Em maio de 2023, o Plenário do STF referendou uma liminar deferida por Gilmar para suspender a regra. Foto: assessoria
Com Consultor Político
Em julgamento virtual encerrado nesta sexta-feira (21/3), o Supremo Tribunal Federal acabou com a presunção de boa-fé nas compras de ouro por pessoas jurídicas. Por unanimidade, o Plenário reconheceu a inconstitucionalidade de trecho da Lei 12.844/2013 que dispensa a apresentação de documentos que comprovem a legalidade do mineral em transações comerciais.
O colegiado se posicionou ao julgar as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 7.273 e 7.345. As ações foram ajuizadas, respectivamente, pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) e pela Rede Sustentabilidade e pelo Partido Verde (PV).
As siglas questionaram a validade do parágrafo 4º do artigo 39 da referida lei. O dispositivo presume “a legalidade do ouro adquirido e a boa-fé da pessoa jurídica adquirente quando as informações mencionadas neste artigo, prestadas pelo vendedor, estiverem devidamente arquivadas na sede da instituição legalmente autorizada a realizar a compra de ouro”.
Para os partidos, o dispositivo reduziu as responsabilidades das Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários (DTVMs). Elas são únicas que têm autorização do Banco Central para comprar e revender ouro oriundo de garimpos da região da Amazônia. Graças à lei, a transação pode ser feita só com base em informações prestadas pelos próprios vendedores.
Em maio de 2023, o Plenário do STF referendou uma liminar deferida por Gilmar para suspender a regra.
O ministro Gilmar Mendes, relator das ADIs, votou pela inconstitucionalidade do dispositivo por entender que a presunção da boa-fé “sabota” as medidas de controle ao garimpo ilegal. Para ele, a norma não só facilita, mas incentiva a comercialização de ouro extraído fora da lei. Até a publicação desta notícia, o decano foi acompanhado por Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Dias Toffoli, Cristiano Zanin e Cármen Lúcia.
Em seu voto, o decano argumentou que a decisão seguiria uma linha do STF de declarar a inconstitucionalidade “de normas que, a pretexto de desburocratizar o licenciamento ambiental, afastam ou enfraquecem o controle prévio de empreendimentos que impactam o meio ambiente”.
“No caso das alterações promovidas pela Lei 12.844/2013, não é difícil verificar que a simplificação do processo de compra de ouro permitiu a expansão do comércio ilegal e fortaleceu as atividades de garimpo ilegal, o desmatamento, a contaminação de rios, a violência nas regiões de garimpo, chegando a atingir os povos indígenas das áreas afetadas.”
Apontou, também, que o garimpo ilegal na Amazônia colabora para aumento da insegurança na região porque é uma porta de entrada para outros crimes relacionados direta ou indiretamente com a prática. Segundo o relatório Cartografias da Violência na Amazônia, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o lucro da venda de ouro ilegal é usado para financiar tráfico de droga e de armas, por exemplo.
“É preciso que esse consórcio espúrio, formado entre garimpo ilegal e organizações criminosas, seja o quanto antes paralisado, o que justifica não apenas a declaração de inconstitucionalidade do artigo 39, parágrafo 4º, da Lei 12.844/2013, como também a determinação de providências administrativas tendentes a incrementar a fiscalização”, escreveu Gilmar.
O advogado Rafael Carneiro, sócio do Carneiros Advogados, representou PSB no caso. Em nota à revista eletrônica Consultor Jurídico, ressaltou que a consolidação do dever de rastreamento “é importante para combater a degradação ambiental e o garimpo ilegal em terras indígenas”.