Guerra entre facções aumenta em 15% número de atendimentos de feridos por arma de fogo no Acre, diz Samu
Servidoras relatam ameaças de membros de facção pelo 192 para priorizarem atendimentos. Ferimentos por arma de fogo ficam abaixo apenas dos casos de acidente de trânsito, segundo coordenadora.
Coordenadora do Samu diz que perfil de ocorrências mudou e custos com vítimas é alto (Foto: Reprodução/Rede Amazônica Acre)
A violência no Acre tem gerado muita dor e tristeza para quem perde familiares para o crime. Em meio a isso, os gastos com a Saúde Pública também aumentaram. Os chamados para as centrais do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) dispararam. No estado, em 2018, o número de ocorrências de pessoas feridas por arma de fogo aumentou em 15% e fica abaixo somente dos casos de feridos no trânsito.
Em um comparativo entre os atendimentos realizados em 2014 com as ocorrências de 2018, o perfil dos chamados tem mudado. Os ferimentos provocados por arma de fogo são um dos que apresentam maior número das ocorrências. Com o aumento da criminalidade, a demanda no Samu também cresceu.
“Mudou um pouco o perfil, nós tivemos um aumento em torno do 15% das chamadas. Nós tivemos um aumento nesse tipo de crime devido à guerra entre facções e também das situações psiquiátricas”, afirma a coordenadora do Samu, Lúcia Carlos.
Lúcia destaca que os custos para esses atendimentos são altos, pois geralmente os pacientes ficam em estado grave.
“Esses pacientes geralmente sofre dois ou três procedimentos cirúrgicos, ficam um longo tempo dentro do de UTIs e uma diária de uma unidade dessa para um paciente custa muito alto. O Ministério da Saúde repassa o recurso em torno de R$ 400 milhões por ano. Só por mês, gastamos em torno de R$ 600 mil com pessoal e o custo de material médico hospitalar e mais o custo desses pacientes”, afirma.
Toda essa violência não gera apenas custos materiais, mas também acaba atingindo as pessoas que trabalham na linha de frente dos atendimentos prestados às vítimas da criminalidade. A violência também atinge os profissionais que precisam lidar com esse medo e tensão a todo momento. Delcidia de Souza é médica do Samu há 15 anos e sabe o que é trabalhar sob pressão.
“Todo o chamado nos bairros em que a gente sabe que a violência é alta nós já vamos com um pouco de receio. A gente tem o apoio da polícia nesses locais, já recebemos ameaças diversas. Geralmente, ligam no 192 falando que se não priorizarmos esses atendimentos vão até a central. Ou querem saber qual o médico e a identificação dos profissionais de plantão”, conta.
Atendente relata ameças e pedidos de prioridade para atendimentos pelo 192 (Foto: Reprodução/Rede Amazônica Acre)
As mesmas situações são relatadas por uma funcionária do Hospital de Urgência e Emergência de Rio Branco (Huerb) que não quis se identificar. Segundo ela, alguns usuários já foram armados ao local e ameaçaram assistentes, médicos e enfermeiros. A servidora afirma que vive em uma guerra dentro da unidade de saúde.
“Muitas vezes temos um paciente que é de uma facção A e outro que é de uma facção B. Então, temos que ter toda uma estrutura de segurança para garantir que essa guerra não chegue aqui. O pronto-socorro é único aqui em Rio Branco, todos estão dispostos a atender e salvar vidas. Já temos essa adrenalina diária e com essa violência sobe ainda mais o stress. Então, pedimos paz e que olhem com carinho para esses guerreiros que estão aqui salvando vidas todos os dias”, pede.
Famílias sofrem com perdas
Conforme dados da Secretaria de Segurança Pública do Acre (Sesp-AC) de janeiro a 23 de julho deste, ano 247 pessoas foram assassinados no estado. Somente no mês de junho, mais de uma pessoa foi assassinada por dia.
As famílias sofrem com a perda de entes queridos. Há um mês, a copeira Nilcilene Rocha foi surpreendida com uma notícia que ela jamais esperava. O marido dela morreu quando estava em um bar comemorando a classificação do Brasil nas oitavas de finais da Copa do Mundo.
Márcio Costa, de 39 anos, estava com um vizinho, no bairro Ivete Vargas, quando foi atingido com dois tiros no peito. Ele não tinha nenhuma passagem pela polícia.
“Foi um choque, quase que eu morro. Não acreditava que teria sido ele. Era uma pessoa tranquila, nunca se envolveu com nada de errado. Quem conhecia ele sabia disso, ele era uma pessoa muito querida. Não merecia ter morrido dessa forma. Pai de 5 filhos, ele foi mais uma vítima da violência por estar no lugar errado e na hora errada”, lamentou.
Homem foi morto em bar quando comemorava vitória do Brasil na Copa do Mundo (Foto: Reprodução/Rede Amazônica Acre)
Uma mãe, que não quis se identificar, também perdeu o filho há três meses de uma forma violenta. A vítima foi torturada e morta por bandidos no bairro Jorge Lavocat.
Meu filho ele era dependente químico, mas ele não era envolvido em nenhuma facção. É muito dolorido, é triste perder um filho para a violência. Geralmente os filhos sepultam os pais, mas hoje em dia os pais têm essa triste missão de sepultar seus filhos e todos jovens. É muito duro isso”, relatou.
Mãe relatou tristeza em perder o filho para a guerra de facções no Acre (Foto: Reprodução/Rede Amazônica Acre)