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Temperatura da Terra supera limiar e gera alerta mundial

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O ano passado eclipsou a temperatura de 2023 na base de dados europeia em 1/8 de grau Celsius. Isso é um salto incomumente grande; antes dos últimos dois anos super quentes

Os últimos 10 anos são os dez mais quentes já registrados, e provavelmente os mais quentes em 125 mil anos, observou Burgess. Foto: internet

A Terra registrou seu ano mais quente em 2024, com aumento de temperatura tão significativo que o planeta temporariamente superou um importante limiar climático, anunciaram nesta sexta-feira (10) várias agências de monitoramento meteorológico.

A temperatura média global do ano passado superou facilmente o recorde de calor de 2023 e continuou a aumentar ainda mais.

Ultrapassou o limite de aquecimento de longo prazo de 1,5ºC desde o fim do século 19 (quando começou a Revolução Industrial), que foi estabelecido no Acordo de Paris de 2015, conforme o Serviço de Mudança Climática Copernicus da Comissão Europeia, o Met Office do Reino Unido e a agência meteorológica do Japão.

A equipe europeia calculou aquecimento de 1,6º C (2,89º F). O Japão encontrou 1,57º C (2,83º F), e os britânicos 1,53º C (2,75º F) em divulgações de dados coordenadas para a manhã desta sexta-feira.

As equipes de monitoramento dos Estados Unidos – a Nasa, a Administração Nacional Oceânica e Atmosférica e a Berkeley Earth, uma instituição privada – devem publicar seus números mais tarde, mas todos provavelmente mostrarão um recorde de calor para 2024, indicaram cientistas europeus.

Os seis grupos compensam de diferentes maneiras as lacunas de dados nas observações – que remontam a 1850 -, portanto os números variam ligeiramente.

“A principal razão para essas temperaturas recordes é o acúmulo de gases de efeito estufa na atmosfera” pela queima de carvão, petróleo e gás, disse Samantha Burgess, líder estratégica de clima em Copernicus. “À medida que os gases de efeito estufa continuam se acumulando na atmosfera, as temperaturas continuam aumentando, incluindo no oceano, os níveis do mar continuam subindo, e as geleiras e camadas de gelo continuam derretendo”.

O ano passado eclipsou a temperatura de 2023 na base de dados europeia em 1/8 de grau Celsius. Isso é um salto incomumente grande; antes dos últimos dois anos super quentes, os recordes de temperatura global só eram superados por centésimos de grau, observaram os cientistas.

Os últimos 10 anos são os dez mais quentes já registrados, e provavelmente os mais quentes em 125 mil anos, observou Burgess.

O dia 10 de julho foi o dia mais quente já registrado pelos seres humanos, com média global de 17,16º C (62,89º F), encontrou Copernicus.

De longe, o maior contribuidor para o aquecimento recorde é a queima de combustíveis fósseis, disseram vários cientistas.

Um aquecimento natural temporário do fenômeno El Niño no Oceano Pacífico Central adicionou uma pequena quantidade, e uma erupção vulcânica submarina em 2022 acabou esfriando a atmosfera porque colocou mais partículas refletoras nela, assim como vapor de água, indicou Burgess.

As sirenes estão tocando

“Esta é uma luz de advertência que se acende no painel da Terra de que é necessária atenção imediata”, afirmou Marshall Shepherd, professor de Meteorologia da Universidade da Geórgia (EUA). “O furacão Helene, as inundações na Espanha e a mudança abrupta do clima que alimenta os incêndios florestais na Califórnia são sintomas dessa infeliz mudança na caixa de transmissão climática. Ainda temos algumas mudanças de velocidade a percorrer”.

“As sirenes de alarme relacionadas às mudanças climáticas têm tocado quase constantemente, o que pode estar causando que o público se torne insensível à urgência, como as sirenes de polícia na cidade de Nova York”, disse Jennifer Francis, cientista do Woodwell Climate Research Center. “No entanto, no caso do clima, os alarmes estão soando mais alto, e as emergências agora vão muito além de apenas a temperatura”.

O mundo sofreu perdas de US$ 140 bilhões por desastres relacionados ao clima no ano passado – o terceiro mais alto já registrado -, e a América do Norte foi especialmente afetada, segundo relatório da empresa de seguros Munich Re.

