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Mamãe faz 100 anos

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No tempo em que embalava nos braços a boneca de pano feita pela mãe, aquela menina provavelmente não imaginava que conheceria as netas de seus netos. Mas, ao brincar de cuidar, já ensaiava a vasta maternagem que permearia sua história, no papel que estreou aos 16 anos.

Maria Nilce da Costa tornou-se, com o casamento aos 15, “de Oliveira”. Nasceu em 11 de maio de 1924 em Russas, no Ceará, e aos 9 anos de idade mudou-se com pai, mãe, irmão e irmã para Mossoró, no Rio Grande do Norte, a pouco mais de 80 km da cidade natal. “Tenho saudades da minha terra”, conta, referindo-se não a um estado, mas ao chão sem fronteiras que acolheu sua infância, quando gostava de andar a cavalo e de pescar.

Dona Maria Nilce de Oliveira completou 100 anos neste 11 de maio, véspera do Dia das Mães. Foto: José Caminha/Secom

Mais tarde, a vida lhe ampliaria os horizontes a noroeste do Brasil. Pois, arregimentado pela campanha de promessas improváveis do governo de Getúlio Vargas, que recrutou os Soldados da Borracha para a Amazônia, com o fim de abastecer o aparato bélico dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial, Francisco Vitoriano, o pai, reuniu a família toda e em 1943 embarcaram para o Acre, partindo de navio da capital cearense, Fortaleza. E assim integraram o contingente de mais de 54 mil nordestinos que rumaram para a Amazônia na Batalha da Borracha.

Da viagem, dona Nilce rememora dois fatos de dimensão histórica. Um deles foi ter testemunhado, acompanhando a embarcação que os transportava – cujo nome, “Comandante Rip”, ela cita de cor -, o sobrevoo de um zepelim, possivelmente observando a movimentação, para transmitir informações ao comando alemão.

O outro é que, durante a noite, as luzes da nave precisavam ficar apagadas, porque submarinos alemães e italianos já haviam torpedeado e afundado diversos navios na costa marítima brasileira, fazendo mais de mil vítimas. Com ameaça real de um naufrágio, a tripulação distribuía coletes salva-vidas aos passageiros, situação que trazia um ambiente de tensão à viagem.

“Mas nós chegamos aqui no Acre em paz”, diz. E dirigiram-se ao Seringal Mercês, na região do município de Sena Madureira, nas imediações do Rio Iaco. 

Nessa época, Maria Nilce já tinha sua primeira filha, Evanilda, que teve febre forte e faleceu em terras acreanas, aos 5 anos. O segundo, Francisco, viveu apenas três meses.

Maria Nilce (de pé, à esquerda), ao lado do marido, Etelvino, filhos, irmãos e sobrinhos. Pai e mãe sentados. Foto: acervo de família

Depois veio Raimundo, hoje com 76 anos. Desse período, a anciã se recorda de “muito trabalho” no cotidiano seringueiro com o marido, Etelvino. “Enquanto ele almoçava, eu defumava a borracha”, narra. Lembra-se também que artigos vindos da sede do seringal chegavam-lhes mensalmente em comboio de burros.

Com o declínio do Segundo Ciclo da Borracha, a família decidiu viver, em 1949, em Rio Branco. “Meu pai foi o único que tirou saldo”, relata, ilustrando a atroz realidade do regime de trabalho imposto pelos seringalistas, proprietários da terra. Os seringueiros, por um lado explorados pelo baixo valor pago pela borracha que produziam, e por outro extorquidos, ao serem obrigados a comprar mercadorias de preço inflacionado fornecidas pelo barracão da sede, sempre ficavam devendo ao patrão. O que configurava o ato de  “tirar saldo”, ou seja, sair com lucro do desequilibrado contrato, uma façanha, em muitos casos punida com o súbito “desaparecimento” do trabalhador.

Essa prática abusiva é hoje reconhecida pela legislação brasileira como servidão por dívida, uma das modalidades do trabalho análogo à escravidão e crime previsto no artigo 149 do Código Penal.

Maria Nilce de Oliveira tem 86 descendentes: “Uma bênção”. Foto: Alessandro Oliveira

E foi exatamente com esse dinheiro que o patriarca Francisco comprou uma casa na Base, próxima às margens do Rio Acre, onde toda a família foi morar. Sua filha guarda memórias do período: “A gente descia os degraus da escada pra lavar roupa. Jogava a roupa ensaboada em cima da areia pra quarar, depois enxaguar. Hoje ninguém quara a roupa, né?”, compara. E a diversão era contemplada: “A gente descia pra tomar banho no rio também”.

Dona Maria Nilce revela que o pai e o irmão trabalharam na reforma do Hotel Chuí, antigo presídio da cidade, que atualmente abriga a prefeitura da capital acreana: “Aquilo era uma lindeza no mundo, os apartamentos; eu fui no dia da inauguração, ia olhando quarto por quarto. Quando terminou a construção, meu pai continuou empregado, virou gerente. Comi muita comida boa do hotel, língua de boi guisada, era muito bom”.

