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Especial IstoÉ: Os desabafos de Cármen Lúcia
Na semana mais conturbada desde que assumiu o STF, a presidente Cármen Lúcia vira alvo de pressões de todos os lados e reage com a simplicidade e a firmeza moral que se exige de quem ocupa o posto mais importante da República no atual momento do País
Na terça-feira 13, a presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, desembarcou no Aeroporto de Congonhas para um evento em São Paulo. Um táxi a aguardava. Preocupada com o trânsito intenso, ela comentou sobre o risco de não chegar no horário. Sem dar um pio, o motorista enveredou por caminhos alternativos para driblar os congestionamentos. Ao fim, deixou Cármen Lúcia no local combinado e, para seu alívio, a tempo. A presidente do STF agradeceu. “Só fiz porque era a senhora. Se fosse qualquer outra daquelas autoridades de Brasília, ia ficar mofando no engarrafamento”, respondeu ele.
Situações como a vivida com o taxista em São Paulo representam um alento para a presidente do Supremo. Em sua avaliação, o STF nunca esteve sob tanta eletricidade político-jurídica. “Celso de Mello (decano, o ministro mais antigo) e Marco Aurélio Mello (o segundo mais experiente) me disseram, e eu concordo, que nunca na história o STF viveu momento tão tenso”, disse Cármen Lúcia a um interlocutor. Ela, porém, evita se deixar levar pelas inclementes pressões que vem sofrendo, oriundas especialmente daqueles que desejam livrar da cadeia o ex-presidente Lula, condenado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região a 12 anos de prisão. Esforça-se para sobreviver serena e incólume. Ocorre que, não raro, o presidente de um poder, como o Supremo, precisa falar não apenas nos autos, mas bem alto. Seguindo essa premissa, ela reagiu. Nos últimos dias, fez uma série de desabafos. ISTOÉ recolheu algumas frases ditas por ela em conversas com assessores e pessoas próximas, que resumem como Cármen Lúcia avalia os desafios enfrentados no comando do Poder Judiciário. “São desafios inerentes ao cargo, muito mal compreendidos nesse que é um dos momentos mais complexos da nossa história”, disse ela, numa das conversas.
Na verdade, longe de se contaminar pelas manifestações de apoio, Cármen Lúcia cultiva hoje a impressão de que sua atuação não agrada a ninguém. “Quando eu era professora, achava que um ou outro aluno provavelmente não gostava de mim. Porque era reprovado, porque tinha alguma nota baixa. Como juíza, imaginava que uns 50% não gostavam de mim, porque uns eu condenava e outros absolvia. Aqui na presidência do Supremo, fico com a sensação de que ninguém gosta de mim. Qualquer decisão que eu tome vai agradar e desagradar. Ainda mais num momento como esse”, avaliou em reunião com um de seus auxiliares.
Romaria
A razão principal das pressões sofridas por Cármen Lúcia diz respeito à indecorosa tentativa de revisão da prisão após condenação em segunda instância. Nos últimos dias, uma romaria de políticos – e também de ministros da própria Corte – se dirigiu ao gabinete da presidente do STF. No início da semana, cinco ministros do STF ensaiaram uma união para tentar tirar de Cármen a prerrogativa de recolocar o tema em pauta. Em vão. Na quarta-feira 14, Cármen recebeu um grupo de deputados da oposição. Os parlamentares entregaram a ela um documento assinado por 12 partidos no qual foi solicitada a inclusão do habeas corpus em favor de Lula na agenda do STF. Ao que a ministra jogou a bola para o relator a Lava Jato no STF, Edson Fachin, com quem se encontra hoje o novo pedido de HC do ex-presidente petista. Tudo indica, no entanto, que não irá prosperar. Como também não prosperou o pedido do petista ao TRF-4 de ser notificado por email sobre o julgamento dos embargos de declaração, cinco dias antes do derradeiro julgamento.
