria apenas regulamentou a forma de prevenção e repressão das condutas relacionadas aos tipos penais alusivos à propagação da pandemia (disseminação mundial da doença) haja vista que a criação dos crimes relacionados ao combate à referida doença não é derivada do mencionado ato normativo, e sim da lei penal, diante do princípio da legalidade insculpido no artigo 5º, XXXIX, da Constituição Federal, (“não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”).
Crime de infração de medida sanitária preventiva
O art. 268 do Código Penal versa acerca da infração de medida sanitária preventiva, nos seguintes termos:
Art. 268 – Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa:
Pena – detenção, de um mês a um ano, e multa.
Parágrafo único – A pena é aumentada de um terço, se o agente é funcionário da saúde pública ou exerce a profissão de médico, farmacêutico, dentista ou enfermeiro. O tipo penal visa tutelar a saúde pública, sendo sujeito passivo a sociedade, e a mera circunstância de não se cumpriras determinações do Poder Público com o fim de impedir a difusão de uma doença contagiosa submete o sujeito ativo, em tese, nas penas da infração criminal prevista no art. 268 do Código Penal, sendo relevante salientar que o tipo possui característica de norma penal em branco, uma vez que imprescinde de complementação nos atos normativos do poder público (portarias, decretos, regulamentos, etc).
Desta forma, o agente que descumprir a legislação (Lei n.º 13.979/20) ou ato administrativo (norma do poder público), que vise impedir a introdução ou a propagação de coronavírus no Brasil, desde que o faça com livre consciência e vontade ou assuma o risco de produzir o resultado (dolos direto e eventual), perpetrará a infração de medida sanitária preventiva (art. 268 do CP), ainda que não implique resultado concreto, sendo suficiente o mero descumprimento (delito de perigo abstrato), tendo a lei presumido, de forma absoluta, o risco causado à sociedade em razão da conduta daqueles que violarem as normas do Poder Público, tratando-se, ainda, de delito formal (a consumação ocorre ainda que terceiros não sejam contaminados pelo Covid-19).
A título de exemplificação, incidirá nas penas da infração de medida sanitária preventiva o agente (diagnosticado com o Covid-19) que, após receber determinação para realizar compulsoriamente testes laboratoriais, deixar de realizá-lo (artigo 3º, III, “b”, da Lei 13.979/20), ouse, isolado por determinação médica, ignorar a medida e circular livremente nas ruas, (artigo 3, I, da Lei 13.979/20), não configurando o delito se o indivíduo (sadio) apenas descumprir recomendações do poder público, englobando a hipótese do cidadão (não contaminado pelo vírus) que sair para efetivar compras não essenciais (“supérfluas”) em um supermercado ou apenas efetivar um passeio em local não interditado, contrariando uma orientação (e não determinação)dos Entes Públicos para que “fique em casa”.
Destarte, o crime só incide em caso de descumprimento de imposição legal obrigatória (proibições de acesso a praças públicas, praias, abertura e funcionamento de lojas em comércio ou shopping center, etc), mas não quando houver apenas recomendações e/ou orientações oriundas do poder público e/ou de profissionais de saúde.
Por se tratar de crime de perigo abstrato, a simples probabilidade de contágio causado à sociedade em virtude do descumprimento de determinação do Poder Público é suficiente para a caracterização do delito, ainda que não ocasione resultado concreto, desde que haja potencial ofensa ao bem jurídico tutelado, ou seja, à saúde pública, conforme preleciona BITENCOURT:
Consuma-se o crime com a simples desobediência a determinação do Poder Público destinada a impedir a introdução ou propagação de doença contagiosa. Tratando-se de crime de perigo abstrato, desnecessária para sua configuração a efetiva introdução ou propagação de doença contagiosa. Contudo, será necessário demonstrar a idoneidade do comportamento infrator para produzir um potencial resultado ofensivo à preservação do bem jurídico saúde pública, visto sob a perspectiva genérica, caso contrário, a conduta será atípica, pela sua insignificância (BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal parte especial 4. São Paulo: saraiva, 2014, p.293)
Pode incidir a infração na hipótese de dolo eventual decorrente do fato de o agente ter ciência de que está assumindo o risco de introduzir ou propagar a doença contagiosa, mas descumprir a determinação do poder público. Cite-se o exemplo de uma pessoa ter sido diagnosticada com o vírus, mas se dirigir a uma praia ou local público com aglomeração de pessoas, não se importando acerca dos riscos efetivos de propagação da doença contagiosa.