De sua família de origem, também menciona os gestos acolhedores da cultura nordestina, ainda cultivados entre os acreanos. “A mamãe era caridosa, cozinhava, fazia pirão, fazia um caldo e levava pros doentes na Santa Casa, um hospital que tinha na beira do rio. As pessoas comiam e ficavam alegres”, relembra.

Com Irina, a primeira tataraneta. Foto: acervo de família

Mais tarde, instalada com marido e filho em casa própria, “de palha”, na Rua João Donato, atualmente região central da cidade, viu ampliar-se a prole do casal: vieram Sebastião, José, Francisco e Antônio. “Era um atrás do outro. Eu vivia só pra cuidar de menino e da casa”, relata. “A gente fazia tudo; o café a gente torrava e pisava no pilão”. 

Também não lhe escapou da lembrança o nome da amiga parteira que a ajudava na hora de os bebês nascerem: “Maria Cassiana”, pronuncia com saudade e carinho. “Tudo parto normal e em casa”, descreve.

O marido, durante o dia era calafetador de embarcação na Base e, à noite, trabalhava construindo a nova casa “com telha de barro” na Rua Marechal Deodoro. Uma nova ruma de crianças chegou nessa “casa de madeira vinda de carroça”. Era a vez de Luiz, Terezinha, Maria do Socorro, Paulo e Mauro. Foram feitos muitos filhos sim, “mas não tinha beijo na boca como hoje”, informa, rindo das transformações de comportamento.

Flha Socorro e neta Luciana estão entre os familiares que acompanham de perto o cotidiano de dona Maria Nilce. Foto: José Caminha/Secom

Aos 57 anos, enfrentou a viuvez. Com resiliência, seguiu em frente e foi bastante autônoma até os 90, quando contraiu erisipela (inflamação provocada na pele por bactéria) no pé e ficou um ano sem andar. O médico quis amputar o membro, gravemente lesionado, mas a família resistiu, felizmente. E as netas que trabalham na área da saúde se empenharam em auxiliar no restabelecimento da avó, que venceu a travessia sã e salva. “Sou um milagre”, reconhece.

Desde então, para se fortalecer fisicamente, dona Nilce passou a praticar pilates. A fisioterapeuta Luisa Hertz acompanhou sua jornada de reabilitação e, há quase dez anos trabalhando com dona Nilce, ainda se admira de sua atitude perante a vida: “Ela chegou ao meu consultório em cadeira de rodas e realmente teve uma recuperação surpreendente. Acredito que seu temperamento positivo a ajudou muito, pois ela vive o momento presente de forma leve e tranquila. Hoje segue fazendo exercícios de fisioterapia para equilíbrio, força e estabilização, com a mesma disposição de sempre. E se tornou mais do que uma paciente para mim; é também uma amiga muito querida”.

A filha Socorro, com quem mora, ratifica a desconcertante vitalidade da genitora: “A mamãe senta e levanta sem ajuda, dorme sozinha, lava louça, faz mingau de aveia, chá”. E resume: “Tá melhor que nós”.

Netos se reúnem em torno da matriarca, na festa dos 100 anos. Foto: acervo de família

Cativados por sua doçura, longevidade e lucidez, os netos gostam de se reunir em torno da avó para, animadamente, ouvir suas saborosas histórias. Luciana, Karen, Kelly, Rafaela, Estefânia e Alessandro são integrantes da comissão que preparou a festa do centenário da anciã, completado neste 11 de maio, véspera do Dia das Mães. O tema? Árvore Oliveira. E, provando que a genética da família é mesmo excepcional, o irmão José, de 97 anos, também esteve presente na celebração.

Afinal, trata-se de uma ocasião extraordinária para comemorar a vida da ilustre matriarca de 86 descendentes: 12 filhos, 36 netos, 36 bisnetos e dois tataranetos. “Uma bênção”, define ela.

E, sobre uma vida que já alcança os cem anos, dona Maria Nilce apenas se faz, como sempre, sorridente e singela, para dizer: “Se Deus quer…”

“Sou um milagre”, diz dona Maria Nilce. Foto: acervo de família

Vídeo comemorativo produzido pelo neto Alessandro Oliveira

Galeria

Fonte: Governo AC

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Prefeitura de Assis Brasil promove confraternização para celebrar mais um ano do SCFV com a terceira idade

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A Prefeitura de Assis Brasil, por meio da Secretaria Municipal de Assistência Social, realizou nesta quinta-feira(04), uma grande celebração em alusão a mais um ano de atividades do Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV) com o grupo da terceira idade. O encontro festivo reuniu idosos participantes do programa, marcando um momento de alegria, interação e reconhecimento pela trajetória construída ao longo do ano.

A comemoração contou com um almoço especial preparado para os participantes, reforçando o cuidado e o carinho dedicados ao público da melhor idade. Além da confraternização, o evento foi animado com música ao vivo, criando um ambiente leve e descontraído para todos os presentes.

