Brasil
Saiba como usar as notas individuais do Enem 2025

As provas objetivas e a redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2025 serão aplicadas nos dias 9 e 16 de novembro, em quase todo o país, com exceção das cidades de Belém, Ananindeua e Marituba, no Pará.
Devido à realização da 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), em Belém, de 10 a 21 de novembro, nessas localidades as provas ocorrerão em 30 de novembro e 7 de dezembro.
Depois que o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) divulgar os resultados individuais dos participantes, com previsão para janeiro de 2026, os mais de 4,8 milhões de inscritos confirmados precisam saber como as notas obtidas poderão ser usadas.
Os resultados podem ser usados para acesso a universidades públicas, para concorrer a bolsas de estudo integrais e parciais em universidades privadas, para pleitear o crédito estudantil para o pagamento das mensalidades de faculdades privadas, para ingresso sem vestibular em faculdades, para estudar em Portugal, para autoavaliação e certificação de conclusão do ensino médio ou declaração parcial de proficiência nessa etapa do ensino básico.
Anualmente, o Enem é aplicado pelo Inep.
Acesso ao Ensino Superior
O Enem é a principal porta de entrada para a educação superior no Brasil. As notas do exame podem ser usadas para ingresso no Sistema de Seleção Unificada (Sisu), no Programa Universidade para Todos (Prouni) e para obter o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies).
As inscrições para os três processos seletivos acontecem em períodos distintos, sendo um seguido do outro, nessa ordem cronológica: Sisu, Prouni e Fies. Veja a seguir.
1 – Sisu
A seleção é feita com base na média das notas obtidas no exame, dentro do limite de vagas disponíveis para cada curso e modalidade de concorrência. A maioria dos participantes do Sisu é formada por instituições públicas, como universidades e institutos federais.
A novidade é que a edição 2026 do Sisu permitirá o uso das notas das três últimas edições do Enem – 2023, 2024 e 2025 – para a inscrição e classificação dos candidatos.
Para participar da seleção do Sisu, o candidato não pode ter zerado a redação. Também é preciso ter o ensino médio completo, ou seja, os treineiros não podem se inscrever no sistema.
O processo seletivo leva em consideração os perfis social e econômico dos candidatos, conforme determina a Lei de Cotas.
Na última edição, foram ofertadas 261.779 vagas para 6.863 cursos de graduação em 124 instituições de todas as regiões do país.
2 – Prouni
Para se inscrever nos processos seletivos do Prouni, o estudante poderá usar as notas do Enem das duas últimas edições do exame.
É preciso ter tirado nota média superior a 450 pontos nas cinco provas do Enem e ter tirado acima de zero na redação.
O Prouni oferece bolsas de estudo integrais (100% gratuitas) e parciais (50% do valor da mensalidade do curso) para graduação em instituições privadas.
O MEC realiza dois processos seletivos do programa a cada ano. O público-alvo é o estudante brasileiro sem diploma de nível superior.
Em todos os processos seletivos, o candidato pode optar por concorrer às bolsas destinadas à ampla concorrência ou às cotas para pessoas com deficiência (PCD) e autodeclaradas indígenas ou negras.
Para concorrer à bolsa integral, é preciso ter renda familiar bruta mensal de até um salário mínimo e meio por pessoa. Para a bolsa parcial, a renda familiar bruta mensal deve ser de até três salários mínimos por pessoa.
Veja aqui outras condições para os candidatos, como ter feito o ensino médio em escola pública ou ter sido bolsista em escola privada.
3 – Fies
As notas do Enem também podem ser usadas para concorrer a vagas ofertadas para o ensino superior pelo Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), que possibilita a estudantes de baixa renda cursar faculdades particulares por meio de financiamento, que começa a ser cobrado após a conclusão do curso.
Para participar, o estudante precisa ter feito o Enem, qualquer edição desde 2010, obtido nota média superior a 450 pontos e não ter zerado a redação.
Desde 2024, o Fies reserva vagas para candidatos autodeclarados negros, indígenas e quilombolas, assim como para pessoas com deficiência (PCDs).
Para participar, é preciso ter renda familiar mensal bruta por pessoa de até três salários mínimos. A nova modalidade do programa, o Fies Social, reserva metade das vagas para estudantes com renda familiar por pessoa de até meio salário mínimo e inscritos no Cadastro Único para Programas Sociais do governo federal (CadÚnico), em situação ativa.
Foram ofertadas mais de 112 mil vagas, em dois processos seletivos do Fies em 2025. O primeiro, para cursos com início das aulas no primeiro semestre, e o segundo, para aulas que tiveram início no segundo semestre.
4 – Enem Portugal
As notas dos estudantes brasileiros também podem ser aproveitadas em processos seletivos de instituições de ensino superior de Portugal que têm convênio com o Inep para aceitar as notas do exame.
Os acordos garantem acesso facilitado pelas universidades, institutos politécnicos e escolas superiores portuguesas às notas dos estudantes interessados em cursar a educação superior em Portugal. Porém, os convênios não envolvem transferência de recursos e não preveem financiamento estudantil pelo governo brasileiro.
Atualmente, 26 entidades de ensino em Portugal possuem convênio com o Instituto. Entre elas estão o Instituto Politécnico de Coimbra, a Universidade Nova de Lisboa e o Instituto Português de Administração de Marketing, em Porto. Confira aqui as instituições de educação superior portuguesas que aceitam notas do Enem e a vigência de cada convênio.
5 – Outras seleções
Os resultados individuais do Enem também podem ser empregados como critério único ou complementar de processos seletivos próprios realizados por cada instituição de ensino superior, seja pública ou privada do Brasil. A estratégia que possibilita o ingresso direto, substitui ou complementa o vestibular tradicional.
Certificação do ensino médio
A prova do Enem deste ano voltará a permitir que as provas sejam usadas para obter certificação de conclusão do ensino médio e declaração parcial de proficiência na etapa de ensino. Essa possibilidade a partir do Enem tinha sido descontinuada em 2017.
O participante deve atender aos seguintes requisitos específicos:
· ter, no mínimo, 18 anos completos na data da primeira prova de cada edição do exame;
· alcançar a pontuação mínima em cada área do conhecimento (igual ou maior a 450 pontos), conforme o padrão de desempenho básico definido pelo Inep;
· alcançar pelo menos 500 pontos na redação.
Durante o período em que o Enem não ofereceu essa função, o Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja) permaneceu como principal ferramenta de certificação para o ensino fundamental e médio.
Treineiros
O exame serve também para os os candidatos do tipo treineiro, que geralmente não concluíram o ensino médio ou não estão estudando, testarem seus conhecimentos
Nesse caso, como o exame tem como fim a autoavaliação, a nota do Enem não serve para ingresso no ensino superior no Brasil nem em Portugal.
Porém, pode ser útil para que o treineiro conheça o formato da prova, teste o gerenciamento de tempo, identifique as áreas do conhecimento que precisam ser aprimoradas nos estudos.
Vale ressaltar também que o resultado (as notas) dos treineiros é divulgado em data posterior à dos candidatos regulares (geralmente cerca de 60 dias depois).
Enem
O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) foi instituído em 1998.
Os participantes fazem provas de quatro áreas de conhecimento: linguagens, códigos e suas tecnologias; ciências humanas e suas tecnologias; ciências da natureza e suas tecnologias; e matemática e suas tecnologias que, ao todo, somam 180 questões objetivas.
Os participantes também são avaliados por meio de uma redação, que exige o desenvolvimento de um texto dissertativo-argumentativo, a partir de um problema.
Para saber mais sobre o exame, acesse o link criado pelo Inep com respostas às perguntas mais frequentes.
Comentários
Brasil
Governo devolve mais de R$ 17,9 milhões a aposentados do Acre com descontos não autorizados do INSS
23.813 segurados acreanos foram ressarcidos; acordo nacional já repassou R$ 2,74 bilhões a 4 milhões de brasileiros. Adesão ainda está aberta e é gratuita