Crime de epidemia
Em relação ao crime de epidemia (art. 267 do Código Penal), este é praticado quando determinada pessoa, ciente de estar contaminada pelo Covid-19, promover deliberadamente a transmissão da doença a outros.
Oportuno registrar que a mens legis (“espírito da lei”) abrange as situações de pandemia, porquanto não haveria lógica em conferir proteção à propagação de uma epidemia e deixar sem tutela penal a propagação do indigitado vírus (muito mais amplo e desastroso para a incolumidade pública), devendo-se conferir uma interpretação extensiva, ainda que se trate de norma penal incriminadora, porquanto a aludida hipótese apenas é vedada nas situações onde se configura um desvirtuamento do sentido da lei.
Nesse sentido, colaciona-se a seguinte ementa de decisão do Supremo Tribunal Federal (STF):
“CONSTITUCIONAL E PENAL. ACESSÓRIOS DE CELULAR APREENDIDOS NO AMBIENTE CARCERÁRIO. FALTA GRAVE CARACTERIZADA. INTELIGÊNCIA AO ART. 50, VII, DALEI 7.210/84, COM AS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELA LEI 11. 466/2007.INEXISTÊNCIA DE OFENSA AO PRINCIPIO DA RESERVA LEGAL. INTERPRETAÇÃOEXTENSIVA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTE. 1. Pratica infração grave, na forma prevista no art.50, VII, da Lei 7.210/84, com as alterações introduzidas pela Lei 11.466/2007, o condenado à pena privativa de liberdade que é flagrado na posse de acessórios de aparelhos celulares em unidade prisional. 2. A interpretação extensiva no direito penal é vedada apenas naquelas situações em que se identifica um desvirtuamento na mens legis. 3. A punição imposta ao condenado por falta grave acarreta a perda dos dias remidos, conforme previsto no art. 127 da Lei 7.210/84 e na SúmulaVinculante nº 9, e a conseqüente interrupção do lapso exigido para a progressão de regime. 4. Negar provimento ao recurso.” (STF RHC 106481, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 08/02/2011).
Por conseguinte, pode-se vislumbrar a hipotética situação na qual uma pessoa infectada (ciente de sua doença) viaje para uma comunidade isolada onde o vírus ainda não tenha sido propalado e alguns habitantes iniciem um quadro de infecção viral, podendo responder criminalmente pelo delito sub examine, cuja redação do tipo penal foi prevista na seguinte forma:
Art. 267 – Causar epidemia, mediante a propagação de germes patogênicos:
Pena – reclusão, de dez a quinze anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de 25.7.1990)
§ 1º – Se do fato resulta morte, a pena é aplicada em dobro.
§ 2º – No caso de culpa, a pena é de detenção, de um a dois anos, ou, se resulta morte, de dois a quatro anos.
Se a conduta oriunda do delito resultar em morte, o crime passará a ser hediondo, sofrendo o agente todas as consequências previstas no art. 2.º da Lei 8.072/90.
Crime de perigo de contágio de moléstia grave
Na hipótese de o agente ter ciência de que está contaminado com moléstia grave e, ainda assim, praticar ato capaz de produzir o contágio, incorrerá nas penas do crime previsto no artigo 131 do Código Penal, in verbis:
Art. 131 – Praticar, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave de que está contaminado, ato capaz de produzir o contágio:
Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.