“A aceleração do aumento da temperatura global significa mais danos à propriedade e impactos na saúde humana e nos ecossistemas dos quais dependemos”, apontou Kathy Jacobs, cientista da água na Universidade do Arizona.

Limiar

Esta é a primeira vez que qualquer ano superou o limiar de 1,5º, exceto por uma medição da Berkeley Earth em 2023, que foi originalmente financiada por filantropos céticos das mudanças climáticas.

Os cientistas foram rápidos em apontar que a meta de 1,5º é para o aquecimento de longo prazo, agora definido como uma média de 20 anos. O aquecimento de longo prazo desde os tempos pré-industriais está agora em 1,3º C (2,3º F).

“O limiar de 1,5º C não é apenas um número, é um sinal de alerta Superá-lo mesmo por um único ano mostra o quão perigosamente próximos estamos de exceder os limites estabelecidos pelo Acordo de Paris”, disse Victor Gensini, cientista climático da Universidade do Norte de Illinois (EUA).

Um estudo abrangente das Nações Unidas em 2018 descobriu que manter o aumento da temperatura da Terra abaixo de 1,5º C poderia salvar os recifes de coral da extinção, deter a perda massiva de camadas de gelo na Antártida e prevenir a morte e o sofrimento de muitas pessoas.

Francis chamou o limiar de “fracasso”. Burgess considerou extremamente provável que a Terra supere o limiar de 1,5º, mas destacou que o Acordo de Paris é “uma política internacional extraordinariamente importante” com a qual as nações de todo o mundo devem continuar comprometidas.

Mais aquecimento

Os cálculos europeus e britânicos consideram que, com um La Niña que gera resfriamento em vez de El Niño que causou aquecimento no ano passado, 2025 provavelmente não será tão quente quanto 2024. Preveem que será o 3º ano mais quente.

No entanto, os primeiros seis dias de janeiro – apesar das temperaturas frias no leste dos Estados Unidos – tiveram temperatura média ligeiramente mais quente, e são o início de ano mais quente já registrado, segundo dados do Copernicus.

Os cientistas estão divididos sobre se o aquecimento global está acelerando. Não há dados suficientes para ver uma aceleração no aquecimento atmosférico, mas o conteúdo de calor dos oceanos parece não apenas estar aumentando, mas subindo a um ritmo mais rápido, disse Carlo Buontempo, diretor do Copernicus. “Estamos enfrentando um clima muito novo e desafios climáticos para os quais nossa sociedade não está preparada”, apontou Buontempo.

Tudo isso é como assistir ao final de “um filme de ficção científica distópica”, observou Michael Mann, cientista climático da Universidade da Pensilvânia. “Agora estamos colhendo o que plantamos”.

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Governo devolve mais de R$ 17,9 milhões a aposentados do Acre com descontos não autorizados do INSS

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23.813 segurados acreanos foram ressarcidos; acordo nacional já repassou R$ 2,74 bilhões a 4 milhões de brasileiros. Adesão ainda está aberta e é gratuita

Os depósitos são realizados diretamente na conta onde o beneficiário recebe o benefício previdenciário, corrigidos pela inflação (IPCA) e sem necessidade de processo judicial. Foto: ilustrativa

O Governo Federal já devolveu R$ 17,97 milhões a 23.813 aposentados e pensionistas do Acre que tiveram descontos associativos não autorizados em seus benefícios do INSS. No país, o acordo já beneficiou 4 milhões de brasileiros, com um total de R$ 2,74 bilhõesdevolvidos até esta semana.

O ressarcimento é feito diretamente na conta do beneficiário, com correção pelo IPCA, sem necessidade de processo judicial. Os valores referem-se a descontos realizados entre março de 2020 e março de 2025 por entidades que não comprovaram autorização formal.

Quem pode aderir:
  • Beneficiários que contestaram descontos e não receberam resposta em 15 dias úteis.

  • Quem obteve respostas irregulares, como assinaturas falsas ou gravações de áudio como “comprovação”.

  • Segurados com ações judiciais em andamento (é necessário desistir do processo para entrar no acordo).

O procedimento é gratuito, rápido e totalmente online, sem exigência de envio de documentos. Além do valor descontado, o INSS também pagará honorários advocatícios de 5% em ações individuais que forem encerradas para aderir ao acordo.

O governo reforça que os segurados verifiquem extratos e descontos recorrentes e busquem o ressarcimento caso identifiquem cobranças indevidas. O prazo para adesão segue aberto.

