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Dosimetria contradiz PL Antifacção e pode beneficiar PCC e CV

Palácio do Congresso Nacional, em Brasília • Carlos Moura/Agência Senado
A disputa entre dois projetos que tratam da redução e do endurecimento de penas deve criar um impasse jurídico e político no Congresso. O PL da Dosimetria e o PL Antifacção apresentam contradições e podem gerar situações jurídicas de conflito, caso sejam aprovados pelo Congresso.
“São projetos contraditórios que vão acabar entrando em vigor e criando, claro, situações de conflito”, avalia o defensor público e professor de Direito Penal Gustavo Junqueira.
Segundo Junqueira, as divergências mais evidentes dizem respeito à progressão de pena em crimes de feminicídio e crimes hediondos que resultaram em morte. O especialista explica que o PL Antifacção aumentou o tempo de pena necessário para que pudesse haver a progressão, enquanto o PL da Dosimetria manteve o mesmo percentual da legislação atual.
A proposta da dosimetria — aprovada na madrugada da última quarta-feira (10) pela Câmara dos Deputados — reduz as penas de envolvidos na trama golpista do 8 de janeiro, mas também pode beneficiar outros condenados.
O texto prevê a possibilidade de progressão após o cumprimento de um sexto da pena, com percentuais maiores aplicados a crimes hediondos, feminicídios, constituição de milícia e reincidência.
O projeto altera o artigo 112 da Lei de Execução Penal, estabelecendo novas condições e percentuais mínimos para progressão de regime. Pela regra em vigor, a transferência para um regime menos rigoroso ocorre após o cumprimento de 16% da pena, desde que o crime não tenha sido cometido com violência ou grave ameaça.
Enquanto o PL da Dosimetria suaviza as regras, o PL Antifacção — aprovado no Senado e ainda pendente de nova votação na Câmara — segue o caminho oposto. Seu objetivo é endurecer o combate ao crime, ao elevar, por exemplo, de 40% para 70% o tempo mínimo de cumprimento de pena para réus primários condenados por crimes hediondos antes de progredirem ao regime semiaberto.
Na avaliação de Junqueira, a coexistência dos dois textos tende a gerar insegurança jurídica. Ele avalia que, caso ambos sejam aprovados, o último a entrar em vigor deverá prevalecer. As duas propostas, contudo, ainda estão sob análise no Congresso e devem sofrer ajustes.
“Sempre existe o risco de judicialização quando você tem esse tipo de confusão legislativa. Ela acaba não só trazendo maior instabilidade e insegurança quanto ao conteúdo das decisões como acaba provocando também um número maior de recursos nos tribunais, o que é um custo público. É um gasto público, cada processo tem um custo para a sociedade”, avalia Gustavo Junqueira.
No Senado, o relator da proposta da dosimetria, Esperidião Amin (PP-SC) deve ajustar pontos sensíveis para conciliar as pautas. “Estamos, senadores Sergio Moro, Alessandro Vieira e eu, trabalhando para preservar o desejado e afastar o indesejável”, afirmou Amin. O parecer está previsto para ser apresentado na próxima terça-feira (16).
Além das contradições com o PL Antifacção, o texto da dosimetria abre brechas legais que, segundo Junqueira, podem abrandar penas de crimes violentos não classificados como hediondos.
“Todos os crimes violentos que não são hediondos, não são crimes contra pessoa, não são crime contra o patrimônio, passam a permitir progressão com ⅙ da pena. Dentre esses crimes, você tem o lenocínio violento, você tem a resistência com violência, você tem a coação no curso do processo. São dezenas de crimes no Código Penal e na legislação extravagante que, hoje, exigem 25 ou 30% para progressão e passam a exigir apenas ⅙, que são 16,6%”, diz o defensor público.
Ele cita exemplos como lenocínio violento, resistência com violência e coação no curso do processo. Nessa perspectiva, até integrantes de facções como PCC e CV poderiam, em tese, ser atingidos.
A possiblidade de judicialização também é considerada alta. “Sempre existe o risco de judicialização quando você tem esse tipo de confusão legislativa. Ela acaba não só trazendo maior instabilidade e insegurança quanto ao conteúdo das decisões como acaba provocando também um número maior de recursos nos tribunais”, alerta Junqueira.