Perigo para a vida ou saúde de outrem
In casu, o crime é doloso e somente pode ser praticado com a presença do elemento subjetivo especial ou fim especial de agir (tradicional “dolo específico), não sendo punível em caso de dolo eventual, em face da motivação específica prevista no tipo (“com o fim de transmitir a outrem moléstia grave…”).
É o caso, por exemplo, da pessoa que se dirige a um ambiente fechado (elevador com capacidade máxima ocupada), com o intuito direto de transmitir o vírus a terceiros.
Registre-se, ainda, que trata-se de delito formal, não sendo necessária, para a sua consumação, a incidência de resultado naturalístico, que seria o efetivo contágio das vítimas situadas no local (elevador, conforme o exemplo acima).
Perigo para a vida ou saúde de outrem
Em relação à tipificação do delito em comento, prescreve o Código Penal:
Art. 132 – Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente:
Pena – detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave.
Parágrafo único. A pena é aumentada de um sexto a um terço se a exposição da vida ou da saúde de outrem a perigo decorre do transporte de pessoas para a prestação de serviços em estabelecimentos de qualquer natureza, em desacordo com as normas legais. (Incluído pela Lei nº 9.777, de 1998)
O delito é de perigo concreto e doloso (dolo genérico ou eventual), consumando com a conduta relacionada à exposição da vida ou saúde de terceiros. É o caso do agente que, sabendo do seu contágio, resolve descumprir a determinação médica e legal de isolamento, e se desloque para um local público onde exista aglomeração de pessoas, expondo-as à perigo direto e iminente de contágio ou assumindo o risco de produzir o resultado.
Além disso, o tipo penal tem natureza subsidiária, porquanto só incide nas hipóteses em que o comportamento do agente não constituir delito mais grave.
Crime de desobediência
Em relação à infração criminal de desobediência (art. 330), a lei pode ser aplicada se, por exemplo, um agente público determinar que seja disseminada uma aglomeração em determinado local com a finalidade de evitar a disseminação do vírus (reunião de inúmeras pessoas em local público), e oindivíduo se recusar a cumprir a ordem legal, sem motivo justificado, atuando de forma consciente e voluntária (dolo genérico).
O bem jurídico protegido é a administração pública, tutelando-se a sua autoridade e prestígio,sendo ainda delito comum, isto é, pode ser praticado por qualquer pessoa.
Ademais, o tipo penal não se configura quando houver um simples pedido ou solicitação do funcionário, mas sim na hipótese de uma ordem legal e individualizada de funcionário público competente, dirigindo-se àquele que tem o dever jurídico de obedecê-la.
Vejamos o teor do disposto no artigo 330 do Código Penal:
Art. 330 – Desobedecer a ordem legal de funcionário público:
Pena – detenção, de quinze dias a seis meses, e multa.
Crime contra a economia popular
Se o agente provocar o aumento de preço de álcool em gel, aproveitando-se do momento de crise e demanda extraordinária do produto durante o período da pandemia, visando angariar lucros desproporcionais em detrimento da sociedade e do consumidor, incidirá em crime contra a economia popular.Nesse ponto, vejamos o teor do art. 3º da Lei 1.521/51:
Art. 3º. São também crimes desta natureza:
(…) VI – provocar a alta ou baixa de preços de mercadorias, títulos públicos, valores ou salários por meio de notícias falsas, operações fictícias ou qualquer outro artifício;
Como se vê, podemos exemplificar a hipótese do empresário que, aproveitando-se da situação de emergência ou calamidade pública, promover o súbito aumento nos preços, sem motivo justificado, ou seja, atuando de forma consciente e voluntária para provocar o aumento de preço mediante o artifício (expediente habilidoso) de que o produto estaria em “falta no mercado”.
