Brasil
Congresso é o Poder legítimo para decidir sobre droga, aponta debate

Presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (C) comandou a sessão.
No mesmo dia em que o Supremo Tribunal Federal (STF) retoma o julgamento do processo que discute a descriminalização do porte de drogas para consumo próprio, senadores e especialistas foram unânimes em defender que o Congresso Nacional é o único Poder responsável e legítimo para promover mudanças na Lei de Drogas no Brasil (Lei 11.343, 2006). O tema foi abordado em sessão temática no Plenário do Senado, nesta quinta-feira (17), e evidenciou as manifestações contrárias aos votos já proferidos pelos ministros da Corte até o momento.
Para o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que já tinha se colocado contra a discussão do tema pelo STF, o assunto é complexo, transversal e qualquer mudança na legislação deve ser liderada pelo Legislativo, único lugar próprio e com legitimidade para o tratamento jurídico do tema. Segundo ele, o Congresso reúne a competência para ouvir todos os Poderes e a sociedade civil.
— Devem ser ouvidos representantes do setor de saúde, da área jurídica, de comunidades terapêuticas e tantos outros quantos sejam necessários. Parlamentares de ambas as Casas do Congresso Nacional, efetivos representantes da população e das unidades da Federação, podem, e devem, participar ativamente desse debate, que certamente não se restringe a um único Poder, tampouco ao Poder Judiciário. A participação deve ser de todos os Poderes, de toda a sociedade, sob a liderança do Parlamento, e não pode haver nenhum tipo de restrição de foro de discussão que não permita uma amplitude desse debate com a sociedade brasileira.
O julgamento no STF começou em 2015, foi retomado em 2 de agosto deste ano, foi suspenso novamente e deve seguir nesta quinta. Até agora, os ministros Luíz Roberto Barroso, Edson Fachin, Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes votaram a favor de alguma forma de descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal no país. Na última sessão, Alexandre de Moraes votou para que não seja considerado mais o crime do porte de maconha para consumo pessoal.