O projeto do deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), relator da dosimetria na Câmara, deve ser votado na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado na próxima quarta-feira (17), com possibilidade de ir ao plenário no mesmo dia. O relator no Senado afirma que ajustes podem depender da temperatura política e não descarta novas negociações em torno de uma proposta de anistia.
O ex-presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), foi consultado no início do ano para auxiliar na elaboração de um texto que permitisse reavaliar penas de envolvidos nos atos de 8 de janeiro. Contudo, sem apoio da oposição, a proposta não chegou a ser apresentada.
Contrário à anistia, Pacheco defende uma punição menor para pessoas que não tenham exercido liderança no movimento de intenção golpista e que tenham sido influenciadas pela multidão no dia dos atos.
“Não é algo de impunidade, mas de gradação que possa ser justa para a aplicação da pena em cada caso concreto”, disse Pacheco a jornalistas no Senado. “O deputado Paulinho fez algo parecido, mas mexeu também na questão de progressão de regime, que era algo que nós nunca tínhamos pensado”, complementou.
Para Pacheco, ainda é necessário analisar com cautela os efeitos das alterações.
“Todos os crimes com violência ou grave ameaça têm que ter um tratamento ou é de um sexto, ou é de um quarto, ou é de um terço, o que seja. Essa excepcionalização casuística para os crimes do Estado Democrático de Direito é algo que precisa ser avaliado”, afirmou Pacheco.
Entenda abaixo as principais diferenças entre o PL da Dosimetria e o PL Antifacção:
Crime hediondo
PL da Dosimetria: fixa em 40% o percentual mínimo de cumprimento de pena exigido para a progressão de pena, em caso de réu primário. Caso o réu seja reincidente (que já foi condenado por crimes anteriormente), deve cumprir ao menos 60% da pena. Se o réu for reincidente em crimes hediondos que tiveram morte como resultado, o percentual é de 70%.
PL Antifacção: determina como percentual mínimo de cumprimento de pena 70% (30% a mais do que o PL da Dosimetria e a legislação atual) para réus primários, e 80% para reincidentes. Em casos de o réu ser reincidente e tiver crimes resultados em morte, deverá cumprir 85% da pena.
Comando de organização criminosa
PL da Dosimetria: em caso de o réu ser condenado por exercer o comando de uma organização criminosa feita para a prática de um crime hediondo, ele deverá cumprir 50% da sua pena antes de progredir de regime.
PL Antifacção: o condenado por exercer o comando de organização criminosa que visa a prática de crime hediondo ou equiparado deverá cumprir ao menos 75% da pena (25% a mais do que propõe o PL da Dosimetria).
Caso entre em vigor, o PL da Dosimetria pode ainda abrir espaço para judicialização e novos recursos. Isso porque o texto, diferente da proposta de anistia, não fixa uma data ou período para ter como foco os condenados do 8 de janeiro. Em vez disso, altera a lei de uma forma geral e pode beneficiar líderes de organizações criminosas, como Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, e Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar.
“Sempre existe o risco de judicialização quando você tem esse tipo de confusão legislativa. Ela acaba não só trazendo maior instabilidade e insegurança quanto ao conteúdo das decisões como acaba provocando também um número maior de recursos nos tribunais, o que é um custo público. É um gasto público, cada processo tem um custo para a sociedade”, avalia Gustavo Junqueira.
Facção criminosa ou milícia privada
PL da Dosimetria: quando o condenado por crime de constituição de milícia privada, ele deverá cumprir ao menos 50% da pena em regime fechado antes da mudança de regime.
PL Antifacção: o condenado por constituir facção criminosa ou milícia privada deverá cumprir ao menos 75% da pena em regime fechado (também 25% a mais do que o outro PL).
Feminicídio
PL da Dosimetria: caso a condenação seja pela prática de feminicídio e o condenado for réu primário, a pena deverá ser cumprida 55% em regime fechado.
PL Antifacção: os condenados por crime de feminicídio, se forem réus primários, deverão cumprir ao menos 75% da pena em regime fechado (20% a mais).