Crimes contra as relações de consumo
Em relação ao delito contra os consumidores, trazemos a seguinte tipificação prevista no CDC (Código de Defesa do Consumidor- Lei n.º 8.078/90):
Art. 66. Fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir informação relevante sobre a natureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços:
Pena – Detenção de três meses a um ano e multa.
§ 1º Incorrerá nas mesmas penas quem patrocinar a oferta.
§ 2º Se o crime é culposo;
Pena Detenção de um a seis meses ou multa.
Com efeito, o agente que fizer afirmação falsa sobre dados essenciais do álcool em gel poderá responder pelo aludido delito previsto no Código de Defesa do Consumidor. Cite-se o exemplo da venda de álcool em gel a 70%, embora o produto efetivamente contivesse apenas 46%, ofertando-se mercadoria com característica e conteúdo falsos em detrimento da saúde e boa-fé dos consumidores.
O fato (objeto de tutela do direito penal) consubstancia-se mediante conduta dolosa, isto é, a vontade livre e consciente do agente de fazer afirmação falsa ou enganosa de produto ou serviço, omitindo informação relevante ou patrocinando oferta de mercadorias com dados inverídicos.
Crime de falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais
O tipo penal em análise tem previsão legal no artigo 273 do código penal (CP), e tem como condutas típicas previstas no caput as de falsificar, corromper, adulterar ou alterar produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais.
O ilícito tem a característica de ser “misto alternativo”, ou seja, a incidência de mais de um núcleo do tipo configura crime único, consumando-se, dentre outras hipóteses, com a comprovação do intuito de promover a falsificação ou adulteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (conduta dolosa, salvo a hipótese de crime culposo previsto no §2º do CP), sendo considerado crime de perigo abstrato, isto é, prescinde da demonstração do efetivo perigo à saúde pública.
Em relação ao objeto material, preleciona Cleber Masson:
É o produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais, ou seja, a substância líquida ou sólida voltada à atenuação da dor ou cura dos enfermos, ou ainda a matéria destinada à prevenção dos males que acometem os seres humanos” (MASSON, Cleber. Código Penal Comentado. São Paulo: editoramétodo. 2018, p. 1028).
Para fins de comprovação do fato criminoso, exige-se laudo pericial ou outro meio de prova apto a certificar a efetiva adulteração ou falsificação do produto (caput do art. 273 do CP), dispensando-se a perícia, porém, no caso do §1º-B, III e V, haja vista tratar-se de delito formal, que se aperfeiçoa com a simples importação, venda, exposição à venda, depósito, distribuição ou entrega a consumo do produto sem as características de identidade e qualidade admitidas para a sua comercialização, ou deprocedência ignorada, conforme se nota da seguinte ementa de decisão oriunda do Superior Tribunal de Justiça:
(…) MANUTENÇÃO EM DEPÓSITO DE SUBSTÂNCIAS MEDICAMENTOSAS IMPRÓPRIAS AO CONSUMO. DESNECESSIDADE DE LAUDO PERICIAL PARA COMPROVAÇÃO DA MATERIALIDADE DELITIVA. DELITO FORMAL. MÁCULA INEXISTENTE. É dispensável a confecção de laudo pericial para a comprovação da materialidade do delito previsto no artigo 273, § 1º-B, incisos III e V, do Código Penal, tendo em vista tratar-se de delito formal, que se aperfeiçoa com a simples importação, venda, exposição à venda, depósito, distribuição ou entrega a consumo do produto sem as características de identidade e qualidade admitidas para a sua comercialização, ou de procedência ignorada. Precedentes… (STJ, 5ª Turma, HC 356047/SP, Rel.Jorge Mussi, Dje 05/12/2018)
A principal distinção em relação à infração criminal prevista no artigo 66 do Código de Defesa do Consumidor (CDC) está adstrita ao fato de que nesta hipótese o produto em si não é falso, consumando-se mediante declarações falsas sobre a natureza, quantidade e qualidade do álcool em gel, enquanto o crime do art. 273 do Código Penal (CP) imprescinde (necessita) de comprovação da respectiva falsificação, corrupção, adulteração ou alteração do produto.