Plenário do Senado, durante a sessão de debates temáticos.
Traficante x consumidor
O autor do requerimento para realização do debate, senador Efraim Filho (União-PB), se somou às críticas do presidente do Senado. Na avaliação dele, o tema exige coragem e lucidez do Congresso para que suas competências não sejam atropeladas por outro Poder. O senador ainda levantou aspectos técnicos que, segundo ele, devem ser levados em consideração além da quantidade de droga apreendida. Entre as dúvidas elencadas por ele está a manutenção da equiparação entre tráfico de entorpecentes e crimes hediondos e a complexidade de se definir um critério objetivo para diferenciar consumidor de traficante.
— Fica uma pergunta: como descriminalizar o consumo se, ao mesmo tempo, a produção e a distribuição das drogas seguem sendo crimes? Vejam a complexidade da matéria. A Constituição de 1988 equipara o tráfico de entorpecentes ao crime hediondo. E continuamos perguntando: apenas a quantidade de drogas seria suficiente para determinar a diferenciação entre o usuário e o traficante? E se o traficante começar a comercializar pequenas quantidades de droga dentro do limite do tal “uso pessoal”, sobre o qual o STF se dispõe a fixar esse entendimento? — questionou.
A mesma dúvida foi manifestada pelo promotor de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) José Theodoro Corrêa de Carvalho. Ele alertou que, durante toda a sua atuação no Judiciário, tem observado que os traficantes usam estratégias para não serem flagrados e presos, limitando-se ao transporte de pequena quantidade de droga para evitar problemas maiores com a polícia e a Justiça. Para ele, a decisão do STF é um equívoco pois não considera que a fixação de uma quantidade mínima seja suficiente para distinguir traficantes de usuários e assim resolver a questão do alto índice de encarceramento no Brasil.
— É comum que eles tragam poucas drogas consigo e tenham estoques ou divisão de tarefas para que eles evitem um problema maior com a polícia e com a Justiça. Então, a fixação em critérios objetivos para definir qual seria o enquadramento entre usuário e traficante também me parece um equívoco. É normal que nós tenhamos situações de traficantes flagrados com um único grama de uma substância ilícita e que tenhamos provas cabais de que eles estavam ali vendendo aquele único grama.
O senador Sérgio Moro (União-PR) concordou com o promotor. Ele disse que atualmente o tráfico se constitui em uma cadeia muito organizada que consegue se adaptar a essas alterações, como a que vem sendo ventilada pelo STF. Moro defendeu que outros indícios sejam levados em consideração para diferenciar traficante e consumidor, além do critério de quantidade de droga para o porte.
— Quando se estabelece um parâmetro absoluto: “Olhe, abaixo de 60 gramas vai ser consumidor, acima pode ser traficante”, é um grande risco das operações serem estruturadas no varejo, no distribuidor pequeno dessa maneira, para evitar responsabilização. Será que é sábio estabelecer um parâmetro fixo?
Outros países
O deputado Osmar Terra (MDB-RS), que está à frente dessa discussão há mais de 20 anos, alertou para o avanço dos efeitos do consumo de drogas no Brasil e o risco que a descriminalização pode, segundo ele, ampliar a dependência e o comprometimento da saúde da sociedade brasileira e o fortalecimento do crime organizado no país. Para ele é preciso se espelhar nas experiências de outros países que vieram a afrouxar a legislação. Nesses cenários, alegou ele, são registrados aumento do tráfico, da dependência química e da violência.
— O tráfico nunca esteve tão forte como está agora, 10 anos depois no Uruguai. O Uruguai está tendo chacinas, 14 pessoas foram mortas há duas semanas. No Uruguai, triplicou o número de homicídios porque os traficantes se transferiram para lá; é liberado, é uma coisa em que pegam leve. São 1,2 mil farmácias no Uruguai, e só 20 estão vendendo a maconha, o que é o permitido. Na esquina, está o traficante vendendo mais barato e mais potente a droga, e vendendo as outras junto — citou.
O presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria, Antônio Geraldo da Silva, ressaltou que uma possível facilitação no acesso a entorpecentes pode agravar a situação do Brasil que já registra cerca de 70 milhões de pessoas com algum transtorno mental, enquanto 11,3% da população sofre com sintomas depressivos.
— Sabe qual é a quantidade prevista que é segura para o consumo da maconha? Zero! Não há quantidade prevista de segurança do uso. Se há que banir uma droga da face da Terra, é a maconha. Então, a gente tem que diminuir é a produção. Nós temos que diminuir a possibilidade de distribuição. Nós conseguimos fazer isso com o antibiótico. Nós podemos conseguir fazer isso com todas as drogas — alertou.
Ativismo judicial
Na opinião do coordenador da Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas da Universidade Federal de São Paulo, Ronaldo Laranjeira, a mobilização de ativistas a favor da descriminalização das drogas contaminou a discussão no STF. Para ele, os primeiros votos já proferidos até o momento está em descompasso com as opiniões das famílias brasileiras sobre o assunto e também com a ciência. Ele citou pesquisa coordenada por ele junto a famílias brasileira segundo a qual 85% dos entrevistados são contrários a qualquer liberalização de entorpecentes. Os senadores Marcos Rogério (PL-RO) e Jorge Seif (PL-SC) também expuseram a mesma visão.
— A Constituição vai determinar que todo poder emana do povo que o exerce por meio dos seus representantes legítimos, legitimamente eleitos. Portanto, o poder originário, central, absoluto está com o povo. E a delegação para a representação, para o exercício desse poder, está dentro desta Casa, do Congresso Nacional, Senado e Câmara — argumentou Marcos Rogério.
Em outra frente, os senadores Esperidião Amin (PP-SC) e Cleitinho (Republicanos-MG) defenderam a realização de um plebiscito sobre o assunto.
— Eu não tenho dúvida de que mais de 80% da sociedade brasileira não aprova medidas de liberação, especialmente porque nós não temos condições de controlar essas medidas sofisticadas de micropeso. Por isso eu acho que é oportuno que nós deliberemos, e acho que é necessário que o que for decidido ou que venha a ser decidido seja submetido à consulta popular sob a forma de plebiscito. Plebiscito é uma consulta que se faz previamente, ou sob a forma de referendo, que, como o nome diz, significa aprovação da sociedade para aquilo que nós acharmos que é o certo — alegou Amin.
Zequinha Marinho (Podemos-PA), Magno Malta (PL-ES) e Eduardo Girão (Novo-CE) criticaram a postura do STF. No entendimento deles o Supremo está “degradando” uma geração e comprometendo o futuro do país”. De acordo com os senadores, o país não possui políticas públicas e programas para lidar com as consequências da discriminalização. Caso o STF julgue pela legalização do porte da maconha, defendeu Magno Malta, o Congresso terá que reverter essa posição.
— Não vamos entrar no mérito, o mérito que tem que haver é o seguinte: em se exacerbando lá, nós tenhamos a competência de criar algo aqui o instrumento que anula aquilo que vai se decidir do lado de lá — acrescentou Magno Malta.
Julgamento
No julgamento do STF, um dos argumentos da Defensoria Pública de São Paulo, que entrou com o Recurso Extraordinário (RE 635.659) questionando uma decisão do Colégio Recursal do Juizado Especial Cível de Diadema, contra a condenação de um homem à pena de dois meses de prestação de serviços comunitários pelo crime de porte de drogas para consumo pessoal, é que o dispositivo contraria o princípio da intimidade e da vida privada. No entendimento deles, a ação não implicaria em danos a bens jurídicos alheios. O caso tem repercussão geral reconhecida, ou seja, a decisão do STF neste julgamento deverá balizar casos similares em todo o país.
Fonte: Agência Senado
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Tesouro paga R$ 1 bilhão em dívidas de estados e municípios em novembro
Os maiores valores são referentes a dívidas pagas pelos estados do Rio de Janeiro (R$ 2,77 bilhões) e de Minas Gerais (R$ 1,45 bilhão), além de outros estados e municípios. Em 2025, a União já recuperou R$ 247,47 milhões em contragarantias