Os depósitos são realizados diretamente na conta onde o beneficiário recebe o benefício previdenciário, corrigidos pela inflação (IPCA) e sem necessidade de processo judicial. Foto: ilustrativa
O Governo Federal já devolveu R$ 17,97 milhões a 23.813 aposentados e pensionistas do Acre que tiveram descontos associativos não autorizados em seus benefícios do INSS. No país, o acordo já beneficiou 4 milhões de brasileiros, com um total de R$ 2,74 bilhõesdevolvidos até esta semana.
O ressarcimento é feito diretamente na conta do beneficiário, com correção pelo IPCA, sem necessidade de processo judicial. Os valores referem-se a descontos realizados entre março de 2020 e março de 2025 por entidades que não comprovaram autorização formal.
Quem pode aderir:
-
Beneficiários que contestaram descontos e não receberam resposta em 15 dias úteis.
-
Quem obteve respostas irregulares, como assinaturas falsas ou gravações de áudio como “comprovação”.
-
Segurados com ações judiciais em andamento (é necessário desistir do processo para entrar no acordo).
O procedimento é gratuito, rápido e totalmente online, sem exigência de envio de documentos. Além do valor descontado, o INSS também pagará honorários advocatícios de 5% em ações individuais que forem encerradas para aderir ao acordo.
O governo reforça que os segurados verifiquem extratos e descontos recorrentes e busquem o ressarcimento caso identifiquem cobranças indevidas. O prazo para adesão segue aberto.
Critérios de elegibilidade
- Descontos indevidos entre março de 2020 e março de 2025
- Contestação sem resposta da entidade em 15 dias úteis
- Respostas irregulares (assinaturas falsificadas, gravações como comprovante)
- Ações judiciais em andamento (necessário desistir para aderir)
Processo de adesão
- Gratuito e rápido
- Sem envio de documentos
- Honorários advocatícios: 5% para ações individuais encerradas
Recomendação oficial
- Verificação: Segurados devem checar origem de descontos recorrentes
O acordo representa esforço do governo para resolver em massa uma questão que sobrecarregava a Justiça com milhares de ações individuais. No Acre, onde a população idosa depende fortemente dos benefícios previdenciários, o ressarcimento traz alívio financeiro significativo para milhares de famílias.
Comentários
Brasil
Construção de casas populares no Acre tem novo atraso e entrega só em janeiro de 2026
Governo rescindiu contratos com empreiteiras por descumprimento de prazos; obras da Cidade do Povo, em Rio Branco, são as mais afetadas

