Críticas à COP30 expõem risco de fracasso e desafiam imagem do Brasil Tânia Rêgo/Agência Brasil
Críticas à COP30 expõem risco de fracasso e desafiam imagem do Brasil
Tânia Rêgo/Agência Brasil
Falhas de infraestrutura, altos custos e contradições políticas levantam dúvidas sobre o sucesso da conferência climática
A poucos dias da abertura da 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP30), em Belém (PA), o evento acumula críticas e desperta questionamentos sobre a capacidade do Brasil de conduzir uma conferência ambiental de alcance global.
Pela primeira vez sediada no país, a COP reunirá líderes mundiais, cientistas, empresas e organizações entre 10 e 21 de novembro, com o objetivo de definir novas metas de redução das emissões de gases de efeito estufa.
Às vésperas do encontro, o clima é de apreensão. A infraestrutura precária da cidade-sede e o descompasso entre discurso e prática na política ambiental do governo federal geram desconfiança entre participantes e observadores.
Na imprensa internacional, as críticas variam desde o aumento dos preços de hospedagem e a falta de estrutura urbana até questionamentos sobre a coerência das ações brasileiras.
Obras terminando às vésperas do encontro, hotéis lotados, transporte público insuficiente e serviços sobrecarregados colocam em dúvida a capacidade de Belém de receber um evento desse porte.
Além das dificuldades logísticas, organizações e lideranças amazônicas denunciam exclusão e altos custos de participação. A percepção é de que as conferências climáticas têm se transformado em “cúpulas de negócios”, voltadas a oportunidades econômicas mais do que a soluções reais para a crise ambiental.
O cientista político Gabriel Amaral, ouvido pelo R7, avalia que há risco de a COP30 ser lembrada mais pelos problemas do que pelos resultados.
“A COP30 não é um evento ambiental apenas, mas um exercício de afirmação internacional. Quando um país assume o papel de liderança climática, ele se coloca sob um padrão mais rigoroso de observação”, afirma.
Segundo Amaral, a contradição entre o discurso presidencial contra os combustíveis fósseis e a autorização para exploração de petróleo na Margem Equatorial foi percebida no exterior como sinal de incoerência.
“A imagem não se desgasta pelo conteúdo do discurso, mas pela distância entre intenção e prática. Esse tipo de descompasso é rapidamente notado por outros países, por organizações multilaterais e pela imprensa internacional”, completa.
As dificuldades de acesso e o alto custo de participação comprometem a representatividade da conferência, segundo o especialista.
“Quando o acesso a um evento desse porte se torna caro e logisticamente complexo, quem tende a ficar de fora são justamente os atores que deveriam estar no centro da discussão: comunidades amazônicas, organizações territoriais, pesquisadores locais e jovens lideranças”, avalia Gabriel Amaral.
Para ele, a ausência desses grupos esvazia o sentido político do encontro.
“A inclusão não pode ser simbólica. Ela exige presença, voz e capacidade real de influenciar decisões. Quando esses atores são mantidos à margem, a COP deixa de ser um espaço de construção coletiva e se aproxima de uma formulação de cima para baixo”, afirma.
Os problemas de infraestrutura também impactam a imagem do Brasil como anfitrião de grandes eventos internacionais.
“Infraestrutura é leitura imediata de capacidade de execução. Quando um país recebe um evento como a COP, o que está em jogo não é apenas logística, é reputação. Se a cidade transmite improviso e desorganização, a mensagem que fica é de fragilidade institucional”, diz Amaral.
Mesmo diante das falhas, o cientista acredita que ainda é possível mudar o cenário.
“O governo pode corrigir a rota e tratar as críticas como diagnóstico, não como ruído. Em política, reconhecer um problema não é sinal de fraqueza, é demonstração de comando”, avalia.
Segundo ele, a COP30 pode se tornar um marco se resultar em mecanismos permanentes — como metas verificáveis de desmatamento, fortalecimento das instituições ambientais e maior participação das comunidades amazônicas nas decisões sobre o futuro da floresta.
Nos últimos anos, as conferências climáticas têm sido criticadas por se transformarem em palcos políticos voltados à projeção de imagem, com poucos resultados concretos.
“O espaço antes ocupado por pesquisadores e negociadores especializados passou a ser dividido com lideranças políticas em busca de influência. Quando isso acontece, o foco se desloca da solução concreta para a aparência de articulação estratégica”, explica Amaral.
Ele reforça que o desafio brasileiro é evitar que a COP30 vire mera vitrine verde.
“O problema não é politizar, é politizar sem transformar. Se a conferência servir somente como plataforma de imagem, sem continuidade na implementação, a percepção global será de que o evento serviu mais para comunicar intenções do que para produzir resultados”, conclui.