É válido ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a inconstitucionalidade na aplicação do preceito secundário previsto no artigo §1º-B do artigo 273 ( pena de 10 a 15 anos de reclusão, e multa), em razão da violação ao princípio da proporcionalidade, haja vista a equiparação desproporcional e irrazoável na aplicação de elevadas penas para o agente responsável pela falsificação do produto e aquele identificado como o autor da comercialização de determinado bem de origem ignorada ou o responsável pela importação de medicamentos sem registro, tendo, “porajuste principiológico”, fixado a orientação de aplicação da sanção cominada ao delito de tráfico de entorpecentes (05 a 15 anos de reclusão, além de multa), estando a discussão pendente de definição no Supremo Tribunal Federal (repercussão geral reconhecida no recurso extraordinário (RE) 979962).
Eis a respectiva ementa da decisão oriunda do Tribunal da cidadania:
(…) INCONSTITUCIONALIDADE DO PRECEITO SECUNDÁRIO DO ARTIGO 273, § 1ºB, DO CÓDIGO PENAL. APLICAÇÃO ANALÓGICA DA PENA DO DELITO DE TRÁFICO DE DROGAS. POSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO §4º DO ARTIGO 33 DA LEI 11.343/2006. 1. A Corte Especial deste Superior Tribunal de Justiça, no julgamento da Arguição de Inconstitucionalidade no Habeas Corpus n. 239.363/PR, declarou a inconstitucionalidade do preceito secundário do artigo 273, § 1º-B, do CódigoPenal, autorizando a aplicação analógica das penas previstas para o crime de tráfico de drogas. 2. Analisando o referido julgado, esta colenda Quinta Turma firmou o entendimento de que, diante da ausência de ressalva em sentido contrário, é possível a aplicação da causa de diminuição prevista no § 4º do artigo 33 da Lei 11.343/2006 no cálculo da pena dos condenados pelo delito previsto no artigo 273, § 1º-B, do Estatuto Repressivo. Precedentes. (STJ, 5ª Turma, HC 488299/PR, Rel.Jorge Mussi, DJe 28/03/2019)
De outra parte, impende registrar que a ANVISA considera o álcool em gel a 70%como medicamento antisséptico, devendo ser produzido conforme as boas práticas de fabricação de medicamentos, cujos critérios de elaboração são mais rigorosos dos exigidos para a produção de cosméticos (http://portal.anvisa.gov.br/anvisa-esclarece? Acesso em 25 de março 2020).
Além disso, a Secretaria de Saúde do Estado do Paraná, por intermédio de nota técnica, manifestou-se no sentido de que o álcool etílico em gel na condição de medicamento deve conter em seu rótulo a especificação mínima de 70% (setenta por cento) na sua composição (http://www.saude.pr.gov.br/arquivos/File/NotaTecnicaAlcoolGelcompleto.pdf. Acesso em 25 de março 2020).
Portanto, o sujeito ativo da ilicitude criminal poderá ser preso em flagrante e responder criminalmente pelo delito sub examine, se for flagrado comercializando produto falsificado com a suposta “roupagem” de álcool em gel para prevenção e/ou eliminação do vírus Covid-19.
Conclusão
As infrações penais relacionadas ao descumprimento das respectivas normas são de ação penal pública incondicionada, ou seja, independem de provocação da vítima, podendo ser instaurada a investigação por parte do Delegado de Polícia ou Membro do Ministério Público, assim como lavrado termo circunstanciado ex officio (de ofício) pela autoridade policial e posteriormente submetido à apreciação do titular da ação penal (Ministério Público) para fins de propositura de transação penal ou denúncia, caso seja comprovada a materialidade e autoria do fato.