Apesar da sucessão de reveses, a banca que defende o ex-presidente Lula exerce marcação cerrada. Na própria quarta-feira 14, o advogado José Paulo Sepúlveda Pertence esteve pessoalmente com Cármen. E, depois, também com Fachin. Para a presidente do Supremo, o encontro é absolutamente normal. Mas a quem deu-lhe ouvidos, na última semana, ela tocou o cerne da questão: “É absolutamente natural que o juiz escute essas alegações para formar o seu juízo. Agora, não se pode levar em conta a eventual importância ou popularidade do réu. As alegações de Lula ou as de qualquer outro preso que eu condenei têm o mesmo peso. São a mesma coisa”, comparou ela, de acordo com seu interlocutor. É a essência do conceito de Justiça cega.
Protocolo
Nesse sentido, ela busca atender a todos da mesma forma. No dia 1º de março, por exemplo, quando a presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR), plantou-se na antessala de Cármen Lúcia acompanhada de outras dez parlamentares, comunicando que dali não sairia enquanto não fosse recebida, a presidente do STF foi aconselhada por Celso de Mello a não atender a comitiva. “Isso é um desrespeito”, resumiu ele. Cármen Lúcia não seguiu o conselho: “Vou ouvir o que elas querem dizer”, disse ela. De acordo com um assessor, a presidente do STF estabelece regras para impedir que tais conversas extrapolem e gerem maiores constrangimentos. “Aqui, ainda que o interlocutor seja amigo, o tratamento é “senhora”, “ministra”, “presidente”. Tudo segue esse protocolo para que ninguém sinta espaço para extrapolar”, explicou ela depois do encontro.
A presidente do Supremo reúne convicções firmes quanto às razões que a levam a resistir à imensa pressão para colocar na pauta da Corte a mudança do posicionamento que permite a prisão após condenação em segunda instância. Para ela, revisões dessa natureza precisam ser feitas com muito cuidado e parcimônia. Só devem ocorrer quando o pensamento da sociedade acerca de um tema evolui. Mas tal evolução evidentemente não aconteceu com relação a um tema que foi tratado pelo STF num intervalo de apenas um ano e meio. O Supremo já tratou da prisão após condenação em segunda instância três vezes. A última em outubro de 2016. Para Cármen Lúcia, uma eventual alteração de postura agora não derivaria da evolução do pensamento da sociedade. Mas somente porque o personagem central é um ex-presidente da República de um partido político de expressão.

REGIMENTO CUMPRIDO Segundo o TRF-4, Lula terá que consultar sistema “e-proc” dois dias antes da data do derradeiro julgamento (Crédito:Divulgação)
Ou seja: uma decisão de caráter meramente pessoal. Além disso, para Cármen Lúcia, pedidos de revisão nunca deveriam partir de quem foi vencido nas apreciações. “Na Suprema Corte americana, somente os vencedores podem pedir revisão de um posicionamento”, explicou ela a um interlocutor na semana passada. “Imagine: quem foi vencido vai ficar pedindo revisão da decisão até deixar de ser vencido e virar vencedor?”
Fim dos recursos infinitos
A presidente do Supremo, na verdade, formou entendimento de que a prisão após condenação em segunda instância tornou-se peça fundamental no combate à corrupção. A prisão não impede o réu de seguir buscando reverter sua pena até a última instância. É, porém, uma forma importante de evitar que os infinitos graus de recurso acabem impedindo a Justiça de ser feita: os culpados, com bons advogados, protelam ao máximo a decisão final e seus crimes acabam prescritos antes da condenação.
Diversos países, como os Estados Unidos, França e Argentina, admitem a prisão em segunda instância. No caso específico da Lava Jato, é a perspectiva da prisão que tem feito com que diversos dos envolvidos optem pela delação premiada. Que interesse alguém teria em promover um acordo de delação se vislumbrasse a perspectiva de recorrer em liberdade até seu crime prescrever? Num dos desabafos apurados por ISTOÉ, Cármen Lúcia foi taxativa: “A revisão da prisão após condenação em segunda instância vai fazer o combate à corrupção retroceder 50 anos”.
