Brasil

Mais de 3,9 milhões prestam hoje Enem, que nada abraçado às políticas de inclusão para respirar

Aos 25 anos, o maior vestibular do país tem desafio de conciliar democratização do ensino com investimentos no ProUni e no Fies

Neste domingo (5), mais de 3,9 milhões de inscritos prestam a primeira prova do Enem, exame que nasceu há 25 anos, no governo Fernando Henrique Cardoso, para avaliar o aluno que concluía o ensino médio e acabou se tornando a principal porta de entrada para o ensino superior no país.

De lá para cá, sua importância aumentou na medida em que surgiram programas sociais que utilizam a nota do exame como critério, como o Sistema de Seleção Unificada (Sisu), que seleciona alunos para instituições públicas de ensino superior de todo o país, o Programa Universidade Para Todos (ProUni), que oferta bolsas de estudo em instituições de educação superior privadas, e o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), que concede financiamento a estudantes em cursos superiores não gratuitos.

Em paralelo a isso, o Enem se democratizou e assumiu a identidade que tem hoje graças à Lei de Cotas, de 2012, que alterou os métodos de seleção e garantiu que metade das vagas das universidades públicas fosse destinada a alunos pretos, indígenas e da rede pública.

Hoje, seus desafios são a adaptação ao novo ensino médio, a recuperação do número de inscritos perdidos desde 2016 e a continuidade do processo de inclusão, que vem perdendo verba ano a ano.

Para a edição deste ano, mais de 2,4 milhões dos inscritos tiveram sua solicitação de isenção da taxa de R$ 85 aprovada — isto é, mais de 61% dos participantes são alunos matriculados em escolas públicas, bolsistas em instituições privadas e pessoas em situação de vulnerabilidade socioeconômica.

As mulheres são a maioria dos participantes: há 2,4 milhões de inscritas, o correspondente a 61,3% dos candidatos.

A história do exame

O número de inscrições, que atingiu seu auge em 2015, caiu de forma contínua desde 2016, chegando a 3,4 milhões de candidatos no ano retrasado — após sofrer com a pandemia de Covid-19, com a gestão Bolsonaro, com a adoção de regras mais rígidas para a isenção da taxa de inscrição e com o desmanche do Fies, que teve uma redução de 27% entre 2021 e 2022.

Quando foi idealizado pelo Ministério da Educação de FHC, em 1998, o teste teve cerca de 115 mil inscritos. No ano seguinte, duas universidades adotaram o exame como critério de acesso aos seus programas de graduação e o número de participantes triplicou.

O ProUni veio em 2004 e, cinco anos depois, surgiu o Sisu, o principal responsável pelo crescimento do número de inscritos, segundo Silvia Aparecida de Sousa Fernandes, doutora em sociologia e professora de geografia e educação na Unesp (Universidade Estadual Paulista).

Mas foi em 2009 que o Enem tomou a proporção que tem hoje, após ultrapassar o número de inscritos da Fuvest, que seleciona os alunos para a USP (Universidade de São Paulo), e adotar o famoso sistema de correção TRI (Teoria de Respostas ao Item), conhecido como “antichute”.

O que contribuiu para isso foi justamente o fato de que o candidato poderia concorrer a vagas em diversas universidades pagando somente uma taxa de inscrição.

Logo a prova deixou de ter apenas 63 questões e uma redação, e passou a contar com uma estrutura mais complexa: 180 questões mais uma dissertação, distribuídas em dois dias.

A partir de 2013, os estudantes já conseguiam usar sua nota para candidatar-se a todas as universidades no país. E, desde 2014, 51 instituições portuguesas passaram a aceitar o Enem, em um convênio com o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), órgão responsável pelo exame.

Já o Fies foi criado em 2015, um ano após o Enem ter obtido número recorde de inscritos, com 8,7 milhões de candidatos.

Para Mateus Prado, especialista no exame, a prova seria uma ferramenta sem valor se não fosse a sua associação ao Sisu, ao ProUni e ao Fies. E não teria democratizado o acesso à universidade sem a Lei de Cotas.

Segundo a professora Silvia, com a lei, o ingresso deixou de ser “apenas pelo desempenho individual do candidato, mas definido também por sua condição social e por ele pertencer a grupos historicamente excluídos da sociedade”.

Crise de identidade

Neste ano, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou a fazer um apelo aos estudantes para que se inscrevessem no exame. “Nós precisamos recuperar a força do Enem. É importante que todos que queiram fazer uma universidade se inscrevam, para ter a oportunidade de ser doutor ou doutora”, disse.

E, de fato, em 2023 houve um avanço de 13,1% em relação a 2022, quando foram 3.476.226 inscritos, e de 14,2% em relação a 2021, que teve 3.444.171.

Lula também sancionou na última semana o projeto de lei que prevê a renegociação de dívidas do Fies. Atualmente, há 1,2 milhão de pessoas inadimplentes, com saldo devedor de R$ 54 bilhões, segundo balanço do Ministério do Educação.

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Publicado por
R7 Record