Justiça decide que policial federal que matou jovem em boate no Acre deve ir a júri também por tentativa de homicídio

O advogado do policial, Willington Silva, informou que vai recorrer da decisão com embargos junto ao Tribunal de Justiça do Acre e, caso seja necessário, também vai apelar ao Supremo Tribunal de Justiça

Policial federal Victor Manuel Fernandes Campelo foi transferido do Acre por questões de segurança, segundo defesa — Foto: Reprodução/Rede Amazônica Acre

Por Alcinete Gadelha

A Câmara Criminal julgou na semana passada dois recursos com relação ao processo do policial federal Victor Campelo, apontado como autor dos disparos que mataram o estudante Rafael Frota, em julho de 2016, em uma boate de Rio Branco.

Um dos recursos, apresentado pela defesa do policial, pedia a absolvição do PF, que foi pronunciado a ir a júri popular pelo crime de homicídio simples, praticado contra Frota, alegando legítima defesa. No entanto, o pedido foi negado.

O relator da matéria, Élcio Mendes Junior, escreveu que não ficou comprovado no processo que o policial tenha sido “desmedidamente agredido” ou colocado em uma situação de “grande perigo” a ponto de ter que se defender com disparos de arma de fogo. O que não caracteriza, segundo o magistrado, a legítima defesa. Com a decisão, foi mantida a sentença de pronúncia do juiz da 2º Vara do Tribunal do Júri.

Na sequência, a Câmara Criminal julgou o recurso do Ministério Público do Acre (MP-AC) que se posicionou contra a decisão, também da 2º Vara do Tribunal do Júri, que absolveu o policial federal do crime de tentativa de homicídio por também ter ferido Nelciony Araújo na mesma ação.

Conforme a decisão, o desembargador entendeu que o policial assumiu o risco de alvejar – matando ou ferindo – quaisquer dos jovens que estavam no local ao sacar uma pistola e efetuar pelo menos quatro disparos em um ambiente escuro e lotado de pessoas. Assim, a Câmara Criminal decidiu que o policial federal também deve ir a júri popular pelo crime de tentativa de homicídio.

Defesa vai recorrer

A reportagem, o advogado do policial, Willington Silva, informou que vai recorrer da decisão com embargos junto ao Tribunal de Justiça do Acre e, caso seja necessário, também vai apelar ao Supremo Tribunal de Justiça.

“Essa decisão, na verdade, reformou em parte a decisão do juiz de primeiro grau, porque o juiz tinha considerado que o Victor era inocente com relação ao crime de tentativa de homicídio, e que ele deveria ser submetido ao tribunal do júri com relação à outra vítima, que era o Rafael Frota. A gente apontou uma divergência nesse entendimento, porque suscitamos a tese de que ao tentar acertar o Nelciony em um dos disparos, ele acabou acertando o Rafael, e levamos essa tese ao tribunal. Os desembargadores acharam por bem dar provimento ao recurso do MP e desprovimento ao recurso da defesa. Então, o Victor, ao final, acabou sendo pronunciado pelo crime de tentativa e pelo crime de homicídio”, explicou Silva

Julgamento anulado

O julgamento do policial federal Victor Campelo, que iria a júri popular por matar o estudante Rafael Frota, chegou a ser anulado no ano passado para aguardar que o Tribunal de Justiça analisasse os recursos tanto da defesa como do MP.

A anulação ocorreu após o MP apresentar um recurso ao Tribunal de Justiça do Acre (TJ-AC) que tinha absolvido o policial parcialmente da tentativa de homicídio contra Nelciony Araújo. O pedido do MP à Justiça era para que ele também fosse a júri por tentativa de homicídio.

“Uma mesma sessão deve analisar o recurso da defesa e da acusação. Então, nesse julgamento, o Victor pode ser absolvido pelos dois crimes, ou ele pode ser pronunciado pelos dois crimes e também pode ser mantida a decisão do juiz de primeiro grau, no sentido de mandar ele para júri só pelo crime de homicídio consumado”, acrescentou o advogado na época.

Legítima defesa

Na época em que foi pronunciado ao júri por homicídio, o advogado de Campelo disse que pediu a anulação do júri com base na conclusão das investigações da Polícia Civil e perícias. Segundo ele, ficou comprovado que o policial agiu em legítima defesa, argumento também defendido pelo policial no primeiro depoimento prestado à Justiça em 2018.

“Com base em toda prova pericial expedida, sobretudo do delegado que presidiu o caso. Pelo entendimento dele, o Victor agiu em legítima defesa, motivo pelo qual não deveria nem ser indiciado na época, mas o Ministério Público discordou, ofereceu denúncia, foi feita reprodução simulada dos fatos e se chegou ao entendimento que o Victor atirou contra os agressores dele”, relembrou.

Silva explicou que Campelo foi transferido para outro estado em 2019 por questão de segurança. Agora, com essa nova decisão que ainda cabe recurso, o advogado disse que ainda não foi marcada data para o julgamento.

Rafael Frota morreu após ser atingido por um tiro dentro de uma boate em Rio Branco — Foto: Arquivo pessoal

Morte em boate

O crime ocorreu na madrugada de 2 de julho de 2016. A Polícia Federal (PF-AC) informou na época que os disparos foram feitos em legítima defesa, já que Victor Campelo foi agredido por várias pessoas e caiu no chão. Um dos tiros acertou Rafael Frota, que chegou a ser socorrido, mas não resistiu. Outro homem e o próprio policial também ficaram feridos.

Um dia depois do ocorrido, o policial federal foi encaminhado à audiência de custódia, onde a Justiça do Acre decidiu pela manutenção da prisão. O TJ-AC afirmou que o suspeito alegou legítima defesa, mas o argumento não convenceu o juiz. Campelo ficou custodiado na sede da PF.

Familiares de Frota chegaram a fazer um ato no Centro da capital acreana para pedir justiça. O pai do jovem, Gutemberg Frota, disse na época que era uma tentativa de sensibilizar a sociedade para que crimes dessa natureza não fiquem impune.

Na noite de 26 de julho de 2016, a Polícia Civil reconstituiu a morte do estudante Rafael Frota. Campelo e a ex-namorada dele, Lavínia Melo e os jovens apontados como responsáveis pela confusão que teria motivado os tiros, retornaram à casa noturna, no bairro Aviário, para participar da reconstituição.

Em maio de 2017, o policial teve duas medidas cautelares revogadas pela Justiça do Acre. Entre as medidas, estavam a revogação da proibição de frequentar bares, boates e casas noturnas, bem como o recolhimento domiciliar a partir das 19h nos finais de semana, feriados e dias de folga.

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Publicado por
G1 Acre