Conecte-se conosco

Acre

Do murumuru ao mundo, mulheres do Acre moldam a bioeconomia com saber ancestral e cuidado com a floresta

Publicado

em

Em passos firmes e apressados, elas cruzam trilhas conhecidas da floresta com a precisão de quem sabe o destino e o sentido da colheita. Na cabeça, lenços ou chapéus protegem do sol enquanto os olhos atentos vasculham o chão em busca dos coquinhos caídos das palmeiras, sementes de um ouro vegetal que alimenta sonhos e sustenta famílias: o murumuru. É desse caroço que se extrai o óleo que chegou às prateleiras das maiores indústrias de cosméticos do país, e que carrega o nome do Acre muito além de suas fronteiras.

Por trás da produção está o protagonismo feminino. Em Cruzeiro do Sul, um grupo de mulheres se destaca na coleta dessa riqueza natural, garantindo renda digna e resistência para centenas de lares. Entre elas, Raimunda Gomes, já aposentada, continua na lida para somar à renda de casa, mas também pela alegria de compartilhar esse momento de união.

Em Cruzeiro do Sul, um grupo de mulheres se destaca na coleta dessa riqueza natural, garantindo renda digna e resistência para centenas de lares. Foto: Pedro Devani/Secom

“Meus filhos dizem que não preciso mais trabalhar com isso, mas eu gosto. Tem muita mulher junto, e a gente se ajuda, conversa, se fortalece”, conta enquanto suas mãos calejadas brincam com os coquinhos recém-recolhidos.

Com a mesma sabedoria que guia a colheita, vem também a consciência ambiental. Raimunda lamenta o avanço das queimadas. “Não é certo colocar fogo. A gente precisa disso aqui. Quem queima é quem acha que não precisa”.

Com a mesma sabedoria que guia a colheita, vem também a consciência ambiental. Foto: Pedro Devani/Secom

Onde o murumuru floresce, o Acre se revela

A história de Maria Lisbete da Páscoa também atravessa décadas e fronteiras. Ainda adolescente, começou a trabalhar com os coquinhos no Pará. Veio para o Acre após o casamento e logo se integrou à atividade, ensinando a filha, Antônia Cauane, a arte da coleta. Hoje, juntas, elas chegam a reunir sete sacas em um único dia. Com o apoio da Cooperativa dos Produtores de Agricultura Familiar e Economia Solidária de Nova Cintra (Coopercintra), os frutos viram manteiga de murumuru, produto nobre que abastece marcas renomadas como a Natura.

“Nós que carregamos. Os meus homens somos nós mesmas”, brinca Lisbete. “Ensinei minha filha desde pequena. Ela chorava querendo ir pra mata, com medo, mas agora vem com seu balde.”
Lisbete também se entristece com a destruição da mata: “Chorei quando vi as palhas tudo pretas de queimada. Estavam queimando onde a gente tira o pão de cada dia.”

Maria Elice da Silva, 59 anos, conhece cada curva das estradas de barro que levam à área de coleta. Há 10 anos dedica-se à atividade, seis deles fornecendo para a Coopercintra. Para ela, o trabalho é mais que sustento, é independência.

“É gratificante. Às vezes falta dinheiro, mas vem o dia da coleta e traz alegria. Na mata, a gente se espalha, depois se junta pra almoçar, rir, conversar.”

Com o murumuru como principal oleaginosa coletada no estado, a cooperativa não apenas garante renda, mas também estrutura e expansão. Foto: Pedro Devani/Secom

Mulheres, floresta e a bioeconomia que transforma

Com o murumuru como principal oleaginosa coletada no estado, a cooperativa não apenas garante renda, mas também estrutura e expansão. A Fundação de Tecnologia do Acre (Funtac) é peça chave nesse avanço. Além de ceder o terreno onde funciona a miniusina da cooperativa, ela investe em formação para mulheres e jovens, preparando-os para um futuro sustentável e valorizando saberes tradicionais.

“Daqui uns dias o futuro realmente são essas pessoas, então a gente tenta fazer com que esses jovens tenham uma fixação na zona rural e só vão ficar se verem que tem um comércio, um produto que vão ganhar dinheiro com isso. Então, ofertamos cursos específicos para a comunidade jovem e mulheres e, também, porque temos uma busca de fontes financiadoras que visam esse gêneros”, explica Suelem Farias, diretora técnica da Funtac.