A Sehurb informou que, em razão da necessidade de recontratação das empresas, a entrega das unidades da Cidade do Povo deverá ocorrer apenas na segunda quinzena de janeiro de 2026, sem possibilidade de antecipação. Foto: captada
A entrega de casas populares no Acre sofreu novos atrasos em 2025, e a previsão de conclusão das primeiras unidades, principalmente no bairro Cidade do Povo, em Rio Branco, só deve ocorrer na segunda quinzena de janeiro de 2026. A Secretaria Estadual de Habitação e Urbanismo (Sehurb) atribui o problema ao descumprimento contratual pelas empreiteirasresponsáveis, o que levou à rescisão dos contratos e à abertura de nova licitação.
O atraso acontece mesmo com recursos federais já liberados pelo Ministério das Cidades para a construção de 3.573 unidades habitacionais no estado, pelo Programa Minha Casa, Minha Vida. Além de Rio Branco, o programa prevê moradias em Plácido de Castro (25), Feijó (25) e Tarauacá (50), além de 383 novas casas na Cidade do Povo com recursos do Pró-Moradia.
A Sehurb informou que o pagamento às construtoras foi feito conforme medição da Caixa, descartando atrasos financeiros como causa. Agora, a recontratação das empresas é necessária para garantir qualidade e segurança nas obras.
Enquanto isso, o cadastro de interessados segue aberto pelo Sistema de Habitação (Sishabi), plataforma digital que já registra cerca de 26.716 inscrições só em Rio Branco. A secretaria reforça que as inscrições são apenas online e visam transparência e acesso simplificado aos programas habitacionais.
O Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon) ainda não se posicionou sobre os atrasos. A situação expõe a dificuldade crônica na execução de obras públicas no estado, mesmo com verba federal garantida.

De acordo com a Secretaria Estadual de Habitação e Urbanismo (Sehurb), nenhuma das empresas contratadas conseguiu executar os serviços dentro dos prazos estabelecidos. Foto: captada
Comentários
Brasil
Saúde pública foi tornada refém do uso político de emenda parlamentar
Até 2013, as emendas parlamentares representavam apenas 0,8% do orçamento do Ministério da Saúde. Hoje, esse índice saltou para 12%, um crescimento exponencial que desequilibra o planejamento nacional