Com a mesma serenidade com que resiste às pressões dos aliados de Lula, Cármen Lúcia encara a polêmica criada em razão do encontro mantido com o presidente Michel Temer, no sábado 10. Os mesmos que se postam na sua antessala exigindo ser atendidos para clamar por Lula criticam o fato de ela, presidente do Poder Judiciário, encontrar-se de forma pública com o presidente do Poder Executivo. Temer é investigado pelo Supremo no caso do decreto dos portos que, segundo a acusação, poderia ter beneficiado uma empresa que atua no Porto de Santos. Segundo Cármen, Temer não tratou da acusação contra ele. E nem conseguiria caso tentasse. O encontro girou em torno do tema segurança pública, pauta comum a Temer e Cármen.
Como presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a ministra foi quem elaborou o Cadastro Nacional de Presos. “Nesses tempos conturbados, uma agenda normal entre presidentes de Poderes ganha contornos de desconfiança”, comentou Cármen com uma pessoa de sua intimidade. Para concluir, em seguida, com a simplicidade de sempre: “Se levássemos em consideração todas as implicações de cada um, o País simplesmente pararia”. Como declarou na terça-feira 13 ao participar de seminário em São Paulo, Cármen Lúcia criou uma fórmula segura para enfrentar as pressões das quais tem sido alvo. Simplesmente não cede a elas.
O QUE DISSE A PRESIDENTE DO STF
Em conversas com assessores e colegas de toga, a presidente do STF teceu uma série de considerações sobre o atual momento de efervescência da Suprema Corte. Abaixo, as principais observações:
SOBRE LULA:
“Qualquer réu tem o direito de fazer suas alegações. E é absolutamente natural que o juiz escute essas alegações para formar o seu juízo. Agora, não se pode levar em conta a eventual importância ou popularidade do réu. Para mim, as alegações de Lula ou as de qualquer outro preso que condenei têm o mesmo peso. São a mesma coisa”
SOBRE O ATUAL MOMENTO DO STF:
“Celso de Mello e Marco Aurélio Mello me disseram, e eu concordo, que nunca na história
o STF viveu momento tão tenso”

AFINADOS Em reunião com Cármen Lúcia, Celso de Mello e Marco Aurélio concordaram que tensão no STF não encontra precedentes na história (Crédito:Tony Oliveira)
RECOLOCAR A PRISÃO EM SEGUNDA INSTÂNCIA NA PAUTA:
“Revisões de posicionamento acontecem porque a sociedade evolui. Mas isso não pode acontecer num período de apenas um ano e meio. E a revisão não pode surgir por iniciativa de quem foi vencido. Na Suprema corte americana, somente os vencedores podem pedir revisão de um posicionamento. Aqui não pode ser diferente. Imagine: quem foi vencido vai ficar pedindo revisão da decisão até virar vencedor?”
CONSEQUÊNCIAS SOBRE O FIM DA PRISÃO EM SEGUNDA INSTÂNCIA:
“O fim da prisão em segunda instância faria retroceder em 50 anos o combate à corrupção. As inúmeras possibilidades de recurso fariam os crimes prescreverem. Não haveria mais motivo para que alguém fizesse colaboração premiada”
PRESSÕES DO PT PELA LIBERDADE DE LULA:
“O PT tem o direito de defender suas posições. Mas tudo segue dentro de absoluta formalidade. Aqui, ainda que o interlocutor seja amigo, conhecido de antes de eu ser presidente do Supremo, o tratamento é “senhora”, “ministra”, “presidente”. Tudo segue esse protocolo para que ninguém sinta espaço para extrapolar”
SUA PRÓPRIA IMAGEM:
“Quando eu era professora, achava que um ou outro aluno não gostava de mim. Porque era reprovado, levava alguma nota baixa. Como juíza, imaginava que uns 50% não gostavam de mim, porque uns eu condenava e outros absolvia. Aqui na presidência do Supremo, fico com a sensação de que ninguém gosta de mim. Qualquer decisão agrada e desagrada. Ainda mais num momento como esse”

O QUE OS UNIU Cármen Lúcia e Michel Temer no sábado 10: na pauta, a segurança (Crédito:Pedro Ladeira/Folhapress)
ENCONTRO COM TEMER:
“Temos uma pauta comum, em torno da segurança pública. O governo usará o Cadastro Nacional de Presos que está sendo produzido pelo Conselho Nacional de Justiça, e que ficará pronto em maio. Temos nossas responsabilidades como chefes dos Poderes. Se levássemos em consideração todas as implicações de cada um nesse momento tão conturbado, o País simplesmente pararia”
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Cardiologistas apontam os melhores tratamentos para pressão alta
A pressão alta ocorre devido a combinação de fatores genéticos e estilo de vida pouco saudável. Doença afeta 1 bilhão de pessoas no mundo
Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), a pressão alta é uma condição que afeta mais de 1 bilhão de pessoas no mundo. Ela ocorre quando o sangue circula nas artérias com força exagerada de forma constante. Se não tratada, a evolução da hipertensão pode levar a quadros de acidente vascular cerebral (AVC), infarto e insuficiência renal.