Critérios de elegibilidade
  • Descontos indevidos entre março de 2020 e março de 2025
  • Contestação sem resposta da entidade em 15 dias úteis
  • Respostas irregulares (assinaturas falsificadas, gravações como comprovante)
  • Ações judiciais em andamento (necessário desistir para aderir)
Processo de adesão
  • Gratuito e rápido
  • Sem envio de documentos
  • Honorários advocatícios: 5% para ações individuais encerradas
Recomendação oficial
  • Verificação: Segurados devem checar origem de descontos recorrentes

O acordo representa esforço do governo para resolver em massa uma questão que sobrecarregava a Justiça com milhares de ações individuais. No Acre, onde a população idosa depende fortemente dos benefícios previdenciários, o ressarcimento traz alívio financeiro significativo para milhares de famílias.

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Construção de casas populares no Acre tem novo atraso e entrega só em janeiro de 2026

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Governo rescindiu contratos com empreiteiras por descumprimento de prazos; obras da Cidade do Povo, em Rio Branco, são as mais afetadas

A Sehurb informou que, em razão da necessidade de recontratação das empresas, a entrega das unidades da Cidade do Povo deverá ocorrer apenas na segunda quinzena de janeiro de 2026, sem possibilidade de antecipação. Foto: captada 

A entrega de casas populares no Acre sofreu novos atrasos em 2025, e a previsão de conclusão das primeiras unidades, principalmente no bairro Cidade do Povo, em Rio Branco, só deve ocorrer na segunda quinzena de janeiro de 2026. A Secretaria Estadual de Habitação e Urbanismo (Sehurb) atribui o problema ao descumprimento contratual pelas empreiteirasresponsáveis, o que levou à rescisão dos contratos e à abertura de nova licitação.

O atraso acontece mesmo com recursos federais já liberados pelo Ministério das Cidades para a construção de 3.573 unidades habitacionais no estado, pelo Programa Minha Casa, Minha Vida. Além de Rio Branco, o programa prevê moradias em Plácido de Castro (25), Feijó (25) e Tarauacá (50), além de 383 novas casas na Cidade do Povo com recursos do Pró-Moradia.

A Sehurb informou que o pagamento às construtoras foi feito conforme medição da Caixa, descartando atrasos financeiros como causa. Agora, a recontratação das empresas é necessária para garantir qualidade e segurança nas obras.

Enquanto isso, o cadastro de interessados segue aberto pelo Sistema de Habitação (Sishabi), plataforma digital que já registra cerca de 26.716 inscrições só em Rio Branco. A secretaria reforça que as inscrições são apenas online e visam transparência e acesso simplificado aos programas habitacionais.

O Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon) ainda não se posicionou sobre os atrasos. A situação expõe a dificuldade crônica na execução de obras públicas no estado, mesmo com verba federal garantida.

De acordo com a Secretaria Estadual de Habitação e Urbanismo (Sehurb), nenhuma das empresas contratadas conseguiu executar os serviços dentro dos prazos estabelecidos. Foto: captada 

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Saúde pública foi tornada refém do uso político de emenda parlamentar

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Até 2013, as emendas parlamentares representavam apenas 0,8% do orçamento do Ministério da Saúde. Hoje, esse índice saltou para 12%, um crescimento exponencial que desequilibra o planejamento nacional

Atendimento de paciente com Covid-19: saúde pública dependente de emenda parlamentar. Foto: Ingrid Anne/Semcom

O financiamento do SUS (Sistema Único de Saúde) vive um momento crítico de disputa política e orçamentária e as emendas parlamentares, que foram um mecanismo complementar de investimento, transformaram-se, na última década, em uma fatia gigantesca e decisiva do orçamento da saúde pública no Brasil.

Para avaliar como a dependência de emendas pode impactar no planejamento do SUS, conselheiras e conselheiros nacionais de saúde, juristas, economistas e especialistas se reuniram para o Seminário “Financiamento e impacto das emendas parlamentares no SUS”, realizado no dia 3 de dezembro, em Brasília, pela Comissão Intersetorial de Financiamento e Orçamento (Cofin/CNS).

Os participantes alertaram que a política de financiamento foi descontextualizada do planejamento sanitário, tornando-se refém de uma lógica de austeridade fiscal e de interesses políticos via emendas parlamentares. A discussão, longe de ser apenas contábil, refletiu sobre a disputa entre capital e trabalho em que o subfinanciamento atua como um mecanismo de fragilização do direito à vida.

