Indígena Uru-eu-wau-wau morto em Rondônia vinha sofrendo ameaças havia meses, dizem ambientalistas

Cime diz que morte de Ari já era anunciada porque ele defendia seu povo. WWF declarou que o território Uru-eu-wau-wau é alvo de um número crescente de invasões, “sobretudo por parte de grileiros”.

Ari Uru-eu-wau-wau foi encontrado morto em RO — Foto: Reprodução/Kanindé

Por G1 RO

O indígena Ari Uru-eu-wau-wau, de 33 anos, morto na madrugada de sábado (18) em Tarilândia, distrito de Jaru (RO), já vinha sofrendo ameaças há meses, segundo uma liderança indígena Karipuna. A informação também foi confirmada pela World Wide Fund for Nature (WWF), Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e Associação de Defesa Etnoambiental (Kanindé).

O foco do trabalho de Ari era registrar e denunciar extrações ilegais de madeira dentro da aldeia, pois fazia parte do grupo de vigilância do povo indígena Uru-eu-wau-wau.

WWF-Brasil publicou uma nota de repúdio durante o fim de semana lamentando profundamente o episódio de violência contra os povos indígenas, que, “segundo dados da Comissão Pastoral da Terra, atingiu em 2019 o seu maior nível em 11 anos, com 9 assassinatos e 39 lideranças ameaçadas – dentre elas estava Ari”.

Ainda segundo os ambientalistas da WWF, o território Uru-eu-wau-wau vem sendo alvo de um número crescente de invasões, sobretudo por parte de grileiros incentivados pelas medidas de afrouxamento na fiscalização e punição.

Para o Cimi, a morte de Ari Uru-eu-wau-wau já vinha sendo anunciada há muito tempo.

“Líderes do povo, além de outras do estado, vem sofrendo essas ameaças por defenderem o seu território, por quererem tirar os invasores. E esse conflito é um conflito histórico. Já são mais de 30 anos que o povo vem lutando para tirar os invasores dessa terra. E o governo incentiva a invasão, a grilagem de terra. E agora temos esse agravante maior com essa pandemia [do novo coronavírus]”, diz a missionária do Cimi, Laura Vicunhã.

Investigações

A Polícia Civil investiga o caso como homicídio. A primeira linha de apuração analisava a morte como proveniente de um acidente de trânsito, mas as investigações tomaram outro rumo já que o corpo de Ari foi encontrado jogado de um lado da estrada e a motocicleta do outro lado da pista. Manchas de sangue ligavam o caminho da moto ao corpo.

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“Onde ele morreu é um local que a gente não costuma parar. Meu pai mesmo conta a história que ali não tem pessoas boas. Naquela região tem casas de invasores”, diz Tangãe Uru-eu-wau-wau, irmão de Ari.

O dia da morte

Conforme relatos de Tangãe, a vítima havia saído da aldeia na sexta-feira (17) por volta das 18h e a preocupação começou porque ele estava demorando muito para voltar.

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“Ele não voltou pra casa aquela noite”, lembra Tangãe.

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Somente no sábado de manhã a família soube da morte e foi ao local para reconhecer o corpo. Quando Tangãe chegou, a polícia e o carro da funerária já estavam no local. Segundo ele, a moto estava do lado direito da estada, sentido aldeia, e o corpo jogado no lado oposto.

“Ele estava de costas pra cima e peito pra baixo. Tinha sangramento na boca e na nuca dava pra ver uma marca, tipo uma pancada bem forte. Eu vi a marca do pneu de uma moto, provavelmente estava sendo perseguido, eu não sei. Ninguém sabe de verdade. Tinha sangue na estrada, no meu entender ele foi arrastado. É muito triste a gente ficou muito abatido”, diz.

Segundo o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Ari Uru-eu-wau-wau era casado e tinha dois filhos – de 10 e de 14 anos de idade.

A Fundação Nacional do Índio (Funai) afirmou ao G1 que as circunstâncias e a autoria do crime já estão sendo investigadas, e que acompanha a Polícia Civil e se encontra à disposição para colaborar no que for possível com o trabalho das forças de segurança pública que atuam nas investigações.

Invasões

A terra indígena Uru-eu-wau-wau, é considerada por ambientalistas da Kanindé como uma das mais importante de Rondônia por ter nascentes dos 17 principais rios do estado além de fauna rica, com vários animais ameaçados de extinção como Gavião Real, cachorro vinagre, entre outros.

“Além de ser casa para cinco povos indígenas: Jupaú (Uru-eu-wau-wau), Amondawa, Cabixi, Oro Towati (Oro win), e três povos em isolamento voluntário (índios isolados). A vegetação é riquíssima também com vegetação ameaçada. Possui cerrado, floresta ombrofila densa e aberta. As cavernas possuem inscrição rupestres que até agora não foram estudadas”, diz Ivaneide Bandeira, ambientalista da Kanindé.

A TI Uru-eu-wau-wua junto com a terra indígena Karipuna, está no ranking de áreas mais desmatadas em Rondônia. Com uma área que abrange 153 mil hectares, entre 2008 e novembro de 2019, a terra Karipuna teve 33,17 km² de desmate.

Já a Uru-Eu-Wau-Wau, que tem ao todo 1.857 mil hectares de área, perdeu 42,54 km² no mesmo período, conforme dados do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes).

Juntas, a soma de terra perdida em cerca de 11 anos é de 75,71 km², o equivalente a quase 13 campos de futebol do tamanho do Maracanã, no Rio de Janeiro

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Publicado por
G1