Os casos acontecem devido a fatores genéticos e estilo de vida: obesidade, dietas alimentares inadequadas, sedentarismo, excesso de álcool e estresse são a “combinação perfeita” para a pressão alta.
Segundo especialistas entrevistados pelo Metrópoles, o tratamento pode ser feito com medicamentos. Eles ajudam a controlar a pressão arterial, relaxando vasos sanguíneos e diminuindo o volume de líquidos nas artérias.
No entanto, em casos mais leves, mudanças no estilo de vida são suficientes para reduzir a hipertensão ou conjugadas à medicação.
Além do medicamento
Alterações na rotina são imprescindíveis para diminuir a pressão alta, e a alimentação tem papel fundamental. A inclusão de comidas mais saudáveis, como frutas, vegetais, grãos integrais e laticínios com baixo teor de gordura, é uma boa alternativa. Também é recomendado reduzir o consumo de sódio e álcool.
“Diante do quadro de pressão alta, a alimentação pode influenciar e ajudar bastante no controle pressórico. O primeiro passo é diminuir o consumo de sal. Ele é o grande vilão quando se trata de hipertensão”, afirma a cardiologista Érica Renata, da Clínica Cardiosenior, em Brasília.
A prática de exercícios físicos com regularidade é importante para o funcionamento adequado do organismo, já que ajuda a reduzir o sedentarismo e controlar o peso. Evitar o tabagismo e gerenciamento do estresse são outras táticas naturais essenciais.
Crianças e adolescentes
Apesar de ocorrer principalmente após os 50 anos, um estudo recente mostrou que a ocorrência de crianças e adolescentes com pressão alta tem aumentado. Dados estimam que cerca de 114 milhões de jovens têm a condição no mundo. A pesquisa foi publicada na revista científica The Lancet Child & Adolescent Health em novembro.
A alta dos casos nesse público tem ligação com o estilo de vida inadequado, com uma rotina alimentar repleta de alimentos ultraprocessados e pouca atividade física. O ciclo iniciado na infância tem se refletido cada vez mais cedo, aumentando as chances de crianças hipertensas se tornarem adultos com a doença.
De acordo com o cardiologista Renault Ribeiro Júnior, hábitos saudáveis devem ser introduzidos desde cedo para evitar uma geração hipertensa no futuro.
“Devemos procurar ser o maior exemplo para nossos filhos de como evitar um quadro de hipertensão. Se quisermos ter uma geração saudável, isso deve começar dentro de nossas casas”, sugere o coordenador de cardiologia do Hospital Santa Lúcia, em Brasília.
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Farra do INSS: presidente de ONG investigada foi condenado por caixa 2
Abraão Lincoln, presidente da CBPA, teria utilizado conta bancária de uma trabalhadora vinculada a ele para receber valores não declarados
Abraão Lincoln Ferreira da Cruz, presidente da Confederação Brasileira dos Trabalhadores de Pesca e Aquicultura (CBPA) – uma das associações sediadas em Brasília e investigadas por embolsar R$ 221,8 milhões na Farra do INSS, foi condenado em agosto deste ano por “caixa 2” nas eleições de 2014.