A Funtac trabalha com captação e destinação de recursos, como o REM KfW, para o fortalecimento da bioeconomia. As capacitações são feitas separadas, para jovens e mulheres, segundo Suelen, respeitando também a atuação de cada grupo.

“Nós sabemos também que a mulher é mais cuidadosa na hora que vai embalar, limpar o caroço, etiquetar, é ela que realmente faz toda essa parte de maior detalhamento”, explica. Esse cuidado também se reflete na consciência ecológica que permeia a cadeia extrativista. Não apenas colhem: preservam, respeitam e entendem que o futuro está na floresta viva.

Num tempo em que a bioeconomia se firma como aposta para o Brasil, o murumuru do Acre mostra que há potência em cada amêndoa e sabedoria em cada mulher. Foto: Pedro Devani/Secom

Desburocratização

No fim de junho, o governo do Acre fez história ao pagar, pela primeira vez em quase três décadas, a subvenção do murumuru diretamente na conta dos extrativistas, uma conquista que trouxe dignidade, segurança e agilidade ao processo.

A nova metodologia, prevista na Lei Estadual nº 1.277/1999 e oficializada pelo Decreto nº 1.564/2024, foi implementada por determinação do governador Gladson Camelí, por meio da Secretaria de Estado de Agricultura (Seagri).

Suelem Farias, diretora técnica da Funtac, explica que ações fomentam essa atividade no público feminino. Foto: Pedro Devani/Secom

“Essa decisão me deixou muito feliz. Criamos a divisão do subsídio para atender exclusivamente os extrativistas, porque antes ela era fundida a outras áreas”, explica o secretário de Agricultura, José Luis Tchê.

Segundo ele, o pagamento era constantemente atrasado por erros em CPF ou ausência de assinatura. O governo decidiu desburocratizar e pagar diretamente aos trabalhadores.
“Por solicitação do governador, decidimos resolver de vez a vida dos nossos extrativistas. Fizemos parceria com o Banco do Brasil e já pagamos mais de 70 extrativistas diretamente na conta. O projeto-piloto funcionou e vamos seguir nesse formato”, garante Tchê.

Num tempo em que a bioeconomia se firma como aposta para o Brasil, o murumuru do Acre mostra que há potência em cada amêndoa e sabedoria em cada mulher. É a floresta que nutre, sustenta e ensina, e são elas, guardiãs das raízes, que garantem que esse ciclo se repita, com equilíbrio, fé e coragem.

Comentários

Continue lendo
Publicidade

Acre

Defesa Civil do Acre testa sistema de alerta por celular em simulados estaduais

Publicado

em

Moradores de Brasiléia e Epitaciolândia receberam mensagens e ouviram sirenes; objetivo é preparar população para emergências como enchentes e deslizamentos

Segundo a Defesa Civil, o objetivo do teste é preparar a população e os órgãos públicos para situações reais de emergência, garantindo que as informações cheguem de forma clara e imediata aos cidadãos. Foto: captada 

A Defesa Civil do Acre realizou na manhã deste sábado (13) um teste do sistema de alerta por celular que atinge automaticamente a população em situações de risco. O simulado, que faz parte de um exercício estadual, alcançou diversos municípios e foi especialmente perceptível em Brasiléia e Epitaciolândia, cidades na fronteira com a Bolívia.

Moradores relataram ter recebido mensagens de alerta diretamente nos celulares, acompanhadas do som característico do sistema. A tecnologia utilizada não depende de aplicativos e é enviada em massa pelas redes de telefonia móvel, garantindo que os avisos cheguem rapidamente aos aparelhos conectados.

Além das notificações por celular, o teste também incluiu a ativação de sirenes em áreas previamente mapeadas, reforçando o protocolo de comunicação para emergências como enchentes, deslizamentos, incêndios florestais e outros desastres naturais.

Segundo a Defesa Civil, o objetivo é preparar a população e os órgãos públicos para situações reais, garantindo que as informações cheguem de forma clara e imediata. A orientação é para que as pessoas não se assustem ao receber as mensagens durante os exercícios e fiquem atentas às instruções em casos efetivos de risco.

A ação faz parte de um conjunto de medidas preventivas adotadas pelo governo do estado para fortalecer a resposta a eventos extremos e aumentar a resiliência das comunidades acreanas.