No acumulado do ano, os governo federal já pagou R$ 9,59 bilhões em débitos dos Estados e municípios. Foto: Reprodução
A União pagou R$ 1,05 bilhão em dívidas atrasadas de estados e municípios em novembro, segundo o Relatório de Garantias Honradas pela União em Operações de Crédito e Recuperação de Contragarantias, divulgado nesta segunda-feira (15) pelo Tesouro Nacional.
No acumulado do ano, já são R$ 9,59 bilhões de débitos honrados de entes federados. Em 2024, o valor chegou a R$ 11,45 bilhões de dívidas garantidas pela União.
Do total pago no mês passado, R$ 704,81 milhões são débitos não quitados pelo estado do Rio de Janeiro; R$ 227,80 milhões do Rio Grande do Sul; R$ 75,32 milhões de Goiás; R$ 35,66 milhões de Minas Gerais; R$ 9,64 milhões do município de Parauapebas (PA); R$ 116,15 mil de Paranã (TO); e R$ 76,47 mil de Santanópolis (BA).
Desde 2016, a União pagou R$ 85,04 bilhões em dívidas garantidas. Além do relatório mensal, o Tesouro Nacional disponibiliza os dados no Painel de Garantias Honradas.
As garantias representam os ativos oferecidos pela União – representada pelo Tesouro Nacional – para cobrir eventuais calotes em empréstimos e financiamentos dos estados, municípios e outras entidades com bancos nacionais ou instituições estrangeiras, como o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Como garantidora das operações, a União é comunicada pelos credores de que não houve a quitação de determinada parcela do contrato.
Recuperação de garantias
Caso o ente não cumpra suas obrigações no prazo estipulado, o Tesouro compensa os calotes, mas desconta o valor coberto de repasses federais ordinários – como receitas dos fundos de participação e compartilhamento de impostos, além de impedir novos financiamentos. Sobre as obrigações em atraso incidem ainda juros, mora e outros encargos previstos nos contratos de empréstimo, também pagos pela União.
Há casos, entretanto, de bloqueio na execução das contragarantias pela adoção de regimes de recuperação fiscal, por meio de decisões judiciais que suspenderam a execução ou por legislações de compensação das dívidas. Dos R$ 85,04 bilhões honrados pela União, cerca de R$ 77,46 bilhões se enquadram nessas situações.
Desde 2016, a União recuperou R$ 5,9 bilhões em contragarantias. Os maiores valores são referentes a dívidas pagas pelos estados do Rio de Janeiro (R$ 2,77 bilhões) e de Minas Gerais (R$ 1,45 bilhão), além de outros estados e municípios. Em 2025, a União já recuperou R$ 247,47 milhões em contragarantias.
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Estudo da Ufac aponta que segurança na posse da terra reduz o desmatamento no Acre
A análise feita considerou dois indicadores principais: a proporção da área desmatada em cada imóvel e a probabilidade de cumprimento do Código Florestal

