Acre
Facção emite alerta de mortes e expulsões a moradores de Sena Madureira
A reportagem traz um diagnóstico de como funciona a dinâmica do crime no terceiro maior município do Acre, que vive o drama da guerra entre organizações criminosas
Áudios divulgados nesta semana estão decretando a morte de homens, mulheres e idosos de várias famílias da região do Segundo Distrito de Sena Madureira (município a 144 quilômetros de Rio Branco). Neles, os indivíduos dizem que a “sentença” será cumprida logo que um dos chefes da facção emitir um “salve”, como são conhecidas essas determinações, que servem para impor o terror a quem é considerado inimigo da organização.

Na terceira maior cidade do Acre, Sena Madureira, desempregados são recrutados por facções e obedecem ordens de comparsas presos para eliminar rivais/Foto: Juan Diaz
Na última segunda-feira (10), a reportagem teve acesso a pelo menos quatro destas gravações, enviadas por WhatsApp por pessoas que são parentes de presidiários integrantes da facção Comando Vermelho, embora não tenham nenhum problema com a justiça.
Resley Saab
Todos estão jurados de morte se não abandonarem suas casas o mais rápido possível, a exemplo do que muitos já fizeram, segundo a denúncia, somente porque têm algum grau de parentesco com os detentos faccionados que estão atrás das grades.
Em um deles, um indivíduo que, supostamente, seria da facção Bonde dos 13, ameaça uma família aos berros e palavrões. “Os caras mataram o teu tio aí, que era inocente. Então, você está do lado deles aí. Esquenta não que a família e vocês vai ser espirrada tudim (sic). O salve vai ser dado, tá ligado? Já era”, vocifera o homem.
Em outro áudio, o mesmo indivíduo diz: “Não quero mais nenhum parente de CV aqui nessa quebrada. Vai ser tirado, tudo, tudo, tudo. O bagulho vai ficar tenso aqui dentro dessa po**a”.
De acordo com o denunciante que enviou os áudios anonimamente para a redação, frisou que, “há muito tempo que a gente vive sofrendo”.

Casebres em barranco Às margens da BR-364, na entrada de Sena Madureira; violência no município tem assustado moradores/Foto: Juan Diaz
Na mensagem, ele diz que é um homem que mora no Segundo Distrito. “Aqui, a gente vive um verdadeiro inferno, um terror. Muitas famílias já foram expulsas de suas próprias casas e muita gente já pegou peia de tábua”.
Mais na frente, o morador completa: “Tem vagabundos aqui na tornozeleira [eletrônica], mas mesmo assim banca o terror e as autoridades não se importam. Vocês acreditam que vem do presídio Evaristo de Morais a ordem para espancar pessoas de bem?”.

Cerca de arame farpado é sinal de aviso que o local é inapropriado para quem teima em descumprir as regras impostas por facção/Foto: Juan Diaz
Polícia Militar do Estado do Acre, responsável pelo policiamento ostensivo, afirmou que vem reforçando o patrulhamento na região e coibindo ações deliberadas de criminosos. A Polícia Civil também instaurou vários inquéritos e trabalha, por meio do seu serviço de inteligência, para identificar essas pessoas e prendê-las no maior curto espaço de tempo.
O Ministério Público do Estado do Acre foi procurado pela reportagem para se manifestar sobre o assunto, mas até o fechamento deste texto ainda não tinha se pronunciado. O espaço segue aberto para as suas considerações.
Depois do Favela Viva, foi a vez do Galera do Bem acabar, em Sena Madureira
As histórias de ameaças a famílias, com o terror ecoando nas vielas de bairros pobres do município de Sena Madureira, que abrem esta reportagem, servem para endossar o quanto foi essencial um projeto do porte do Galera do Bem, de Sena Madureira, idealizado pela então promotora de Justiça Cível Patrícia Paula dos Santos, em 2016.
O Galera do Bem, que em 2024 já não existe mais, conseguiu reunir em Sena Madureira uma série de instituições governamentais e não-governamentais em torno de um bem-comum, o de afastar a possibilidade de adolescentes que cumpriam internação no Centro Socioeducativo Purus de voltarem a cometer atos infracionais e chegarem à vida adulta como criminosos.