Comentários

Continue lendo

Acre

Acre no pódio do mundo: Leonardo Calid faz história ao conquistar o vice-campeonato mundial de jiu-jitsu

Publicado

em

O Acre entrou definitivamente para a história do jiu-jitsu mundial com a conquista do vice-campeonato do atleta Leonardo Calid no Campeonato Mundial da International Brazilian Jiu-Jitsu Federation (IBJJF), realizado em Las Vegas, nos Estados Unidos, nesta sexta-feira, 12.

A conquista ganha ainda mais relevância por ter ocorrido na categoria faixa-preta, a mais avançada e tecnicamente exigente do jiu-jitsu. O feito é inédito: é a primeira vez que um atleta acreano alcança essa colocação em mais de 30 anos de prática da modalidade no estad

“Essa conquista representa pra mim a coroação de uma trajetória de vida dedicada ao esporte. Hoje, mesmo tendo como maior prioridade o desenvolvimento de escolas de JiuJitsu e de outros líderes/professores, a competição ainda faz parte da minha vida e segue sendo um desafio de desenvolvimento pessoal”, declarou o atleta.

A IBJJF é a maior e mais prestigiada federação da modalidade no mundo, e o Mundial que organiza é considerado o mais importante e disputado do circuito internacional.

A campanha que levou Leonardo Calid ao vice-campeonato foi marcada por atuações consistentes e dominantes. Ao todo, o atleta disputou quatro lutas. Até a semifinal, venceu todos os combates sem sofrer nenhum ponto. Na estreia, garantiu a vitória em menos de dois minutos, finalizando o adversário com uma chave de pé. Na segunda luta, venceu por pontos após aplicar uma queda. Já na semifinal, saiu vitorioso na decisão do árbitro, após demonstrar maior volume de ataques ao longo do confronto.

Na grande final, Calid enfrentou Clark Gracie, em um duelo de alto nível técnico. O vice-campeonato representa o pódio mais importante já alcançado por um atleta acreano no jiu-jitsu, colocando o estado em evidência no cenário mundial da modalidade.

Sobre Leonardo Calid – Nascido no Acre, iniciou seus treinamentos ainda no estado e construiu sua trajetória esportiva. Em 2013, fundou sua própria academia e, desde então, passou a ser orientado pelo sensei Henrique Machado, reconhecido como um dos treinadores mais prestigiados do jiu-jitsu mundial.

Ao longo da carreira, Calid acumulou títulos expressivos, sendo diversas vezes campeão acreano nas categorias com quimono e sem quimono. Em 2024, foi campeão rondoniense e campeão brasileiro.

Em outubro deste ano, o atleta deu mais um passo decisivo rumo ao alto rendimento ao se mudar temporariamente para os Estados Unidos, onde finalizou sua preparação ao lado do professor Carlos Lemos Jr., em Chicago. Nesse período, passou a treinar nas academias Gracie Barra Downers Grove e Gracie Barra New Lenox, intensificando sua preparação para o Mundial.

Comentários

Continue lendo

Acre

Acre ocupa 24ª posição em ranking nacional de desnutrição infantil

Publicado

em

Dados do Censo 2022 apontam que 2,91% das crianças de até 5 anos no estado apresentam magreza acentuada.

O Acre aparece na 24ª colocação entre os estados brasileiros no ranking dos menores índices de desnutrição infantil, conforme levantamento elaborado a partir dos dados do Censo 2022 e analisado pelo Ranking de Competitividade dos Estados. O estudo considera o percentual de crianças de 0 a 5 anos classificadas com “magreza acentuada”, quando o índice de massa corporal — relação peso/estatura — fica abaixo do percentil 0,1.

De acordo com os dados, 2,91% das crianças acreanas nessa faixa etária apresentam o quadro de magreza acentuada. Com esse resultado, o estado figura entre os piores desempenhos do país, à frente apenas de Sergipe, Bahia e Maranhão, que registram os índices mais elevados, chegando a 5,10%.

O indicador integra um conjunto de 100 critérios utilizados pelo Ranking de Competitividade dos Estados para avaliar o desempenho das unidades federativas em diferentes áreas. Especialistas ressaltam que o dado deve ser analisado de forma transversal, levando em conta outros fatores sociais e econômicos que impactam diretamente a saúde e o desenvolvimento infantil.

O levantamento também esclarece que estados empatados na classificação apresentam exatamente o mesmo percentual de crianças com magreza acentuada, respeitando as variações populacionais apuradas pelo Censo 2022.

Comentários

Continue lendo