Proposta de desmilitarização acirra conflito interno na PF

Agentes veem item sobre reestruturação da carreira como ascensão, enquanto delegados apontam ‘trem da alegria’

Da redação, com iG

Proposta acirrou ânimos entre agentes e delegados da PF – Lucas Dantas/Futura Press

A proposta de emenda constitucional que trata da desmilitarização da Polícia Militar e de mudanças na organização da Polícia Civil e Polícia Federal (PEC-51) acirrou os ânimos entre os agentes e delegados da PF.

De um lado, os agentes que enxergam na proposta uma possibilidade de ascensão na carreira por mérito. Eles defendem a aprovação da proposta e dizem que os delegados temem perder poder com as mudanças.

Do outro lado, os delegados, contrários à aprovação, classificam a proposta de “trem da alegria”. Segundo eles, o texto prevê o reenquadramento de servidores públicos sem a necessidade de concurso.

Os delegados, organizados por meio da Associação dos Delegados da Polícia Federal (ADPF), alegam que a proposta é inconstitucional por não ser de iniciativa do Executivo. A argumentação é de que a aprovação da proposta pode gerar um acréscimo de 10% no custo da folha de pagamento da PF. Diante disso, não caberia uma ao Legislativo propor a mudança.

A estimativa é de que, com a aprovação da PEC, a folha de pagamento da PF seja elevada em R$ 20 milhões ao mês. Hoje, a PF gasta aproximadamente R$ 200 milhões por mês com pagamento de pessoal.

Esse percentual de aumento de despesas é indicado em uma nota técnica emitida pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). Apesar de reconhecer o impacto, a ANPR está do lado dos agentes, no apoio à proposta, que tramita no Senado. A relatoria está a cargo do senador Humberto Costa (PT-PE).

No âmbito da Polícia Federal, a PEC pode provocar a criação da chamada “carreira de cargo único”. Na prática, transformaria o cargo de delegado de polícia em uma função obtida por mérito. Isso permitiria, por exemplo, a quem entrou para a Polícia Federal como agente, chegar à condição de delegado. Os delegados reclamam que não existem critérios claros no texto da proposta de como ocorreriam essas progressões dentro da carreira policial.

Atualmente, o delegado de polícia começa a carreira após passar em um concurso público específico para essa função. O agente somente consegue chegar à condição de delegado, caso passe neste concurso. Além de promover essas mudanças na carreira da Polícia Federal o texto da PEC também atinge a carreira da Polícia Civil em todo o Brasil. O texto propõe os cargos na carreira policial às funções de delegados e não delegados e prevê o controle externo das atividades policiais.

Entre os delegados, há o receio dos delegados de que, pela falta de um concurso público específico para delegado de polícia, possam ocorrer situações classificadas por eles como absurdas. Um exemplo alegado é a existência de delegados sem ensino superior, mas promovido por tempo de serviço, comandar uma equipe de agentes com ensino superior.

“Para os delegados de Polícia Federal, ela é uma PEC que não tem razão de ser. A PF já é uma instituição que tem grande credibilidade perante a sociedade, sempre com índices de aprovação acima de 50%. É uma instituição que tem o reconhecimento da população e tentar uma modificação da estrutura da Polícia Federal não é nada salutar. Os delegados não aceitam uma carreira de cargo único. Qual o cargo que vai ser extinto? O de delegado?”, questionou o presidente da ADPF, Marcos Leôncio Ribeiro. “Causa estranheza que a ANPR, que representa uma categoria cuja uma das finalidades é ser fiscais da lei concorde com uma proposta inconstitucional”, complementou.

Além da ANPR, a PEC 51 tem o apoio da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef). “Desde a Constituição já era para se ter regulamentado uma carreira única e isso nunca aconteceu. Toda a população acredita que o agente, com tempo de trabalho, vira delegado. E não vira. Por mais que você cresça na profissão, você não tem acesso à gestão nem ao comando dos processos de investigação. A PEC 51 corrige isso”, alega o vice-presidente da Fenapef, Luís Antônio Bouden.

Além das mudanças na carreira, a PEC 51 propõe um projeto de força de segurança unificada, acabando com o termo “Polícia Militar”. Cada estado teria autonomia para administrar as polícias e promover as funções de policiamento e investigação. Outra alteração proposta é a união dos procedimentos policiais. Atualmente, estas funções são especificadas para cada polícia. A Polícia Militar, por exemplo, cuida do policiamento ostensivo. Já as polícias Civil e Federal cuidam da investigação criminal.

Quando ocorre um assassinato, o primeiro atendimento é feito por policiais militares que depois encaminham o processo à polícia civil. A proposta pode criar situações, por exemplo, em que o mesmo policial que cuida de uma ronda e testemunha um assassinato se responsabilize pela abertura de um procedimento investigatório.

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Publicado por
Alexandre Lima