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Tesouro paga R$ 1 bilhão em dívidas de estados e municípios em novembro
Os maiores valores são referentes a dívidas pagas pelos estados do Rio de Janeiro (R$ 2,77 bilhões) e de Minas Gerais (R$ 1,45 bilhão), além de outros estados e municípios. Em 2025, a União já recuperou R$ 247,47 milhões em contragarantias

No acumulado do ano, os governo federal já pagou R$ 9,59 bilhões em débitos dos Estados e municípios. Foto: Reprodução
A União pagou R$ 1,05 bilhão em dívidas atrasadas de estados e municípios em novembro, segundo o Relatório de Garantias Honradas pela União em Operações de Crédito e Recuperação de Contragarantias, divulgado nesta segunda-feira (15) pelo Tesouro Nacional.
No acumulado do ano, já são R$ 9,59 bilhões de débitos honrados de entes federados. Em 2024, o valor chegou a R$ 11,45 bilhões de dívidas garantidas pela União.
Do total pago no mês passado, R$ 704,81 milhões são débitos não quitados pelo estado do Rio de Janeiro; R$ 227,80 milhões do Rio Grande do Sul; R$ 75,32 milhões de Goiás; R$ 35,66 milhões de Minas Gerais; R$ 9,64 milhões do município de Parauapebas (PA); R$ 116,15 mil de Paranã (TO); e R$ 76,47 mil de Santanópolis (BA).
Desde 2016, a União pagou R$ 85,04 bilhões em dívidas garantidas. Além do relatório mensal, o Tesouro Nacional disponibiliza os dados no Painel de Garantias Honradas.
As garantias representam os ativos oferecidos pela União – representada pelo Tesouro Nacional – para cobrir eventuais calotes em empréstimos e financiamentos dos estados, municípios e outras entidades com bancos nacionais ou instituições estrangeiras, como o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Como garantidora das operações, a União é comunicada pelos credores de que não houve a quitação de determinada parcela do contrato.
Recuperação de garantias
Caso o ente não cumpra suas obrigações no prazo estipulado, o Tesouro compensa os calotes, mas desconta o valor coberto de repasses federais ordinários – como receitas dos fundos de participação e compartilhamento de impostos, além de impedir novos financiamentos. Sobre as obrigações em atraso incidem ainda juros, mora e outros encargos previstos nos contratos de empréstimo, também pagos pela União.
Há casos, entretanto, de bloqueio na execução das contragarantias pela adoção de regimes de recuperação fiscal, por meio de decisões judiciais que suspenderam a execução ou por legislações de compensação das dívidas. Dos R$ 85,04 bilhões honrados pela União, cerca de R$ 77,46 bilhões se enquadram nessas situações.
Desde 2016, a União recuperou R$ 5,9 bilhões em contragarantias. Os maiores valores são referentes a dívidas pagas pelos estados do Rio de Janeiro (R$ 2,77 bilhões) e de Minas Gerais (R$ 1,45 bilhão), além de outros estados e municípios. Em 2025, a União já recuperou R$ 247,47 milhões em contragarantias.
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Estudo da Ufac aponta que segurança na posse da terra reduz o desmatamento no Acre
A análise feita considerou dois indicadores principais: a proporção da área desmatada em cada imóvel e a probabilidade de cumprimento do Código Florestal

O levantamento foi feito por um profesora da Universidade Federal do Acre/Foto: Alexandre Noronha/Varadouro
Um estudo liderado pelo professor João Paulo Santos Mastrangelo, do Centro de Ciências Biológicas e da Natureza (CCBN) da Universidade Federal do Acre (UFAC), aponta que propriedades rurais com maior segurança na posse da terra apresentam menores taxas de desmatamento e maior cumprimento do Código Florestal no Acre. A pesquisa foi publicada na revista científica internacional World Development e analisa a relação entre governança fundiária e desmatamento na Amazônia brasileira.
O trabalho utilizou uma base de dados inédita com informações de 35.067 imóveis rurais privados registrados no Cadastro Ambiental Rural (CAR) no Acre. Juntas, essas propriedades somam cerca de 5,9 milhões de hectares, o equivalente a 36% do território estadual. O estudo avaliou o desmatamento ocorrido entre 2009 e 2018, período marcado tanto pela queda quanto pela retomada das taxas de desmatamento na Amazônia.
