A câmera fechada no rosto de Marquinhos durante a execução do Hino Nacional na transmissão do Brasil x Tunísia de ontem (27) foi reveladora. Um dos capitães da seleção brasileira, o zagueiro virou o pescoço de um lado para outro repetidas vezes, mordeu os lábios, franziu a sobrancelha e fechou a cara num ato silencioso de revolta contra as fortes vaias da torcida adversária.

Os tunisianos representam a quarta maior comunidade imigrante da França e foram ampla maioria no estádio Parque dos Príncipes. Fez parte do ambiente hostil que decidiram criar as vaias e xingamentos a tudo que remetesse ao Brasil, desde o Hino até os lances de Neymar com a bola no pé.

As duas coisas irritaram os brasileiros. As vaias ao Hino tiraram uma declaração forte de Tite: “Isso é falta de respeito, futebol é outra coisa”.

Nesta mesma entrevista depois da goleada que encerrou a preparação do Brasil para a Copa do Mundo do Qatar, o técnico falou pouco sobre o sucesso de sua estratégia de jogo ou as múltiplas opções ofensivas que tem na mão. Os principais assuntos foram o clima hostil do estádio em Paris, as pancadas que Neymar tomou e o ato de racismo simbolizado nas bananas arremessadas em Richarlison depois do segundo gol.

Segundo ouviu o UOL Esporte, a superação desta série de acontecimentos para vencer bem o jogo de ontem criou um clima positivo no vestiário da seleção no Parque dos Príncipes. Os relatos são de muita euforia, abraços e palavras de otimismo e esperança entre jogadores e comissão técnica.

Além do desrespeito às cores e símbolos nacionais, como foi nas vaias ao Hino e como acontece quando os jogadores se ofendem com brasileiros torcerem por outras seleções, o racismo também é um assunto que mexe bastante com o elenco da seleção. Vini Jr recebeu abraços e palavras solidárias quando se apresentou ao elenco dias depois de sofrer ataques racistas na Espanha.

RICHARLISON

Logo depois de o camisa 9 marcar o gol do 2 a 1 aos 18 minutos do primeiro tempo, um torcedor atirou duas bananas no campo enquanto ele comemorava. O volante Fred chegou a chutar uma delas e fez um sinal de indignação antes de mais uma banana ser arremessada, desta vez na direção de Richarlison. O atacante nem percebeu, disse que não sabe como agiria se percebesse.

Mesmo assim, Richarlison foi abraçado por jogadores e comissão técnica no vestiário como um ato de solidariedade. Profissionais da CBF até mostraram para o atacante a mensagem que foi postada nas redes sociais e o trecho da entrevista em que Tite cobra punição ao torcedor que cometeu o ato racista. “No futebol não vale tudo. Estádio não é lugar para fazer o que ser quer”, disse.

NÃO MEXAM COM O NEYMAR

Neymar encerrou o ciclo de preparação da seleção para a Copa do Mundo com 18 gols e 21 assistências em 30 partidas. A importância do camisa 10 para o time é sentida nas estatísticas e principalmente no dia a dia. Ele é o “presidente” nos bastidores da seleção, o elo entre os mais experientes e os mais jovens e fundamental no processo de integração da nova geração.

Até porque esta geração é formada por fãs dele. Vini Jr, Raphinha, Rodrygo, Antony, Richarlison… antes de companheiros, todos cresceram admirando a qualidade técnica e a ousadia de Neymar. Por isso, eles muitas vezes se sentem pessoalmente atingidos quando o camisa 10 é caçado em campo, como aconteceu diante da Tunísia, e tentam puxar jogadas individuais até para dividir responsabilidades.

Essa mobilização dentro da seleção por Neymar vai além. Conscientes de que o astro da seleção é esquentado, jogadores sempre formam uma barreira entre ele e o árbitro para evitar o que pode ser visto como ato de indisciplina ou revolta exagerada. Casemiro e Fred geralmente são os primeiros a chegar na confusão, mas Thiago Silva e Marquinhos também são presentes nessa hora.

Faltam menos de dois meses para a Copa do Mundo e a sensação dentro da seleção é que a união e a sintonia entre jogadores e comissão técnica vive seu máximo momento no ciclo para o Qatar. Seja por Neymar, seja pelas filosofias de vida do elenco.