Naquele ano, Abraão se candidatou a uma vaga no Congresso Nacional pelo estado do Rio Grande do Norte. À época, ele teria utilizado a conta bancária de uma auxiliar de secretaria subordinada a ele para receber valores não declarados à Justiça Eleitoral.
Segundo o Ministério Público, na conta da mulher, usada como laranja, “vultuosos” valores circulavam. Conforme apurado pelo órgão, um filho de Abraão era responsável por sacar o dinheiro, quando o montante não era encaminhado para outras contas, como a da esposa do aposentado.
A investigação eleitoral teve início após desdobramento da Operação Enredados. Inicialmente voltada para apurar crimes ambientais e de lavagem de capitais no setor pesqueiro, a ação também acabou revelando elementos que apontavam para a prática de ilícitos eleitorais a partir da quebra de sigilo do celular de um suspeito.
Durante as fases do processo, o Ministério Público Eleitoral identificou um repasse de um policial militar no valor de R$ 86 mil para a conta laranja. Ao MP o homem disse que prestou serviços ao réu, mas não conseguiu explicar a transferência. Além do PM, a esposa de Abraão também teria depositado R$ 46 mil na conta da trabalhadora.
Em depoimento, o presidente da CBPA disse que os valores depositados eram frutos de uma “vaquinha” arrecadada pela Confederação da Pesca para “fomentar os movimentos nacionais do setor”. No entanto, ao ser indagado sobre o motivo de o dinheiro não ter entrado na conta da própria entidade ou até mesmo na conta dele, Abraão desconversou.
Na ação, o aposentado negou ter feito caixa 2 e declarou, ainda, que os valores seriam utilizados para o evento “Gritos da Pesca”. O Ministério Público, porém, informou que em uma “simples pesquisa no Google” foi possível verificar que o encontro ocorreu em momento “totalmente diferente da movimentação bancária”.
Organização criminosa
Em 2015, Abraão Lincoln Ferreira da Cruz foi um dos 18 alvos da Operação Enredados, deflagrada pela Polícia Federal (PF). À época, a investigação revelou esquema de crimes ambientais e contra a administração pública com ramificações em diversos estados, cuja sede era em Brasília.
A prisão preventiva de Abraão foi decretada em 14 de outubro de 2015. No documento, ele é citado como líder da organização criminosa que atuava junto ao extinto Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA). As acusações formais imputadas a Abraão incluíam corrupção ativa, crimes contra o meio ambiente, emissão de autorização em desacordo com as normas ambientais e crimes praticados por particular contra a administração.
Segundo a operação, Abraão agia na liderança do grupo, juntamente a outros indivíduos, para obter atos administrativos ilícitos junto ao MPA. As ações incluíam emissão de licença para a venda de arraias com finalidade ornamental e ampliação da capacidade de estocagem desses animais por empresas laranjas.
Após solicitação da defesa, o presidente da CBPA foi solto em janeiro de 2016. O processo ainda tramita na Justiça.
Prisão do presidente
Em 4 de novembro deste ano, Abraão foi preso novamente, dessa vez pela CPMI do INSS sob a acusação de falso testemunho. Na ocasião, o sindicalista teria mentido sobre conhecer o tesoureiro da CBPA, Gabriel Negreiros – que é padrinho de um neto dele. Ao longo da sessão, o deputado federal Duarte Jr. (PSB-MA) apresentou uma foto do batizado da criança e também afirmou que Abraão Lincoln depositou R$ 5 milhões em uma conta de Negreiros.
“Ele (Abraão Lincoln) chama de relação institucional depositar R$ 5 milhões na conta do Gabriel Negreiros, que nada mais é do que padrinho do neto dele. Ele ser padrinho do seu neto é relação institucional?”, questionou Duarte Jr.