Atendimento de paciente com Covid-19: saúde pública dependente de emenda parlamentar. Foto: Ingrid Anne/Semcom
O financiamento do SUS (Sistema Único de Saúde) vive um momento crítico de disputa política e orçamentária e as emendas parlamentares, que foram um mecanismo complementar de investimento, transformaram-se, na última década, em uma fatia gigantesca e decisiva do orçamento da saúde pública no Brasil.
Para avaliar como a dependência de emendas pode impactar no planejamento do SUS, conselheiras e conselheiros nacionais de saúde, juristas, economistas e especialistas se reuniram para o Seminário “Financiamento e impacto das emendas parlamentares no SUS”, realizado no dia 3 de dezembro, em Brasília, pela Comissão Intersetorial de Financiamento e Orçamento (Cofin/CNS).
Os participantes alertaram que a política de financiamento foi descontextualizada do planejamento sanitário, tornando-se refém de uma lógica de austeridade fiscal e de interesses políticos via emendas parlamentares. A discussão, longe de ser apenas contábil, refletiu sobre a disputa entre capital e trabalho em que o subfinanciamento atua como um mecanismo de fragilização do direito à vida.
Lenir Santos, especialista em direito sanitário e integrante da Cofin/CNS recordou que desde o lançamento da Declaração de Alma-Ata, em 1978, e a criação das Ações Integradas de Saúde (AIS), o Brasil luta para consolidar um orçamento condizente para as políticas públicas de saúde.
“A Constituição Federal de 1988 trouxe avanços, mas também frustrações. Originalmente, previa-se que 30% do orçamento da Seguridade Social fosse destinado à saúde, mas, na prática, recursos foram desviados para outras ações, como assistência social e educação, gerando crises de pagamento na rede contratada desde o início do sistema”, relembrou Lenir.

Pacientes em busca de atendimento em hospital de Manaus: longas filas e espera. Foto: Divulgação
Essa fragilidade histórica, segundo o especialista, foi agravada pela própria estrutura tributária brasileira, segundo o economista e consultor do CNS, Francisco Funcia. Ele destacou que a Constituição Federal de 1988, embora tenha descentralizado a execução das políticas públicas, manteve a arrecadação centralizada.
De tudo que se arrecada de impostos no Brasil, 69% são relativos aos tributos federais (ex.: Imposto de Renda), 25% são tributos estaduais (ex.:ICMS) e 6% são tributos municipais (ex.:IPTU). Após as transferências intergovernamentais, chegamos ainda em uma centralização, ou seja, mesmo após a União repassar parte da arrecadação para estados e municípios, 57% da receita disponível ainda está no âmbito da União, 25% nos estados e 18% nos municípios.
Essa disparidade cria uma asfixia financeira nas prefeituras, que dependem visceralmente das transferências constitucionais e voluntárias. Para o economista, é neste vácuo de recursos que as emendas parlamentares ganharam força política: diante da escassez, prefeitos buscam parlamentares para garantir o funcionamento básico de seus sistemas locais, criando uma relação de dependência”, avaliou.
Os dados apresentados durante o Seminário revelam uma mudança drástica na composição do orçamento federal. Até 2013, as emendas parlamentares representavam apenas 0,8% do orçamento do Ministério da Saúde. Hoje, esse índice saltou para 12%, um crescimento exponencial que desequilibra o planejamento nacional.
A análise do período de 2014 a 2022 mostra que o orçamento geral da saúde cresceu 1,7 vezes, enquanto o valor das emendas aumentou 5,7 vezes. Em valores nominais, a execução de emendas no Ministério da Saúde saltou de R$15 bilhões em 2023 para quase R$25 bilhões em 2024, um crescimento de mais de 60% em apenas um ano.
O problema central, contudo, não é apenas o volume de recursos, mas a qualidade do gasto. As emendas parlamentares, especialmente as individuais, muitas vezes não dialogam com os instrumentos de gestão e planejamentos de saúde ou com as pactuações feitas nas Comissões Intergestores Tripartites (CIT), por exemplo. Elas atropelam o planejamento técnico, alocando verbas sem critérios epidemiológicos, o que resulta em ineficiência e desperdício.