O levantamento foi feito por um profesora da Universidade Federal do Acre/Foto: Alexandre Noronha/Varadouro
Um estudo liderado pelo professor João Paulo Santos Mastrangelo, do Centro de Ciências Biológicas e da Natureza (CCBN) da Universidade Federal do Acre (UFAC), aponta que propriedades rurais com maior segurança na posse da terra apresentam menores taxas de desmatamento e maior cumprimento do Código Florestal no Acre. A pesquisa foi publicada na revista científica internacional World Development e analisa a relação entre governança fundiária e desmatamento na Amazônia brasileira.
O trabalho utilizou uma base de dados inédita com informações de 35.067 imóveis rurais privados registrados no Cadastro Ambiental Rural (CAR) no Acre. Juntas, essas propriedades somam cerca de 5,9 milhões de hectares, o equivalente a 36% do território estadual. O estudo avaliou o desmatamento ocorrido entre 2009 e 2018, período marcado tanto pela queda quanto pela retomada das taxas de desmatamento na Amazônia.
A análise considerou dois indicadores principais: a proporção da área desmatada em cada imóvel e a probabilidade de cumprimento do Código Florestal, que na Amazônia, em regra, limita o desmatamento a 20% da área das propriedades rurais. O estudo também diferenciou imóveis com situação fundiária regular daqueles com ocupações irregulares.
Como critério de segurança na posse da terra, os pesquisadores adotaram a ausência de sobreposição de polígonos no CAR, ou seja, a inexistência de disputas aparentes por uma mesma área. Propriedades sem sobreposição foram classificadas como tendo maior segurança fundiária, enquanto aquelas com áreas sobrepostas foram consideradas em situação de insegurança.
Os resultados indicam que imóveis com maior segurança na posse apresentaram uma proporção de área desmatada entre 1 e 2,6 pontos percentuais menor em comparação a propriedades semelhantes com insegurança fundiária. Em termos relativos, o desmatamento pode ser até cerca de um terço menor em áreas onde não há disputa por terra.

Os pesquisadores cruzaram diversos dados durante a pesquisa/Foto: Reprodução
Por Vitor Paiva
Além disso, a segurança fundiária aumentou a probabilidade de cumprimento do Código Florestal. Entre propriedades que não haviam ultrapassado o limite de 20% de desmate até 2008, aquelas com maior segurança na posse registraram taxas de conformidade entre 5 e 11 pontos percentuais superiores às de imóveis com sobreposição de áreas. Mesmo entre propriedades que haviam desmatado além do limite antes de 2008 e foram anistiadas pela alteração do Código Florestal em 2012, a segurança na posse esteve associada a menor expansão do desmatamento após o período de anistia.
Para chegar aos resultados, os autores aplicaram diferentes métodos econométricos, incluindo modelos com efeitos fixos por proprietário e técnicas de ponderação por escore de propensão, capazes de controlar diferenças observáveis e não observáveis entre os imóveis analisados. A consistência dos resultados entre os modelos reforça a evidência de um efeito causal da segurança fundiária na redução do desmatamento.
O estudo destaca que a simples emissão de títulos de terra não garante, por si só, a conservação florestal, se não houver uma governança fundiária eficaz, capaz de coibir sobreposições, grilagem e conflitos pela terra. Nesse contexto, o Cadastro Ambiental Rural é apontado como uma ferramenta central não apenas para o monitoramento ambiental, mas também para identificar avanços e fragilidades na gestão fundiária da Amazônia.
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Municípios do Acre podem aderir a ‘Plano Federal de Cuidados’ após portaria publicada pelo governo
Portaria estabelece regras para que gestores locais elaborem planos de cuidados em até um ano; adesão é voluntária e sem repasse de recursos

A medida regulamenta a implementação da Política Nacional de Cuidados, instituída por lei em 2024. Foto: captada
Os municípios acreanos, assim como os demais do país, estão autorizados a aderir voluntariamente ao Plano Nacional de Cuidados após a publicação da Portaria nº 1.134/2025, no Diário Oficial da União desta segunda-feira (15).
O Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS) publicou nesta segunda-feira (15) a portaria que regulamenta a adesão voluntária de estados, Distrito Federal e municípios ao Plano Nacional de Cuidados. A medida detalha os procedimentos para que os entes federativos implementem a Política Nacional de Cuidados, criada por lei em 2024.
De acordo com a Portaria nº 1.134/2025, os governos interessados deverão indicar um órgão gestor e um coordenador responsável por elaborar um diagnóstico territorial, ouvir a sociedade civil e formular um plano local alinhado às diretrizes nacionais. O coordenador também participará de capacitações promovidas pelos ministérios do Desenvolvimento Social e das Mulheres.
A adesão será formalizada por meio de um termo assinado eletronicamente, com vigência de 36 meses, prorrogável. Os planos locais devem ser instituídos em até 12 meses após a formalização. A portaria não prevê transferência de recursos financeiros, ficando as despesas a cargo dos orçamentos próprios.
O Plano Nacional de Cuidados tem caráter intersetorial, integrando políticas de saúde, assistência social, educação, trabalho e cultura, com o objetivo de garantir o direito ao cuidado ao longo da vida e promover a corresponsabilidade de gênero.

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