Após ser pressionado pelo deputado, Abraão Lincoln disse que se confundiu ao responder o relator da CPMI, deputado Alfredo Gaspar, a respeito da relação com Negreiros. Segundo a comissão, Abraão também teria mentido em outros quatro momentos.
Na mesma data, o presidente da CBPA pagou fiança e foi liberado.
Careca do INSS e ligações políticas
Abraão Lincoln já comandou o Republicanos no Rio Grande do Norte e foi candidato a deputado federal pelo partido em 2018.
Ele mantém relação com políticos da legenda, tanto figuras regionais como nacionais. A influência se estende também ao próprio INSS.
Em 2024, o ex-diretor de benefícios André Fidelis pegou uma diária somente para ir a uma festa da entidade. Investigado pela PF, Fidelis foi exonerado do cargo em julho do ano passado, após reportagens da Farra do INSS.
A CBPA ainda aparece como uma das entidades que pagou o lobista Antonio Carlos Camilo Antunes, o Careca do INSS, um dos pivôs do escândalo revelado pelo Metrópoles.
Apenas uma funcionária
A reportagem esteve no local em que está localizada a sede da associação. Na pequenina sala comercial, apenas uma funcionária costuma aparecer. O horário da mulher, apontada como secretária, também chama a atenção. Conforme testemunhas, ela permanece no endereço por aproximadamente duas horas por dia.
Segundo um relatório da Controladoria-Geral da União (CGU), a CBPA “não possui infraestrutura para localização, captação, cadastramento e muito menos fornecimento de serviços” compatíveis com o registro de milhares de associados, espalhados por mais de 3,6 mil municípios. Mesmo assim, até 2025, a associação conseguiu 757 mil cadastrados.
De acordo com CPMI que apura as fraudes, dos 215 mil aposentados e pensionistas vinculados à confederação que reclamaram de descontos, 99% não teriam autorizado a entidade a aplicar as deduções de seus benefícios no INSS.
Crescimento exponencial
A CBPA foi criada em 2020. Dois anos depois, obteve o acordo de cooperação técnica com o INSS – que permite os descontos nos benefícios, mesmo sem ter nenhum associado.
Apesar da falta de empregados, em 2023 o número de pessoas ligadas à CBPA passou de quatro, em maio, para mais de 340 mil associados no fim do ano, resultando em arrecadação anual de R$ 57,8 milhões.
No primeiro trimestre de 2024, auge da farra dos descontos indevidos, o número de filiados saltou para 445 mil, e o faturamento bateu R$ 41,2 milhões no período.
Durante sessão na CPMI do INSS, o deputado Alfredo Gaspar (União-AL) classificou, em tom de crítica, o aumento no número de cadastros da associação como um “case” de sucesso. “Até 2025, eles conseguiram 757 mil cadastros, que correspondem a mais de R$ 221 milhões no período de dois anos”, disse o parlamentar.
De acordo com informações obtidas pela coluna Tácio Lohan, do Metrópoles, a CGU suspeita que a confederação tenha contratado uma empresa de telemarketing para buscar as filiações, o que é vedado, conforme os termos do acordo de cooperação técnica (ACT) com o INSS.
“Considerando o mês com 22 dias úteis e 8 horas de jornada de trabalho diário, a CBPA teria adicionado 8.524,86 descontos associativos por dia útil, isto é, 17,76 descontos por minuto”, pontuou o órgão.
“A CBPA não tem registro de nenhum funcionário junto à RAIS [Relação Anual de Informações Sociais], mas os quantitativos de descontos associativos adicionados são tão elevados que, mesmo que associação alegasse possuir 100 funcionários, os descontos associativos nessa quantidade ainda seriam improváveis de terem sido incluídos com observância de todas as formalidades legais e contratuais”, concluiu a CGU.
Segundo a Controladoria-Geral da União, a CBPA também teria solicitado mais de 40 mil vezes a inclusão de descontos em benefícios de pessoas mortas.