Plenário da Câmara: políticos financiam a saúde pública com emendas. Foto: Kayo Magalhães/Agência Câmara
O SUS é desenhado para funcionar com base em planos municipais, estaduais e nacional, com critérios epidemiológicos e de necessidade. As emendas, contudo, muitas vezes ignoram essa lógica. Os recursos fluem para onde há aliados políticos, não necessariamente onde há mais doentes ou carência assistencial; os equipamentos são comprados sem previsão de equipe para operá-los, ou unidades são reformadas em locais sem prioridade sanitária. Dessa forma, o poder de decisão sobre onde investir sai do Ministério da Saúde (Executivo) e migra para o Congresso (Legislativo).
Além disso, a lógica da austeridade fiscal, consolidada pela Emenda Constitucional 95 (Teto de Gastos), retirou cerca de R$ 70 bilhões do SUS entre 2018 e 2022, transformando o piso constitucional da saúde em um teto de despesas e forçando uma competição predatória por recursos dentro do orçamento público. A nova realidade orçamentária trouxe também complexos desafios jurídicos. A Lei Complementar nº 141 foi um marco ao determinar critérios de rateio e fiscalização, mas a profusão de novas regras e emendas impositivas gerou um emaranhado legal.
A juíza Amanda Costa, auxiliar no Supremo Tribunal Federal (STF) do Ministro Flávio Dino, explica que o cenário atual exigiu a intervenção da corte através da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 854. “O Judiciário passou a tratar a questão como um “processo estrutural”, reconhecendo que o ajuste do sistema exige medidas graduais e testadas para garantir transparência e rastreabilidade do dinheiro público”, defendeu.
Ainda no conjunto de avanços de medidas estruturais previstas na ADPF 854, todas as transferências decorrentes de emendas de qualquer modalidade na área da saúde são acompanhadas previamente de um atestado de conformidade a ser dado pelo gestor federal do SUS. “Essa preocupação com a eficiência do gasto público, passa a constar expressamente em decisões do colegiado”, explica a juíza.
Mudança de Perfil
Um outro ponto de tensão recente entre os poderes envolve a destinação final das emendas, especialmente quando elas são usadas em pagamento de pessoal, por exemplo. Dácio Guedes, diretor do Fundo Nacional de Saúde (FNS) explica que uma mudança drástica ocorreu na destinação desse dinheiro. “Historicamente, emendas eram usadas para investimento (construção de unidades, compra de equipamentos). Hoje, cerca de 90% desses recursos são destinados a custeio (pagamento de despesas correntes), muitas vezes sem critérios técnicos claros”, afirma.
Historicamente, e por vedação constitucional, as emendas não poderiam ser usadas para despesas de custos recorrentes e pagamento de pessoal, pois estas configuram gastos contínuos incompatíveis com transferências pontuais. No entanto, o Tribunal de Contas da União (TCU) reformou recentemente seu entendimento, permitindo, com base em alteração em uma resolução do Congresso Nacional, que emendas coletivas (de bancada e comissão) financiem folhas de pagamento na saúde. Essa flexibilização preocupa especialistas, pois pode comprometer a sustentabilidade fiscal dos municípios a longo prazo, além de ferir a lógica de que emendas deveriam ter caráter estruturante.

Dinheiro de emendas é usado para pagar médicos, o que contraria finalidade do recurso político. Foto: Marcelo Camargo/ Agência Brasil
Mas segundo Dácio, existe uma janela de oportunidade para os gestores e conselheiros de saúde que zelam pela correta aplicação e precisam analisar e validar os relatórios anuais de gestão. A exigência de contas bancárias específicas para cada emenda e a auditoria determinada pelo DenaSUS (Departamento Nacional de Auditoria do Sistema Único de Saúde) sobre recursos sem identificação são passos importantes para recuperar o controle sobre o destino das verbas. O diretor do FNS lembra que gestores e conselheiros têm o dever de analisar e validar os relatórios anuais de gestão, garantindo que o dinheiro que chega via emendas seja aplicado corretamente.
O momento exige vigilância constante, pois, como destacou o assessor parlamentar Flávio Tonelli, é preciso debater o que foi naturalizado na política brasileira, mas que não é natural: a captura do orçamento público por interesses que não o bem comum. “A defesa do SUS passa, obrigatoriamente, por desatar o nó que transformou o financiamento da saúde em moeda de troca política”, destacou.
Para além das cifras e leis, o debate sobre o financiamento do SUS é, essencialmente, político e social. Maicon Nunes, conselheiro nacional de saúde representante do Movimento Negro Unificado (MNU), reforça que o desfinanciamento não é um descuido, mas um projeto político que atinge desproporcionalmente a população negra, que compõe a maioria dos usuários do sistema público. “Congelar investimentos em saúde significa, na prática, congelar o investimento na vida dessas pessoas”, declarou.
Ronald dos Santos, ex-presidente do Conselho Nacional de Saúde alertou que não se pode desvincular a luta pelo orçamento da disputa histórica entre capital e trabalho no Brasil. “O Conselho Nacional de Saúde tem se posicionado como uma trincheira de resistência contra esse desmonte, atuando não apenas no controle social, mas como um agente político na defesa da democracia”, defendeu.
A narrativa de que o SUS é ineficiente serve aos interesses de mercantilização da saúde, abrindo portas para a privatização e para a atuação predatória do mercado. O desafio para os próximos anos, conforme apontado por outros participantes do Seminário, é mobilizar a sociedade para a 18ª Conferência Nacional de Saúde e pautar um financiamento justo, que não seja corroído pelos juros da dívida pública ou pelas restrições do novo arcabouço fiscal.

Você precisa fazer login para comentar.