Hora do almoço na caa de um mãe cujo dois filhos cumpriam medidas socioeducativas em Sena Madureira; fragilidades nas políticas públicas causam desproteção familiar/Foto: Juan Diaz
Oito meses depois da sua criação, no ano seguinte, em 2017, dos 68 internos inscritos, pelo menos 35 deles seguiam acompanhados pelo Centro de Referência Especializado em Assistência Social, o Creas, de Sena Madureira, que era uma das entidades parceiras do MPAC no projeto Galera do Bem.
Antes do Galera do Bem, era encerrado também em Sena Madureira outro impressionante movimento de defesa da cidadania de jovens, o da Associação Favela Viva, que fechou suas atividades de resistência ao aliciamento de gangues do bairro Vitória por falta de recursos. Até 2016, a Favela Viva oferecia do hip-hop à capoeira como atividades de promoção de reinserção social na região.

Garotos perambulam pelas ruas de Sena Madureira; segurança familiar está em xeque/Foto: Juan Diaz
Em 2017, o que havia sobrado da Favela Viva estava num espaço mínimo cedido pela Prefeitura de Sena Madureira, onde seus membros encontravam algum alento para continuar tentando tirar jovens do antro das drogas e do recrutamento das organizações criminosas. (Leia mais sobre a Associação Favela Viva abaixo)
Displicência das instituições, descontinuidade de parcerias e desestruturação familiar: como nasce um soldado do crime
Sete anos atrás, um diagnóstico do Observatório da Criança e do Adolescente, que funciona no Centro de Apoio Operacional de Defesa e Proteção da Criança e do Adolescente, da Educação e das Medidas Socioeducativas do Ministério Público do Estado do Acre, revelava que somente 42% dos trabalhadores dos institutos socioeducativos conheciam realmente os artigos do Estatuto da Criança da e do Adolescente, o ECA.
Para outros 28,6%, a displicência do Estado era o maior motivo para as internações de menores infratores que hoje estão engrossando as fileiras das facções criminosas em todo o estado. Para os funcionários das sete unidades que abrigam menores com algum problema com a justiça, o Observatório do MP constatou que o Acre vive um modelo mais ou menos parecido com o dos presídios que não conseguem devolver a maior parte de seus detentos devidamente ressocializada para a comunidade.
E por fim, 51,7% desses agentes e técnicos acreditavam que as internações aconteciam por causa da desestruturação da família dos internados, ante os 28% dos que culpavam o Estado.
Enquanto isso, uma parcela considerável de jovens ainda se afasta, todos os dias, da curva de reinserção social justamente pela falta de um acompanhamento coordenado entre os poderes e a própria comunidade. São esses que alimentam o capital humano das grandes organizações criminosas que se alastraram para o interior do Acre.
No bairro Vitória, o grafite, o hip-hop e a capoeira foram ‘executados’ pelo descaso do poder público
A arte perdeu. E com ela, perderam-se meninos e meninas. Ao dar as costas para um dos mais interessantes projetos de reinserção e prevenção de jovens contra as drogas, o poder público desperdiçou uma valiosa contribuição para famílias pobres que viam na Associação Favela Viva um templo de salvação das desgraças perpetradas por criminosos no bairro Vitória.

Muro de escola na entrada do bairro Vitória, em 2017; ,mensagem era de esperança por uma cultura de paz e contra as drogas; a arte e o grafite eram algumas das ferramentas utilizadas pelas instituições que deixaram de atuar/Foto: Juan Diaz
No local, a falta de recursos para tocar a associação apagou a única fagulha do bem em meio às trevas impostas pelas organizações criminosas. E com ela, foram os meninos, muitos mortos a tiros nas vielas e becos do Vitória e do bairro Pista, com o encerramento das atividades.

Irmãos Edmar e Jocimar, no primeiro plano, ainda em 2015, quando lideram a Associação Favela Viva, que amparava meninos retirados do aliciamento para o tráfico/Foto: Juan Diaz
Sena Madureira sempre esteve no centro de uma das maiores rotas do tráfico de drogas, que utiliza o rio Purus como corredor da cocaína que vem do interior das selvas peruanas em direção a Rio Branco.
Mas se há quase 30 anos, praticamente todo o volume do entorpecente somente passava pela cidade, 17 anos mais tarde o tráfico chegava para se estabelecer, representado pelos filhos de seringueiros que deixaram a selva para tentar uma vida melhor na cidade. Entre eles estavam os irmãos Edmar e Jocimar Almeida de Azevedo, ambos com 27 e 19 anos, e que fundariam a Associação Favela Viva.

