Ele era um atleta no auge da forma – e a Covid-19 quase o matou

Ahmad Ayyad é um sobrevivente do novo coronavírus. Os médicos o colocaram em coma induzido por 25 dias para salvar sua vida.

Ahmad Ayyad é um sobrevivente do novo coronavírus. Os médicos o colocaram em coma induzido por 25 dias para salvar sua vida. Esta foto mostra Ayyad antes (à esquerda) e depois (à direita) do diagnóstico de Covid-19.

Por Alaa Elassar, da CNN

Quando Ahmad Ayyad finalmente acordou, estava delirando. Ele não percebeu onde estava, por que tinha um tubo em sua garganta ou quanto tempo havia se passado desde a última vez que alimentara seu cachorro.

E, ao olhar para baixo, ele não conseguiu se reconhecer. Outrora um atleta pesando 97 quilos, com músculos esculpidos e força espantosa, o homem de 40 anos parecia uma pessoa completamente diferente.

“Acordei e olhei para meus braços e pernas, e meus músculos tinham sumido. Comecei a meio que surtar, pensando, cadê minhas pernas? Onde foram parar minhas pernas?”

Ayyad é um sobrevivente do coronavírus.

Os médicos o colocaram em coma induzido por 25 dias para salvar sua vida.

Pouco mais de dois meses se passaram daqueles dias entre acordado e apagado, e ele ainda está se recuperando. Ainda sem fôlego às vezes. Ainda cuidando dos danos no pulmão e no coração.

Mas o atleta tem uma mensagem para aqueles que se recusam a usar uma máscara durante esta pandemia, para os que rejeitam as orientações de saúde pública, para os que estão no auge de sua saúde e se sentem invencíveis contra o coronavírus.

“Me preocupa muito ver as pessoas olharem para isso de forma leve”, contou Ayyad à reportagem na terça-feira (30). “Eu, que peguei e sobrevivi, ainda estou apavorado.”

O início

Tudo começou com uma imensa sensação de fraqueza.

Numa semana, Ayyad estava administrando seu próprio restaurante e casa noturna em Washington, DC, e também trabalhando na loja de móveis de sua família. Fazia provas de corrida e competia em corridas de obstáculos, além de fazer treinos semanais de basquete e boxe, um de seus esportes favoritos.

Na semana seguinte, toda sua vida mudou. O ato de subir as escadas o deixava exausto. Como também o faziam cozinhar, conversar e dirigir.

Então vieram a tosse e espirros. De repente, chegou a febre alta, a perda total de energia e apetite e a dificuldade em respirar.

Ayyad achou que estava gripado.

Mas depois que um de seus amigos, médico, pediu que ele fosse ao hospital, ele pegou um Uber e foi para o Memorial Sibley. Isso foi no dia 15 de março. Suas suspeitas foram confirmadas: Ayyad teve testes positivos para influenza e novo coronavírus.

Os médicos colocaram Ahmad Ayya em coma induzido por 25 dias para salvar sua vida. Esta foto mostra Ayyad depois de acordar de um coma. Foto: Cortesia Ahmad Ayyad.

O estado de saúde dele continuou piorando. O atleta foi colocado em um respirador e imediatamente transferido para o Johns Hopkins Hospital, em Baltimore, onde os médicos induziram seu coma.

A maioria dos pacientes com novo coronavírus que são colocados em respiradores é levado ao coma induzido – o tubo na garganta os deixa muito desconfortáveis, com a sensação de não conseguir respirar, e eles não conseguem relaxar.

Ayyad foi o terceiro paciente da Covid-19 do hospital e o primeiro a ser colocado em um respirador, como a própria instituição relatou.

Embora os médicos continuem sem saber ao certo por que o atleta corria mais riscos, especialmente com uma saúde tão boa e sem condições pré-existentes, “poderia haver fatores” que eles ainda não entendem completamente. Foi o que dissea doutora Sandra Zaeh, que tratou Ayyad no hospital e continuou com seus cuidados depois que ele voltou para casa.