A análise considerou dois indicadores principais: a proporção da área desmatada em cada imóvel e a probabilidade de cumprimento do Código Florestal, que na Amazônia, em regra, limita o desmatamento a 20% da área das propriedades rurais. O estudo também diferenciou imóveis com situação fundiária regular daqueles com ocupações irregulares.
Como critério de segurança na posse da terra, os pesquisadores adotaram a ausência de sobreposição de polígonos no CAR, ou seja, a inexistência de disputas aparentes por uma mesma área. Propriedades sem sobreposição foram classificadas como tendo maior segurança fundiária, enquanto aquelas com áreas sobrepostas foram consideradas em situação de insegurança.
Os resultados indicam que imóveis com maior segurança na posse apresentaram uma proporção de área desmatada entre 1 e 2,6 pontos percentuais menor em comparação a propriedades semelhantes com insegurança fundiária. Em termos relativos, o desmatamento pode ser até cerca de um terço menor em áreas onde não há disputa por terra.

Os pesquisadores cruzaram diversos dados durante a pesquisa/Foto: Reprodução
Por Vitor Paiva
Além disso, a segurança fundiária aumentou a probabilidade de cumprimento do Código Florestal. Entre propriedades que não haviam ultrapassado o limite de 20% de desmate até 2008, aquelas com maior segurança na posse registraram taxas de conformidade entre 5 e 11 pontos percentuais superiores às de imóveis com sobreposição de áreas. Mesmo entre propriedades que haviam desmatado além do limite antes de 2008 e foram anistiadas pela alteração do Código Florestal em 2012, a segurança na posse esteve associada a menor expansão do desmatamento após o período de anistia.
Para chegar aos resultados, os autores aplicaram diferentes métodos econométricos, incluindo modelos com efeitos fixos por proprietário e técnicas de ponderação por escore de propensão, capazes de controlar diferenças observáveis e não observáveis entre os imóveis analisados. A consistência dos resultados entre os modelos reforça a evidência de um efeito causal da segurança fundiária na redução do desmatamento.
O estudo destaca que a simples emissão de títulos de terra não garante, por si só, a conservação florestal, se não houver uma governança fundiária eficaz, capaz de coibir sobreposições, grilagem e conflitos pela terra. Nesse contexto, o Cadastro Ambiental Rural é apontado como uma ferramenta central não apenas para o monitoramento ambiental, mas também para identificar avanços e fragilidades na gestão fundiária da Amazônia.
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Municípios do Acre podem aderir a ‘Plano Federal de Cuidados’ após portaria publicada pelo governo
Portaria estabelece regras para que gestores locais elaborem planos de cuidados em até um ano; adesão é voluntária e sem repasse de recursos

A medida regulamenta a implementação da Política Nacional de Cuidados, instituída por lei em 2024. Foto: captada
Os municípios acreanos, assim como os demais do país, estão autorizados a aderir voluntariamente ao Plano Nacional de Cuidados após a publicação da Portaria nº 1.134/2025, no Diário Oficial da União desta segunda-feira (15).
O Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS) publicou nesta segunda-feira (15) a portaria que regulamenta a adesão voluntária de estados, Distrito Federal e municípios ao Plano Nacional de Cuidados. A medida detalha os procedimentos para que os entes federativos implementem a Política Nacional de Cuidados, criada por lei em 2024.
De acordo com a Portaria nº 1.134/2025, os governos interessados deverão indicar um órgão gestor e um coordenador responsável por elaborar um diagnóstico territorial, ouvir a sociedade civil e formular um plano local alinhado às diretrizes nacionais. O coordenador também participará de capacitações promovidas pelos ministérios do Desenvolvimento Social e das Mulheres.
A adesão será formalizada por meio de um termo assinado eletronicamente, com vigência de 36 meses, prorrogável. Os planos locais devem ser instituídos em até 12 meses após a formalização. A portaria não prevê transferência de recursos financeiros, ficando as despesas a cargo dos orçamentos próprios.
O Plano Nacional de Cuidados tem caráter intersetorial, integrando políticas de saúde, assistência social, educação, trabalho e cultura, com o objetivo de garantir o direito ao cuidado ao longo da vida e promover a corresponsabilidade de gênero.

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