Lenir Santos, especialista em direito sanitário e integrante da Cofin/CNS recordou que desde o lançamento da Declaração de Alma-Ata, em 1978, e a criação das Ações Integradas de Saúde (AIS), o Brasil luta para consolidar um orçamento condizente para as políticas públicas de saúde.

“A Constituição Federal de 1988 trouxe avanços, mas também frustrações. Originalmente, previa-se que 30% do orçamento da Seguridade Social fosse destinado à saúde, mas, na prática, recursos foram desviados para outras ações, como assistência social e educação, gerando crises de pagamento na rede contratada desde o início do sistema”, relembrou Lenir.

Pacientes em busca de atendimento em hospital de Manaus: longas filas e espera. Foto: Divulgação

Essa fragilidade histórica, segundo o especialista, foi agravada pela própria estrutura tributária brasileira, segundo o economista e consultor do CNS, Francisco Funcia. Ele destacou que a Constituição Federal de 1988, embora tenha descentralizado a execução das políticas públicas, manteve a arrecadação centralizada.

De tudo que se arrecada de impostos no Brasil, 69% são relativos aos tributos federais (ex.: Imposto de Renda), 25% são tributos estaduais (ex.:ICMS) e 6% são tributos municipais (ex.:IPTU). Após as transferências intergovernamentais, chegamos ainda em uma centralização, ou seja, mesmo após a União repassar parte da arrecadação para estados e municípios, 57% da receita disponível ainda está no âmbito da União, 25% nos estados e 18% nos municípios.

Essa disparidade cria uma asfixia financeira nas prefeituras, que dependem visceralmente das transferências constitucionais e voluntárias.  Para o economista, é neste vácuo de recursos que as emendas parlamentares ganharam força política: diante da escassez, prefeitos buscam parlamentares para garantir o funcionamento básico de seus sistemas locais, criando uma relação de dependência”, avaliou.

Os dados apresentados durante o Seminário revelam uma mudança drástica na composição do orçamento federal. Até 2013, as emendas parlamentares representavam apenas 0,8% do orçamento do Ministério da Saúde. Hoje, esse índice saltou para 12%, um crescimento exponencial que desequilibra o planejamento nacional.

A análise do período de 2014 a 2022 mostra que o orçamento geral da saúde cresceu 1,7 vezes, enquanto o valor das emendas aumentou 5,7 vezes. Em valores nominais, a execução de emendas no Ministério da Saúde saltou de R$15 bilhões em 2023 para quase R$25 bilhões em 2024, um crescimento de mais de 60% em apenas um ano.

O problema central, contudo, não é apenas o volume de recursos, mas a qualidade do gasto. As emendas parlamentares, especialmente as individuais, muitas vezes não dialogam com os instrumentos de gestão e planejamentos de saúde ou com as pactuações feitas nas Comissões Intergestores Tripartites (CIT), por exemplo. Elas atropelam o planejamento técnico, alocando verbas sem critérios epidemiológicos, o que resulta em ineficiência e desperdício.

Plenário da Câmara: políticos financiam a saúde pública com emendas. Foto: Kayo Magalhães/Agência Câmara

O SUS é desenhado para funcionar com base em planos municipais, estaduais e nacional, com critérios epidemiológicos e de necessidade. As emendas, contudo, muitas vezes ignoram essa lógica. Os recursos fluem para onde há aliados políticos, não necessariamente onde há mais doentes ou carência assistencial; os equipamentos são comprados sem previsão de equipe para operá-los, ou unidades são reformadas em locais sem prioridade sanitária. Dessa forma, o poder de decisão sobre onde investir sai do Ministério da Saúde (Executivo) e migra para o Congresso (Legislativo).

Além disso, a lógica da austeridade fiscal, consolidada pela Emenda Constitucional 95 (Teto de Gastos), retirou cerca de R$ 70 bilhões do SUS entre 2018 e 2022, transformando o piso constitucional da saúde em um teto de despesas e forçando uma competição predatória por recursos dentro do orçamento público. A nova realidade orçamentária trouxe também complexos desafios jurídicos. A Lei Complementar nº 141 foi um marco ao determinar critérios de rateio e fiscalização, mas a profusão de novas regras e emendas impositivas gerou um emaranhado legal.