“Foi muito pesado emocionalmente. Eu sabia que estaria completamente sozinho nessa. Então liguei para meu amigo e disse para ele pegar meu cachorro. E foi isso. Não sabia o que estava por vir. Não sabia se era a última vez que falaria com eles. Eu não sabia se estava prestes a morrer.”

O que aconteceu depois

Ayyad não sabe ao certo quando ou onde foi exposto ao vírus. Uma semana antes de começar a apresentar sintomas, fez uma viagem de três dias à Flórida para visitar seu irmão. Pode ter sido ali.

Enquanto ele estava deitado em uma cama de hospital, seus parentes se apavoraram com a ideia de perdê-lo sem sequer terem a chance de dizer adeus.

A mãe, Zeinab Ayyad, caiu no choro ao ver o filho pela primeira vez depois da alta. Queria abraçá-lo. Mas, em vez disso, foi forçada a ficar longe, do outro lado da rua, vendo-o entrar em seu apartamento para ficar em quarentena na solidão.

A cada três dias, ela cozinhava pratos palestinos – charutinhos de folhas de uva, molokhia, maqluba – e fazia o possível para “engordá-lo de volta”, brincou.

“Eu tinha pesadelos todas as noites e ligava para o hospital às três da manhã apenas para me assegurar que ele ainda estivesse vivo”, contou Zeinab.

Como estão as coisas agora

Depois de passar quase um mês sem alimentos sólidos, Ayyad se lembra claramente do momento em que voltou a comer.

“Foi uma compota de maçã. Fiquei tão feliz. Foi tão gratificante dar aquela primeira mordida. Bom, isso antes de eu notar que havia esquecido como engolir. É como se eu não me lembrasse de como comer. Tive de aprender tudo de novo. Mas não vou esquecer a compota de maçã.”

Não foi só o ato de engolir que o atleta teve que aprender de novo. Ele não conseguia falar ou andar também. Nas três semanas seguintes, cada movimento o deixava sem fôlego e aumentava sua frequência cardíaca.

Mas ele estava longe de desanimar.

Todos os dias, Ayyad tentava algo novo. Primeiro, começou com extensões de perna da cama do hospital usando os cobertores. Então foram os afundos laterais. De uma hora para outra, ele estava fora do leito, agachando e dando várias voltas de caminhada. Ele foi determinado.

Nesta foto, Ayyad é visto 2 meses após se recuperar do vírus. Foto: Cortesia Ahmad Ayyad.

Depois de finalmente voltar para casa em 22 de abril, Ayyad estava 27 quilos mais leve. O homem ainda tinha um coágulo no braço esquerdo, lesão no coração e nos pulmões, e passou o mês seguinte lutando para fazer qualquer coisa sem perder o fôlego.

Mas, todos os dias, pouco a pouco, foi ganhando um pouco de peso – e músculos.

“Ele parece estar se recuperando muito bem”, opinou a médica Zaeh.

“Foi incrível deixar de vê-lo como a pessoa mais doente da UTI – entubado, profundamente sedado e deixado de bruços para ajudá-lo a respirar – para vê-lo em casa. Ele estava sorrindo e conversando sobre a felicidade de fazer uma corrida curta e se sentar do lado de fora de casa com o sol no rosto”, relatou.

Atualmente, Ayyad está quase de volta ao normal. Já retornou ao boxe, malha todos os dias, joga basquete e esperar correr uma maratona novamente, mas ainda está preocupado com o vírus.

“As pessoas estão agindo como se o coronavírus tivesse desaparecido. Não acabou. Use sua máscara. Não se reúna em grandes grupos. Cuide de si e das pessoas ao seu redor”, aconselhou Ayyad.

“Leve a sério. Não é uma piada. Isso pode matar você, mesmo que você se sinta saudável e imune a isso. Você não é.” Ayyad sabe do que fala. E espera que os outros não precisem descobrir da maneira mais difícil.

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Publicado por
Marcus José

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