Farra no INSS
- O escândalo do INSS foi revelado pelo Metrópoles em uma série de reportagens publicadas a partir de dezembro de 2023.
- Três meses depois, o portal mostrou que a arrecadação das entidades com descontos de mensalidade de aposentados havia disparado, chegando a R$ 2 bilhões em um ano, enquanto as associações respondiam a milhares de processos por fraude nas filiações de segurados.
- As reportagens do Metrópoles levaram à abertura de inquérito pela Polícia Federal (PF) e abasteceram as apurações da Controladoria-Geral da União (CGU).
- No total, 38 matérias do portal foram listadas pela PF na representação que deu origem à Operação Sem Desconto, deflagrada no dia 23/4 e que culminou nas demissões do presidente do INSS e do então ministro da Previdência, Carlos Lupi.
O outro lado
Ao Metrópoles a defesa de Abraão Lincoln disse que “recorreu e o TRE-RN ainda não julgou o recurso”. “O caixa 2 seria, segundo a denúncia, gastos na contabilizados que correspondem a uma fração irrisória do gasto total declarado”, disse Emanuel Grilo, advogado de Abraão.
“Naquele tempo não havia teto de gastos de campanha, e cada partido informava à justiça eleitoral quanto gastaria, de modo que não faria sentido sonegar documentos da prestação de contas deliberadamente”, finalizou.
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Mais de 80% das decisões do STF em 2025 foram monocráticas
Mais de 80% das decisões dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) em 2025 foram monocráticas (individuais). O dado foi divulgado pelo presidente da Corte, ministro Edson Fachin, durante a sessão de encerramento do ano judiciário na última sexta-feira (19).
Neste ano, o STF recebeu mais de 85 mil processos e proferiu cerca de 116 mil decisões, tanto em ações originárias quanto em recursos. Do total, 80,5% das decisões foram monocráticas e 19,5% colegiadas. Em relação a 2024, segundo Fachin, houve um aumento de 5,5% no número de decisões tomadas pelo conjunto dos ministros.
No STF, decisões monocráticas são aquelas dadas por apenas um ministro, geralmente em casos urgentes, quando há entendimento já consolidado do Tribunal ou para aplicar decisões anteriores da Corte.
Em alguns casos, esse tipo de decisão precisa ser levado ao colegiado em seguida para confirmação, modificação ou rejeição dela pelo plenário, ou por uma das turmas.
Quando o tema já foi decidido várias vezes pela Corte, o ministro pode apenas aplicar esse entendimento em decisões individuais, o que evita rediscutir a mesma matéria em sessões colegiadas, desafogando as sessões de deliberação.
No geral, é competência do relator decidir sozinho questões como negar seguimento a recursos, conceder ou negar liminares e aplicar precedentes.
Embora sejam comuns em todos os tribunais, as decisões monocráticas passaram a ser alvo de críticas nos últimos anos, principalmente por parte do Congresso Nacional, que vê nesse instrumento um excesso de poder individual dos ministros.
Desde 2023, parlamentares discutem medidas para limitar esse tipo de decisão.
Em novembro, após o ministro Gilmar Mendes decidir de forma monocrática restringir à PGR (Procuradoria-Geral da República) o poder de pedir o impeachment de ministros do Supremo, o Congresso reagiu e retomou a tramitação de uma proposta sobre o tema.
No mesmo dia da decisão de Gilmar, a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania) da Câmara aprovou, em caráter terminativo, um projeto de lei que limita decisões individuais de ministros contra leis aprovadas pelo Congresso Nacional.
A proposta também restringe o direito de partidos políticos recorrerem sozinhos ao STF para derrubar leis ou atos do Poder Executivo.
Segundo o projeto, de autoria do deputado federal e presidente nacional do Republicanos, Marcos Pereira (SP), o ministro que proferir uma decisão monocrática deverá submetê-la à análise do plenário do Supremo na sessão seguinte. Caso isso não ocorra, a decisão perde a validade. O texto ainda precisa passar pelo Senado.






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