Destarte, ante a proliferação da aludida pandemia, é necessário que toda a sociedade se conscientize e auxilie na contenção e propagação do vírus COVID-19, cumprindo as determinações do Poder Público, e atentando para a observância das recomendações e orientações emanadas do poder público e dos profissionais de saúde, visando à preservação do bem comum e a saúde da população.
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Suspeito preso por levar 11 fuzis para a Penha foi liberado da prisão pela Justiça 12 dias antes
Leandro Rodrigues da Silva, de 38 anos, tinha sido preso pela Polícia Rodoviária Federal no dia 15 de janeiro com 30 kg de drogas, mas foi solto na audiência de custódia no dia 18.
Leandro Rodrigues da Silva, de 38 anos, foi preso pela Polícia Federal, na madrugada desta quinta-feira (30), dirigindo um carro que levava 11 fuzis, de calibres 5,56 e 7,62, para o Complexo da Penha, na Zona Norte do Rio.
A prisão de Leandro aconteceu 12 dias depois dele ser liberado em uma audiência de custódia, em Campos dos Goitacazes, no Norte Fluminense. Ele havia sido preso por tráfico de drogas.
Morador da Zona Oeste do Rio, com ensino médio completo e se apresentando como motorista de aplicativo, Leandro foi preso no dia 15 de janeiro por policiais rodoviários federais, quando dirigia um Ford Fiesta, no quilômetro 203, da BR-101, em Casimiro de Abreu, no Norte Fluminense.
No veículo, os policiais rodoviários encontraram:
- 31,5 kg de maconha distribuídos em 41 tabletes em um saco preto;
- 1.439 frascos de líquido de cheirinho de loló;
- Dois galões de líquido semelhante a cheirinho de loló;
- 2 pacotes com pinos transparentes vazios;
- R$ 1.874 em dinheiro.
Levado para a 121ª DP (Casimiro de Abreu), Leandro mudou a versão de que tinha pegado a droga em Casimiro de Abreu. Ele contou que o carro foi abastecido na Linha Vermelha e seguia para Macaé. Em nenhum momento, segundo o Ministério Público, alegou estar fazendo uma corrida de aplicativo ou falou em entregador ou destinatário.
Leandro ficou preso por dois dias e, às 10h09 do dia 18 de janeiro, foi levado para a audiência de custódia. Na ocasião, o juiz Iago Saúde Izoton decidiu pela soltura de Leandro contrariando o MP, que pediu a conversão da prisão em flagrante para preventiva.
Em suas alegações, o magistrado informou que “a prisão preventiva se revela excepcional”:
A partir daí, o magistrado determinou que Leandro se apresentasse diante do juiz todo dia 10 de cada mês. Após a decisão do juiz, a promotora Luíza Klöppel, do Ministério Público estadual recorreu.
O MP apontou a gravidade do caso envolvendo o transporte da droga e o risco de que Leandro voltasse a delinquir.
12 dias depois da liberdade, os fuzis
Na noite de quarta-feira (29), os policiais federais da Delegacia de Repressão à Entorpecentes (DRE) iniciaram uma vigilância na serra, na altura do município de Paulo de Frontin em busca de uma moto que transportava material ilícito.
Ao encontrarem a BMW, presenciaram o momento em que o ocupante repassou duas malas ao motorista de um Nissan preto. O veículo foi seguido pelos policiais até um posto de gasolina onde foi feita a abordagem.
O motorista do carro era Leandro Rodrigues da Silva. O da moto, Gutenberg Samuel de Oliveira. Ambos foram presos e os veículos apreendidos.
O carregamento tinha 8 fuzis, de calibre 5.56 e 3 fuzis calibre 7.62, além dos veículos utilizados no transporte das armas. Todas as armas com a marca de uma caveira semelhante ao personagem Justiceiro, da Marvel.
De acordo com as investigações preliminares, o arsenal teria como destino os complexos da Penha e do Alemão, onde está baseada a chefia da facção Comando Vermelho.