Arte em grafite em muro de escola; ideia do artista era conscientizar moradores para um cultura de paz/Foto: Juan Diaz
Entre 2010 e 2011, era praticamente impossível caminhar, mesmo à luz do dia, pelos bairros Vitória e Pista, em Sena Madureira, sem ser antes interpelado por algum indivíduo em ‘patrulhamento’ do tráfico pelas ruas dessas localidades. Sena Madureira assistia ao auge das execuções entre gangues rivais, em disputas por espaços para a venda de drogas.
Até os 17 anos, Edmar permaneceu envolvido com a violência. Desde então, conheceu o hip-hop. “Quando o tráfico tomou de conta, muitos amigos morreram. Era sempre assim, matavam um lá e morria outro aqui. A vingança era muito grande e eu, infelizmente, também fazia parte dessa violência”.
Em 2015, Edmar mencionava a dificuldade de obter recursos para a instituição. Dizia ele, que “os programas de incentivo à cultura eram muito burocráticos”. Além disso, havia um agravante: as atividades não-remuneradas da Favela Viva disputavam diretamente com as práticas do tráfico. “O garoto ganha ali na esquina R$ 10 por dia como aviãozinho, e já é muito para ele. Da nossa parte, só tínhamos o conselho e a coisa boa da arte. Então, era uma concorrência difícil”.
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Acre
Com mediação de Tadeu Hassem, Aleac debate LDO 2026 e acolhe propostas por maior justiça na distribuição orçamentária
A Assembleia Legislativa do Acre (Aleac) realizou na manhã desta segunda-feira, 7 de julho, uma audiência pública para discutir o Projeto de Lei nº 72/2025, que estabelece as Diretrizes Orçamentárias (LDO) do Estado para o exercício financeiro de 2026. A iniciativa foi proposta e presidida pelo deputado Tadeu Hassem (Republicanos), reforçando o compromisso do parlamento com a transparência e a participação popular no processo de elaboração orçamentária.
A proposta encaminhada pelo Poder Executivo projeta uma Receita Corrente Líquida (RCL) de R$ 10,7 bilhões, com o Produto Interno Bruto (PIB) estadual estimado em R$ 28,9 bilhões. O texto prevê ainda um déficit primário de R$ 242,9 milhões, o que representa 0,84% do PIB e 2,26% da RCL.
Na abertura dos trabalhos, Tadeu Hassem ressaltou o papel estratégico do Legislativo na construção democrática do orçamento estadual. “A Assembleia é a Casa do Povo. Esta audiência cumpre dispositivos constitucionais e legais e tem como finalidade ouvir a sociedade, garantindo que o orçamento reflita suas reais necessidades. A LDO é um instrumento técnico, mas, acima de tudo, deve ser um pacto social construído com diálogo”, afirmou o parlamentar.
A audiência contou com a presença de representantes do Executivo, como o secretário de Governo, Luiz Calixto, que destacou os desafios fiscais enfrentados pelo Estado. “Mesmo com limitações orçamentárias, o governo tem se pautado pela responsabilidade e pelo planejamento. Os avanços nas áreas de saúde, educação e segurança demonstram nosso compromisso com uma gestão eficiente e equilibrada”, pontuou.
Também participaram da mesa técnica o procurador-geral de Justiça, Danilo Lovisaro, em sua última participação no processo de construção orçamentária à frente do Ministério Público, além do secretário da Fazenda, Amarísio Freitas, e do titular da Secretaria de Planejamento, Ricardo Brandão. Este último defendeu a ampliação de ações de formação sobre orçamento público para entidades da sociedade civil, promovendo maior inclusão e entendimento sobre o processo orçamentário.
Representantes de sindicatos e entidades de classe também marcaram presença, contribuindo com propostas de redistribuição dos duodécimos repassados aos poderes e com sugestões de ajustes no texto da LDO. Entre os principais pontos levantados, esteve a demanda por maior margem orçamentária para a valorização dos servidores públicos, especialmente aqueles que recebem salários mais baixos.
Em resposta, Luiz Calixto reiterou que, embora o governo esteja aberto ao diálogo, o cenário fiscal atual não permite concessão de reajustes salariais. “É preciso honestidade no debate. Estamos trabalhando com responsabilidade e dentro dos limites reais do orçamento estadual”, frisou.
Encerrando a audiência, o deputado Tadeu Hassem agradeceu a participação ativa de todos os presentes — representantes do governo, instituições públicas, sindicatos e sociedade civil — e reforçou o compromisso da Aleac com a continuidade do diálogo. “Voltaremos a discutir essas pautas em setembro, com a chegada da Lei Orçamentária Anual (LOA). Nosso papel é garantir um orçamento justo, técnico e comprometido com o bem-estar da população acreana”, concluiu.
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Agricultor sobrevive após tiro acidental que alojou bala no coração em Xapuri
Cirurgia rara e de alto risco foi realizada por equipe de 11 profissionais em Rio Branco; paciente recebeu alta e agradece por “ter nascido de novo”