A juíza Amanda Costa, auxiliar no Supremo Tribunal Federal (STF) do Ministro Flávio Dino, explica que o cenário atual exigiu a intervenção da corte através da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 854. “O Judiciário passou a tratar a questão como um “processo estrutural”, reconhecendo que o ajuste do sistema exige medidas graduais e testadas para garantir transparência e rastreabilidade do dinheiro público”, defendeu.

Ainda no conjunto de avanços de medidas estruturais previstas na ADPF 854, todas as transferências decorrentes de emendas de qualquer modalidade na área da saúde são acompanhadas previamente de um atestado de conformidade a ser dado pelo gestor federal do SUS. “Essa preocupação com a eficiência do gasto público, passa a constar expressamente em decisões do colegiado”, explica a juíza.

Mudança de Perfil

Um outro ponto de tensão recente entre os poderes envolve a destinação final das emendas, especialmente quando elas são usadas em pagamento de pessoal, por exemplo. Dácio Guedes, diretor do Fundo Nacional de Saúde (FNS) explica que uma mudança drástica ocorreu na destinação desse dinheiro. “Historicamente, emendas eram usadas para investimento (construção de unidades, compra de equipamentos). Hoje, cerca de 90% desses recursos são destinados a custeio (pagamento de despesas correntes), muitas vezes sem critérios técnicos claros”, afirma.

Historicamente, e por vedação constitucional, as emendas não poderiam ser usadas para despesas de custos recorrentes e pagamento de pessoal, pois estas configuram gastos contínuos incompatíveis com transferências pontuais. No entanto, o Tribunal de Contas da União (TCU) reformou recentemente seu entendimento, permitindo, com base em alteração em uma resolução do Congresso Nacional, que emendas coletivas (de bancada e comissão) financiem folhas de pagamento na saúde. Essa flexibilização preocupa especialistas, pois pode comprometer a sustentabilidade fiscal dos municípios a longo prazo, além de ferir a lógica de que emendas deveriam ter caráter estruturante.

Dinheiro de emendas é usado para pagar médicos, o que contraria finalidade do recurso político. Foto: Marcelo Camargo/ Agência Brasil

Mas segundo Dácio, existe uma janela de oportunidade para os gestores e conselheiros de saúde que zelam pela correta aplicação e precisam analisar e validar os relatórios anuais de gestão. A exigência de contas bancárias específicas para cada emenda e a auditoria determinada pelo DenaSUS (Departamento Nacional de Auditoria do Sistema Único de Saúde) sobre recursos sem identificação são passos importantes para recuperar o controle sobre o destino das verbas. O diretor do FNS lembra que gestores e conselheiros têm o dever de analisar e validar os relatórios anuais de gestão, garantindo que o dinheiro que chega via emendas seja aplicado corretamente.

O momento exige vigilância constante, pois, como destacou o assessor parlamentar Flávio Tonelli, é preciso debater o que foi naturalizado na política brasileira, mas que não é natural: a captura do orçamento público por interesses que não o bem comum. “A defesa do SUS passa, obrigatoriamente, por desatar o nó que transformou o financiamento da saúde em moeda de troca política”, destacou.

Para além das cifras e leis, o debate sobre o financiamento do SUS é, essencialmente, político e social. Maicon Nunes, conselheiro nacional de saúde representante do Movimento Negro Unificado (MNU), reforça que o desfinanciamento não é um descuido, mas um projeto político que atinge desproporcionalmente a população negra, que compõe a maioria dos usuários do sistema público. “Congelar investimentos em saúde significa, na prática, congelar o investimento na vida dessas pessoas”, declarou.

Ronald dos Santos, ex-presidente do Conselho Nacional de Saúde alertou que não se pode desvincular a luta pelo orçamento da disputa histórica entre capital e trabalho no Brasil. “O Conselho Nacional de Saúde tem se posicionado como uma trincheira de resistência contra esse desmonte, atuando não apenas no controle social, mas como um agente político na defesa da democracia”, defendeu.

A narrativa de que o SUS é ineficiente serve aos interesses de mercantilização da saúde, abrindo portas para a privatização e para a atuação predatória do mercado.  O desafio para os próximos anos, conforme apontado por outros participantes do Seminário, é mobilizar a sociedade para a 18ª Conferência Nacional de Saúde e pautar um financiamento justo, que não seja corroído pelos juros da dívida pública ou pelas restrições do novo arcabouço fiscal.

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