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Argentina corta taxas e Brasil volta a ter maior juro real do mundo
País comandado por Javier Milei caiu da primeira para a terceira posição, após seu Banco Central reduzir suas taxas de juros em 3 pontos percentuais. Topo agora está com Brasil e Rússia.
O Brasil passou a ter o maior juro real do mundo. Na noite de quinta-feira (30), o Banco Central da Argentina, antiga líder do ranking, promoveu um novo corte em sua taxa básica de juros e tirou o país da primeira posição.
A autoridade monetária reduziu suas taxas de 32% para 29% ao ano. Segundo a instituição, essa redução é consequência da “consolidação observada nas expectativas de menor inflação.”
A Argentina encerrou 2024 com uma inflação anual de 117,8%. Apesar de ainda estar bastante alta, houve uma forte desaceleração em relação aos 211,4% registrados em 2023.
Com a taxa de juro real é calculada, entre outros pontos, pela taxa de juros nominal do país descontada a inflação prevista para os próximos 12 meses, o juro real argentino caiu para 6,14%. O país passou, então, para a terceira colocação no ranking.
Quem assume a ponta é antigo vice-líder, o Brasil. Nesta semana, o Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu aumentar mais uma vez a Selic em 1 ponto percentual, levando o juro nominal a 13,25% ao ano, e o juro real a 9,18%.
Na segunda posição vem a Rússia, com uma taxa de juros real de 8,91%.
Veja abaixo os principais resultados da lista de 40 países.
Ranking de juros reais
Taxas de juros atuais descontadas a inflação projetada para os próximos 12 meses
Alta da Selic
Na última quarta-feira (29), o Copom anunciou sua decisão de elevar a taxa básica de juros em 1 ponto percentual, para a casa de 13,25% ao ano.
Na decisão anterior, em dezembro, a autoridade monetária já havia elevado a taxa básica em 1 ponto percentual, para a casa de 12,25% ao ano. A decisão marca a quarta alta seguida da Selic.
Juros nominais
Considerando os juros nominais (sem descontar a inflação), a taxa brasileira permaneceu na 4ª posição.
Veja abaixo:
- Turquia: 45,00%
- Argentina: 29,00%
- Rússia: 21,00%
- Brasil: 13,25%
- México: 10,00%
- Colômbia: 9,50%
- África do Sul: 7,75%
- Hungria: 6,50%
- Índia: 6,50%
- Filipinas: 5,75%
- Indonésia: 5,75%
- Polônia: 5,75%
- Chile: 5,00%
- Hong Kong: 4,75%
- Reino Unido: 4,75%
- Estados Unidos: 4,50%
- Israel: 4,50%
- Austrália: 4,35%
- Nova Zelândia: 4,25%
- República Checa: 4,00%
- Canadá: 3,25%
- Alemanha: 3,15%
- Áustria: 3,15%
- Espanha: 3,15%
- Grécia: 3,15%
- Holanda: 3,15%
- Portugal: 3,15%
- Bélgica: 3,15%
- França: 3,15%
- Itália: 3,15%
- China: 3,10%
- Coreia do Sul: 3,00%
- Malásia: 3,00%
- Cingapura: 2,98%
- Dinamarca: 2,60%
- Suécia: 2,50%
- Tailândia: 2,25%
- Taiwan: 2,00%
- Suíça: 0,50%
- Japão: 0,50%
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De volta à planície: ex-presidentes da Câmara contam como é deixar o poder e analisam desafios do novo comando
Deputados que já comandaram a Casa analisam desafios do próximo presidente. Próxima eleição da cúpula da Câmara está marcada para 1º de fevereiro.
No dia 1º de fevereiro, a Câmara dos Deputados elegerá um novo presidente para comandar o colegiado pelos próximos dois anos.