O médico liderou a equipe responsável pela delicada cirurgia. Ao todo, onze profissionais estiveram empenhados, durante cerca de três horas, para salvar a vida de Odair. Foto: cedida
O agricultor Odair Mendes Peixoto, de 43 anos, passou por um susto que quase lhe custou a vida no último dia 3 de julho. Ao tentar proteger seu galinheiro de um possível ataque de gavião, ele sofreu um disparo acidental de rifle .22 que perfurou seu braço e se alojou no coração.
O acidente aconteceu quando Odair guardava a arma em um estrado de madeira na zona rural de Xapuri. “O rifle escorregou e disparou contra mim. Senti uma queimação forte, mas não imaginei que a bala tinha ido parar no meu coração”, relatou.

Após a realização de um exame de raio-x, a equipe médica constatou a emergência do caso e a necessidade da realização de cirurgia para a retirada imediata da bala. Foto: cedida
Cirurgia de alto risco salvou sua vida
Levado às pressas para o Pronto-Socorro de Rio Branco, exames revelaram que o projétil estava alojado no saco pericárdico, estrutura que envolve o coração. “A cada batida, ele perdia sangue. Era uma emergência crítica”, explicou o cirurgião cardíaco Fabio Rueda, que liderou a operação.
Onze profissionais trabalharam por cerca de três horas no procedimento, considerado raro até para médicos experientes. “Já fiz milhares de cirurgias, mas nunca havia retirado uma bala do coração de alguém”, destacou Rueda.
Alta e gratidão
Odair recebeu alta no último domingo (13) e segue em recuperação. Nesta segunda (14), emocionado, recebeu a visita do médico que o operou. “Nasci de novo. Agradeço a Deus e a toda a equipe que me salvou”, disse.
O caso, que poderia ter terminado em tragédia, transformou-se em um relato de superação e eficiência médica no Acre.

Odair recebeu alta médica no domingo, 13, e agora se recupera. Nesta segunda-feira, 14, ele recebeu a visita do médico que o operou. Foto: cedida
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Acre
Menina Aurora mostra sinais de recuperação após enxerto complexo e inspira onda de solidariedade
Equipe médica mantém cautela, mas evolução da criança na UTI traz esperança; família agradece pelas orações e mensagens de apoio

Nesta segunda-feira, 14 de julho, médicos relataram avanços sutis, mas animadores na resposta do corpo da menina, especialmente nos dedos afetados. Foto: cedida
A pequena Aurora, que está internada na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), apresenta os primeiros sinais de melhora após se submeter a um delicado procedimento de enxerto. Nesta segunda-feira (14), médicos relataram progressos sutis, porém promissores, principalmente nos dedos afetados da menina.
Embora a recuperação ainda seja considerada incerta, a equipe médica demonstrou otimismo cauteloso diante da resistência do organismo de Aurora. A criança continua sob cuidados intensivos, mas sua força e a dedicação dos profissionais têm mantido viva a esperança de familiares e apoiadores.
A história de Aurora virou símbolo de fé e mobilização. Nas redes sociais, centenas de pessoas enviam mensagens de carinho e orações diariamente, formando uma corrente de apoio que emociona a família. Em publicação recente, os parentes agradeceram o incentivo: “Deus tem guiado cada passo. Só uma força divina explica tanta resistência em um ser tão pequeno”, escreveram.
Acompanhada de perto, Aurora segue lutando, enquanto sua jornada inspira gestos de solidariedade.
A mobilização tem emocionado familiares, que seguem firmes na gratidão
“Deus tem guiado cada passo, cada detalhe. Só uma força divina explica tamanha resistência em um ser tão pequeno”, declarou a família em publicação recente. Eles também reforçaram a importância do apoio recebido: “Agradecemos de coração a cada mensagem, a cada oração. Que Deus abençoe grandemente todos vocês”.
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