Dinâmicas e momentos de integração proporcionaram ainda mais interação entre os idosos, reforçando o objetivo principal do SCFV: fortalecer vínculos comunitários, promover bem-estar e incentivar a socialização. Ao final da programação, foram distribuídos prêmios, levando ainda mais entusiasmo e sorrisos ao grupo.

O encontro reflete o cuidado da Prefeitura de Assis Brasil com políticas públicas que promovem inclusão, acolhimento e respeito, celebrando com carinho mais um capítulo dessa caminhada conjunta.

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Detran-AC e Sead divulgam resultado preliminar de concurso para cargos de nível superior

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Edital publicado nesta sexta (5) apresenta classificação dos candidatos e abre prazo para recursos entre 8 e 9 de dezembro.

Foto: Kelvisson Monteiro/Detran-AC

A Secretaria de Estado de Administração (Sead) e o Departamento Estadual de Trânsito do Acre (Detran-AC) publicaram, nesta sexta-feira (5), no Diário Oficial, o Edital nº 045 SEAD/DETRAN, que traz o resultado e a classificação preliminar do concurso público destinado ao provimento de cargos de nível superior. O certame é regido pelo Edital de Abertura nº 001/2024, lançado em 8 de abril do ano passado.

O documento apresenta a relação preliminar de candidatos aprovados, organizada por cargo, número de vagas, nome, inscrição, nota final e classificação geral. A lista completa está disponível no edital.

Conforme o cronograma, os candidatos poderão apresentar recursos contra o resultado preliminar entre 00h do dia 8 de dezembro de 2025 e 23h59 do dia 9 de dezembro de 2025, no horário de Brasília. Os recursos deverão ser enviados exclusivamente por meio de formulário próprio, disponível no site www.institutoaocp.org.br.

O boletim de desempenho individual também poderá ser consultado no mesmo endereço eletrônico, pelo prazo de até 30 dias após a publicação do edital.

A organização do certame reforça que todas as etapas seguem as regras previstas no Edital nº 001 SEAD/DETRAN, de 8 de abril de 2024. Em caso de dúvidas, os candidatos podem contatar o Instituto AOCP, de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h, ou acessar o site citado no documento.

O edital é assinado por Keuly Tavares Queiroz Costa, secretária de Estado de Administração em exercício, e Taynara Martins Barbosa, presidente do Detran-AC.

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PGE publica diretrizes para concessão de auxílio financeiro a procuradores e servidores

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Foto: Procuradoria-Geral do Estado do Acre

A Procuradoria-Geral do Estado do Acre (PGE) publicou, nesta sexta-feira, 5, duas portarias que estabelecem as diretrizes para concessão de bolsas de auxílio financeiro e ressarcimento destinados à participação de procuradores e servidores em eventos de capacitação no exercício de 2026. As medidas constam nas portarias PGE nº 816/2025 e PGE nº 817/2025, ambas assinadas pela procuradora-geral do Estado, Janete Melo d’Albuquerque Lima de Melo.

Bolsa para Procuradores – Portaria PGE nº 816/2025

A Portaria nº 816 estabelece o valor máximo do auxílio financeiro para participação dos procuradores no 52º Congresso Nacional dos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, que será realizado de 9 a 12 de novembro de 2026, em Curitiba (PR), promovido pela ANAPE. O valor fixado é de R$ 10 mil, destinado a custear inscrição, transporte, hospedagem e alimentação, conforme prevê a Resolução PRES/CPGE nº 10/2010.

Segundo o documento, todos os procedimentos referentes à seleção e concessão do auxílio serão regulamentados pelo Centro de Estudos Jurídicos da PGE, seguindo os critérios previstos na normativa interna da instituição. O pagamento será feito pelo Fundo Orçamentário Especial da Procuradoria, conforme legislação vigente.

Bolsa para Servidores – Portaria PGE nº 817/2025

A Portaria nº 817 define as regras para concessão de auxílio financeiro voltado aos servidores do quadro de apoio da PGE que participarem de cursos, seminários e eventos de qualificação profissional ao longo de 2026. O valor máximo para essas bolsas será de R$ 2.500 por servidor, cobrindo inscrição, deslocamento, hospedagem e alimentação.

A concessão obedecerá critérios de proporcionalidade conforme o número de servidores em cada órgão interno:

órgãos com até 5 servidores: 1 bolsa disponível;

órgãos com 6 a 10 servidores: 2 bolsas;

órgãos com mais de 10 servidores: 3 bolsas.

Os eventos deverão ter relação direta com as atribuições exercidas pelos servidores em suas unidades de lotação. A seleção será preferencialmente feita por edital, considerando a disponibilidade financeira do Fundo Orçamentário Especial e o número de interessados.

Planejamento e transparência

As duas portarias se baseiam no Programa Anual de Capacitação 2026 da PGE, já aprovado e previsto no Plano Plurianual 2024–2027, além da proposta orçamentária do Estado para o próximo ano. Os documentos destacam ainda a política de valorização profissional e a necessidade de promover gestão por competências e capacitação contínua.

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