Com isso, Arthur Lira (PP-AL) retornará à planície, termo comumente utilizado no Congresso para se referir aos deputados sem acesso aos cargos da mesa diretora, instalada no centro do plenário. Quem se senta à mesa, tem visão completa dos deputados que estão no plenário, abaixo, por isso o termo “planície”.
A reportagem ouviu cinco ex-presidentes da Câmara que responderam às mesmas perguntas sobre o que a saída desse cargo representou em suas trajetórias. João Paulo Cunha, Henrique Eduardo Alves e Rodrigo Maia não deram entrevistas.
Estranhamento
A experiência da maioria mostra que o dia seguinte após deixar o cargo pode ser seguido de estranhamento pelo poder perdido.
“Claro que a mudança é brusca e que você tem que passar por um período de adaptação, porque você não pode criar ilusão que o poder é seu”, diz Aldo Rebelo, que ocupou o posto entre 2005 e 2007 pelo PCdoB.
Uma saída é recorrer às antigas amizades, conta Arlindo Chinaglia, presidente da Câmara pelo PT entre 2007 e 2009.
Entre os políticos, há desconforto em retornar para os trabalhos da Casa sem ocupar um cargo decisório.
“Eu reconheço que, toda vez que um presidente sai e precisa voltar para o plenário, fica uma situação talvez um pouco desconfortável”, afirma Michel Temer, presidente da Casa em três ocasiões.
Segundo ele, seu processo foi mais simples por ter deixado o comando da Câmara pela primeira vez, em 2001, para assumir a presidência do MDB, e na segunda vez, em 2010, ser vice-presidente da República, na chapa de Dilma Rousseff.
Uma saída, segundo Marco Maia, presidente da Câmara pelo PT entre 2011 e 2013, é não entrar no cargo com expectativa de prolongação de poder.
A dificuldade de reposicionamento depois da saída do comando da Casa também aflige Arthur Lira. Ele é cotado para assumir um cargo na Esplanada dos Ministérios do presidente Lula, mas há impasse sobre sua adesão completa ao governo.
Papel como ex-presidente
O grupo é uníssono sobre a relevância de um ex-presidente da Câmara. Para Aécio Neves, presidente da Casa de 2001 a 2002 pelo PSDB, a experiência é útil para os sucessores.
Para ele, não estar à frente das decisões demanda, muitas vezes, maturidade. “[É importante] encontrar o seu espaço e não ficar disputando permanente holofotes. É um exercício de maturidade que todos os homens públicos devem buscar em determinado momento da sua trajetória.”
Chinaglia afirma que a forma como o presidente atua impacta no tamanho da influência após a saída do cargo. “Depende de como você chegou, de como você se elegeu e de como você saiu. Se o cara for respeitado pelo que ele pensa, se cumpre com a palavra, ele se mantém influente”, afirma.
Desafios
Os ex-presidentes da Casa destacam o novo protagonismo da Câmara em relação ao Orçamento, com influência cada vez maior do Poder Legislativo em detrimento do Executivo.
Para alguns, há excessos na nova atuação. “Eu acho que há um certo, digamos, exagero na volúpia do Congresso sobre nacos do Orçamento”, afirma Aécio.
Marco Maia afirma que a discussão sobre o orçamento tem tamanho maior que as outras pautas da Casa, e que por isso os deputados buscam atuar mais como “executores do que legisladores”.
O desgaste pelas quedas de braço do Legislativo com o Executivo e com o Judiciário é apontado pelos ex-presidentes como um desafio importante para o próximo ciclo da Câmara.
“Restabelecer os limites das atribuições de cada um dos poderes é o maior desafio do próximo presidente da Câmara. Sobretudo, garantir uma relação harmoniosa entre os poderes, definindo limites”, diz Aécio.
Para Chinaglia, o desafio do momento é defender a democracia, impondo respeito à Casa, mas viabilizando a construção de acordos. Já Temer destaca a importância da regulamentação total da reforma tributária, iniciada no ano passado.
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